Como identificar a perda da funcionalidade da pessoa idosa?

Saiba de que forma você pode ajudá-la a manter a autoestima diante da dependência e falta de autonomia.

* Texto por Helen Lima, em entrevista à Dra. Natália Salgado, Psicogeriatra.

Como identificar a perda da funcionalidade da pessoa idosa?

 Saiba de que forma você pode ajudá-la a manter a autoestima diante da dependência e falta de autonomia.

Dificuldades para tomar decisões no dia a dia, insegurança à frente de situações corriqueiras, prejuízo na memória recente e esquivamento de interações sociais. Esses são alguns sinais que podem indicar a perda da autonomia, que é a capacidade do ser humano em se auto gerir e tomar decisões próprias, em uma pessoa na terceira idade. A Dra. Natália Salgado, psicogeriatra da Clínica Rezende, explica que a perda da funcionalidade da pessoa idosa ocorre quando há a falta de autonomia em conjunto com a dependência, quadro em que o indivíduo fica impossibilitado de executar tarefas do dia a dia.

A especialista conta que essa situação pode ser vivenciada de forma muito diversa pelo idoso e seus acompanhantes. Enquanto algumas famílias optam por levá-lo para morar na mesma casa, outras escolhem transferi-lo para uma casa de repouso. Independente da alternativa escolhida, ela recomenda que a pessoa mais velha seja estimulada a realizar as atividades que ela ainda dá conta de fazer de forma segura, ainda que em um outro ritmo. Confira alguns exemplos:

  • ajudar na limpeza;
  • guardar as compras;
  • higienizar alimentos;
  • arrumar o próprio quarto;
  • organizar o guarda-roupas.

“Marginalizar o idoso dos afazeres do dia a dia não é uma conduta adequada. É interessante inseri-lo de forma gradativa nessas tarefas, de forma que elas sejam prazerosas para ele”, orienta.

Queda na autoestima: porta de entrada para a ansiedade e depressão

 A partir do momento em que uma pessoa na terceira idade percebe que há prejuízos na sua capacidade de decisão, podem surgir sentimentos como impotência e perda de identidade, impactando diretamente o seu senso de auto realização e utilidade. De acordo com a Dra. Natália, esses pensamentos influenciam diretamente na autoestima e podem levar a um quadro de isolamento social, por insegurança e medo de errar. “Toda essa dinâmica mental é fator de risco para o desenvolvimento de transtornos mentais, principalmente depressão e ansiedade”, alerta.

Para evitar o agravamento desse quadro, a especialista destaca que o primeiro passo é estabelecer o entendimento coletivo: todas as pessoas envolvidas no cuidado da pessoa idosa devem saber o que levou à perda de funcionalidade e o prognóstico precisa estar muito claro. “A Psicoeducação ajuda a lidar com as demandas que surgem no decorrer do tempo. É muito importante que todos os envolvidos se sintam integrantes do processo de cuidado, para que a empatia seja praticada”.

A Psicoeducação é uma abordagem terapêutica que busca desenvolver no paciente, assim como em seus familiares e cuidadores, uma ampliação do conhecimento sobre sua situação de saúde e todo o processo de tratamento. Segundo a psicogeriatra, essa abordagem ajuda na aceitação dessa situação, reduzindo frustrações, cobranças e culpas. “É importante dar espaço para uma nova realidade que faça sentido para todos os envolvidos no cuidado, buscar ativamente as potencialidades ainda presentes na pessoa idosa e usá-las como forma de incentivo”.

A Dra. Natália finaliza com mais uma dica de ouro: a troca de experiências. “Compartilhar angústias e medos com grupos de familiares e cuidadores com vivências semelhantes também é uma prática recomendada”.

Janeiro Branco: O sentido da vida

Vale destacar que a felicidade não é o resultado de uma fórmula. Também não se resume a uma vida livre de frustrações e de momentos de sofrimento.

* Por Sabrina Gomes

A campanha “Janeiro Branco” faz um importante convite para a reflexão sobre o cuidado em saúde mental. Uma das contribuições desta proposta está em direcionar nossa atenção para as possibilidades de investimento em ações de prevenção ao adoecimento mental e de promoção de comportamentos que possam nos aproximar de uma vida mais feliz.

Muitas são as propostas que apresentam a felicidade como um alvo a ser perseguido. São muito comuns as publicações que oferecem o “passo a passo” para a felicidade. No entanto, contrariando esta concepção, quero apresentar a introdução a uma visão diferente de felicidade, a qual pode contribuir para o processo pessoal de desenvolvimento de cada um dos interessados em seguir com essa leitura.

Primeiramente, por mais que possa parecer óbvio, vale destacar que a felicidade não é o resultado de uma fórmula. Também não se resume a uma vida livre de frustrações e de momentos de sofrimento. Devemos considerar que o processo de busca por uma vida feliz é único, individual, o que torna impossível a ideia de um percurso único a ser trilhado por todos. Além disso, ao invés de negarmos nossas limitações e inseguranças, o caminho é o investimento na capacidade de lidarmos com as adversidades e com os momentos de angústia, uma vez que são inevitáveis.

Viktor Frankl, um psiquiatra e neurologista que se dedicou a estudar e observar o comportamento das pessoas, pode nos ajudar a compreender a vida de uma maneira bem interessante. Ele percebeu que a busca por sentido está no centro da vida humana. Para Frankl, a busca por um sentido de vida representa a principal força motivadora humana, sendo a felicidade um dos efeitos colaterais deste investimento. E há um ponto muito importante: o caminho para o sentido da vida está em amarrar nossas escolhas com um propósito e todos podemos fazer isso!

Frankl concluiu seu pensamento observando pessoas que estiveram como prisioneiras em campos de concentração e que encontraram, mesmo imersas em uma condição de intenso sofrimento, um sentido para permanecerem vivas. E ainda há um ponto fundamental nesta investigação: Frankl também foi prisioneiro em alguns campos de concentração, vivendo na pele a experiência (você pode ter acesso aos registros no livro “Em busca de sentido” –  vale a leitura).

Com esta breve reflexão de início de ano, neste mês especial para a Saúde Mental, o convite está feito: que você possa investir tempo na construção cuidadosa de um projeto de vida autêntico e que evite distrações que te distanciem daquilo que represente um sentido de vida para você. É importante lembrar que esse pode ser um caminho complexo em alguns momentos, e que pode ser muito positivo buscar a ajuda de pessoas qualificadas sempre que você julgar necessário.

 Referência

Frankl, V. E. (2013). Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração (Vol. 3). Editora Sinodal.

Saúde Mental: Integrar é preciso

Aceitar que as emoções são parte importantíssima de nossa vida pode nos trazer um estado mental mais harmônico e uma melhor saúde física.

* Por Dr. Fabrício de Oliveira

Saúde Mental: Integrar é preciso

Estados mentais subjetivos são influenciados por fatores físicos como medicamentos, exercícios e dieta. De modo inverso, uma quantidade de distúrbios físicos é influenciada por fatores psicológicos.

São muito comuns os distúrbios psicofisiológicos, nos quais o sofrimento mental persistente provoca alterações nos tecidos, o que, por sua vez, causa sintomas. Exemplos incluem cefaleias, indisposições gastrintestinais, problemas dermatológicos e dor musculoesquelética de todos os tipos.

Muitos pacientes ficam preocupados por pensarem que o profissional de saúde, ao propor uma explicação que envolva a abordagem de fatores psicológicos, indique que pensamos que a dor deles é imaginária, ou que “é tudo da minha cabeça”. Eles também podem temer ser acusados de simulação. É preciso explicar que talvez o problema  é causado por alterações no corpo e que é, em todos os sentidos, real.

Evidentemente é imperativo que antes de considerarmos que o aparecimento ou persistência de determinada alteração tenha origem ou influência de fatores psicogênicos, todos os pacientes devem passar por um exame clínico completo para excluir causas orgânicas não diagnosticadas.

Algumas pessoas podem se perguntar: “Será que esse papo de origem psicológica é verdade?”

Cada vez mais a ciência nos permite entender e comprovar a influência das emoções no corpo físico. Podemos usar a resposta de “luta-ou-fuga” para uma melhor elucidação.

Todos os mamíferos compartilham uma resposta de emergência altamente adaptativa, sofisticada e remota muitas vezes chamada de sistema de luta-ou-fuga. Quando um mamífero é ameaçado, seu sistema nervoso simpático e seu eixo hipotalâmico-pituitário-suprarrenal (HPA) são ativados, resultando em aumento de epinefrina (adrenalina) na corrente sanguínea e alterações fisiológicas correspondentes (Sapolsky, 2004).

Quase toda mudança fisiológica ocasionada por esse sistema pode causar ou exacerbar um sintoma relacionado a estresse se o sistema permanecer continuamente ativo.

Dessa forma, o organismo pode manifestar uma vulnerabilidade à sobrecarga psicológica e/ou fisiológica que, quando persistente, causa desgastes orgânicos, originando doenças.

Visto que esses distúrbios são com frequência mantidos por uma combinação de fatores médicos, psicológicos e comportamentais, se faz necessário desenvolver intervenções integradas, flexíveis, que tentam tratar todos esses elementos.

Os estressores psicossociais, como o trauma interpessoal, podem ter efeitos biológicos profundos ao alterarem o funcionamento do cérebro. Ademais, pensar na psicoterapia como um tratamento para “transtornos com base psicológica” e em medicamentos como um tratamento para “transtornos biológicos ou cerebrais” é uma distinção ilusória. O impacto da psicoterapia sobre o cérebro está bem estabelecido (ver Gabbard, 2000).

Os achados da neurobiologia vêm aumentando o entendimento sobre psicoterapia nos últimos anos. Um breve panorama desses achados evidencia o fato de que a psicoterapia tem um impacto importante sobre o cérebro e não pode ser desprezada como um mero “apoio” ou uma tranquilização afável.

A combinação de psicoterapia e farmacoterapia é cada vez mais comum, conforme se acumulam evidências de que muitas condições respondem melhor ao tratamento combinado do que a apenas uma das modalidades isoladamente (Gabbard e Kay, 2001). Visto que ambos os tratamentos afetam o cérebro, em um sentido bastante real, os dois são intervenções biológicas. Entretanto, os mecanismos de ação dos dois tratamentos podem ocorrer em áreas muito diferentes do cérebro.

Aceitar que as emoções são parte importantíssima de nossa vida pode nos trazer, não só um estado mental mais harmônico, mas também uma melhor saúde física.

Um novo ano, folhas em branco pela frente.

Caso você pudesse escolher, reconhecendo com gentileza tudo o que representa o seu ontem, como você gostaria de escrever o seu dia de amanhã?

* Por Dr. Leonardo Martins

Um novo ano, folhas em branco pela frente.

Caso você pudesse escolher, reconhecendo com gentileza tudo o que representa o seu ontem, como você gostaria de escrever hoje o seu dia de amanhã? O que lhe impede neste momento de seguir na direção daquilo que de fato importa em sua vida?

Janeiro Branco

Neste mês ocorre uma das principais campanhas de conscientização sobre saúde mental no Brasil. Os seus idealizadores nomearam esse movimento como “Janeiro Branco”, inspirados por outras campanhas, tal como o “Outubro Rosa” em que o tema é a conscientização sobre o câncer de mama.
A escolha exata do mês e da cor branca faz referência a sensação que alguns de nós temos ao começarmos um ano novo. Em janeiro temos pela frente todos os demais dias do ano em branco. Diante desta imagem, ao pensarmos nos dias que virão como folhas de papel em branco, é natural que surja o desejo de escrevermos nas próximas páginas uma nova história. Resoluções de ano novo, promessas de mudança, o compromisso com novos sonhos ou mesmo a retomada do que deixamos para traz são temas comuns nesse âmbito.

Todo o tipo de esperança pode emergir quando percebemos que nossa história ainda está por ser escrita. Quando esta está conectada de forma íntima e sincera com tudo aquilo que de fato nos importa, daqui muitas vezes emerge o próprio sentido para vida. Geralmente, guardamos aqui o que não abrimos mão mesmo no contexto das maiores adversidades, as coisas ou modos de viver pelos quais nós lutaríamos nossas maiores batalhas. Seguir na direção do que importa e daquilo que nos traz sentido produz um movimento que nos dá geralmente a sensação de vivermos uma vida que vale a pena ser vivida.

É fato que o momento e o contexto em que vivemos impacta sobremaneira a chance de termos esperança e de seguirmos na direção de dias melhores. Diversos fatores são importantes para que isso ocorra de modo natural e alguns deles podem estar ausentes ou mesmo depender de coisas que não estão no nosso controle. Ainda assim, temos o direito de escolher a maneira como desejamos passar pela vida, como lidamos com aquilo que está fora do nosso controle e como lidamos com aquilo que está em nossas mãos. Fazer esse movimento, ainda que na adversidade, nos faz seguir por uma jornada em direção à uma vida valorada e com sentido. Folhas em branco, escritas com a tinta do que importa, passam a versar hoje sobre a vida que buscaremos viver hoje e que fala do que buscamos para amanhã. Saúde mental, neste sentido, não fala sobre um estado interno individual, mas sim da nossa potência como indivíduos e sociedade de aprendermos como nosso passado e de assim nos movimentarmos no presente em direção aos dias que gostaríamos de viver no futuro. Não é raro que o oposto à saúde mental represente justamente a repetição do ontem, o medo do amanhã que nos paralisa ou mesmo a sensação de estarmos presos em uma história ou modo de viver que já não nos cabe mais.

A campanha “Janeiro Branco” nos lembra que independente da história que vivemos, temos hoje um amanhã em branco pela frente; e que este pode ser preenchido por uma vida possa valer a pena ser vivida. O “Janeiro Branco” nos alerta sobretudo de que quando esse movimento não nos é possível, talvez seja a hora de não só pensarmos sobre isso, mas hora de insistirmos em seguir por uma nova direção, como indivíduos ou sociedade, e com a devida ajuda caso necessário for.

Eu sou o diagnóstico ou estou o diagnóstico?

Na verdade, nem um e nem outro. A intenção é chamar atenção para o que e para quem é importante o diagnóstico em Saúde Mental.

* Por Diana Lopes

Eu sou o diagnóstico ou estou o diagnóstico?

Na verdade, nem um e nem outro. A experiência de ser e estar é muito mais ampla do que qualquer tipo de categorização.

Com o avanço da ciência médica e com os recursos diagnósticos cada vez mais precisos, a prática clínica ganhou suporte e opções de tratamentos mais eficazes e eficientes. E assim, o diagnóstico se tornou cada vez mais central no tratamento de diversas doenças.

E em saúde mental, qual será o lugar do diagnóstico?

Assistimos ao longo dos anos uma sociedade mais atenta aos enquadramentos psíquicos. Em uma busca rápida em sites para esta finalidade, facilmente encontramos testes  e informações que verificam em  quais categorias de transtorno as pessoas com determinadas características pertencem.

É um movimento controverso, uma vez que se por um lado o acesso à informação pode ser uma via de esclarecimento, reconhecimento e busca por um tratamento adequado, por outro lado pode decorrer em banalização diagnóstica tanto por parte das pessoas de um modo geral como por parte de profissionais.

Longe de querer esgotar neste texto um assunto que envolve um nível alto de complexidade, a intenção é chamar atenção para o que e para quem é importante o diagnóstico em Saúde Mental. Para isto devemos partir da concepção de que a condição humana é marcada por uma gama de aspectos que se traduzem na experiência de viver e no modo como nos relacionamos com o mundo. Isto nos leva a considerar que todos os modos de existir são legítimos porque são formas de viabilizar a própria existência. Por isso o diagnóstico não poderia ter este papel tão central e generalizado como podemos constatar nos últimos anos. O diagnóstico serve de referência para o profissional guiar sua conduta clínica, mas está longe de traduzir precisamente quem é uma pessoa.

E como consequência dessa ênfase no diagnóstico, podemos constatar com alguma frequência pessoas e profissionais buscando tratamentos para sentimentos comuns. Por exemplo, a tristeza, o sofrimento após um luto, uma separação tem levado pessoas a buscar medicamentos ou enquadramento em uma psicopatologia para a “cura” de eventos que fazem parte da dinâmica da vida. Ou quando um problema coletivo como a educação brasileira, por exemplo, é transformado em um problema pessoal, quando diagnosticamos uma criança em algum transtorno mental por apresentar um comportamento que foge ao esperado pela normativa.

Allen Frances, que dirigiu o DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico) durante anos, em entrevista ao “El País”,  mostrou preocupação em relação a esta tendência de epidemia de diagnósticos. Para ele seres humanos são maleáveis e capazes de se adaptar em condições muito adversas. Ainda se fala pouco sobre esse assunto no Brasil que atinge o mundo inteiro. Aqueles que tentam abordar este tema podem ser desqualificados inclusive pela comunidade acadêmica mesmo sabendo que a ciência só se avança pelo questionamento.

Claro que estamos passando por um momento jamais antes vivido e com isto lidamos com sentimentos intensos da esfera mais íntima às experiências coletivas. Diante do desconhecido, da morte iminente, de ter nossa autonomia capturada pela pandemia, do isolamento social, da crise socioeconômica, de ficar longe de quem amamos e ter nossa vida completamente revirada, somos impactados significativamente em nossa experiência de ser e de estar. E reagimos naturalmente a isto. Mas será que tudo deve ser patologizado?

É neste momento que precisamos buscar entender o que acontece e de que modo isto nos impacta, e junto com profissionais sérios e qualificados buscar modos de superação. A busca frenética e cega por diagnósticos pode aprisionar uma existência sem resolver o problema realmente. Tanto pacientes quanto profissionais deveriam buscar a compreensão do modo como funcionamos, de como nos organizamos e estabelecemos relação com o mundo, o que pode ser a saída fundamental para a melhora e avanço na qualidade de vida, pois somos e podemos muito mais do que mostramos superficialmente .

Sofrimento emocional na gestação

Transtornos e sintomas psiquiátricos são frequentes, especialmente, no primeiro e no terceiro trimestres de gestação e nos primeiros 30 dias de puerpério.

* Por Dr. Fabrício de Oliveira

Sofrimento emocional na gestação

Transtornos e sintomas psiquiátricos são frequentes, especialmente, no primeiro e no terceiro trimestres de gestação e nos primeiros 30 dias de puerpério. Os fatores envolvidos na alta prevalência dizem respeito às diversas dimensões da gravidez e da maternidade. Além de alterações hormonais, que provocam transformações no comportamento e no psiquismo, gravidez e maternidade implicam várias mudanças na inserção social. Outros fatores como poucos recursos materiais, alta demanda ocupacional, responsabilidades domésticas intensas e relações familiares conflituosas podem piorar a situação.

A ponderação relativa aos riscos da exposição às medicações versus o impacto de uma doença não tratada nos resultados obstétricos e no desenvolvimento infantil tornam-se um grande dilema para o clínico e para a paciente. O que ambos precisam levar em conta é que não há escolha livre de risco.

As reações da gestante estão vinculadas a alterações metabólicas, principalmente no eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA), que de modo peculiar podem influenciar o feto. Sua exposição a um ambiente uterino desfavorável tem sido associada ao aumento significativo de doenças na idade infantil e adulta, fenômeno denominado programação fetal.

Transtornos depressivos

Até 70% das pacientes têm sintomas depressivos durante a gravidez, sendo que de 10 a 16% preenchem critérios para o diagnóstico de depressão.

Os transtornos do humor do puerpério dividem-se, classicamente, em quadros de depressão mais leve, chamados de disforia do pós-parto e depressão. Disforia pós-parto (puerperal blues) é um fenômeno extremamente comum e considerado fisiológico por alguns autores. Até 85% das puérperas descrevem algum grau de tristeza ou humor depressivo nos primeiros dias do pós-parto. Essa incidência diminui a partir do décimo dia de puerpério. Normalmente, esses sintomas depressivos são leves, acompanhados de labilidade emocional, irritabilidade, tensão e sentimentos de inadequação. Não chegam a comprometer o funcionamento social ou a relação da mãe com o recém-nascido. A remissão espontânea dos sintomas sugere que não há necessidade de tratamento médico. A persistência do humor depressivo deve ser encarada como uma possível depressão maior, o que necessita de avaliação especializada e tratamento adequado.

Lamentavelmente, sintomas e sinais francamente depressivos durante a gravidez muitas vezes não são adequadamente percebidos e avaliados. Essa desvalorização de manifestações clínicas depressivas por parte das próprias gestantes, familiares e médicos tem relação com o mito de que a gestação deva ser necessariamente um período de bem-estar mental. Neste contexto cultural, muitas gestantes sentem-se culpadas por não estarem felizes e com vergonha de pedirem ajuda.

De acordo com a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), a paciente com depressão na gestação apresenta uma gravidez de alto risco. No entanto, somente cerca de 14% das grávidas com depressão realizam algum tipo de tratamento.

A depressão da gestação está associada a um maior risco de: crescimento intrauterino restrito; pré-eclâmpsia; DM gestacional; prematuridade; baixo peso ao nascer; escores de Apgar mais baixos; prejuízos no desenvolvimento infantil (cognitivos, sociais, afetivos); dificuldades na amamentação; vínculo inseguro entre mãe e criança; depressão pós-natal; uso materno de álcool, tabaco e outras drogas; abortamento; e suicídio materno.

Transtorno bipolar perinatal

Independentemente da terapia medicamentosa, o TB na gestação está associado a maiores riscos de: uso de álcool, tabaco e outras drogas; malformações congênitas (p. ex., microcefalia); prematuridade; baixo peso ao nascer; placenta prévia; hemorragias; prejuízos no desenvolvimento infantil (cognitivos, sociais, afetivos). Portanto, a manutenção ou mesmo o início de tratamento farmacológico de prevenção à recorrência de TB durante o período perinatal é uma conduta pertinente.

Transtorno de ansiedade generalizada perinatal

A prevalência do transtorno de ansiedade generalizada é em torno de 2% a 6% na população geral; a prevalência mínima é de 8,5% na gravidez e 4,4% no pós-parto.

Estudos mostram que a ansiedade durante a gestação é fator de risco independente para trabalho de parto prematuro e depressão pós-parto. Outras consequências são baixo peso ao nascer, maior necessidade de analgésicos durante o parto e dificuldade de amamentar

Deve-se considerar que episódios psiquiátricos não tratados estão associados à maior probabilidade de importantes intercorrências obstétricas, maternas, neonatais e puerperais, com implicações negativas para o desenvolvimento da criança e para as relações familiares. Portanto, na ausência de uma alternativa terapêutica apropriada, evitar o uso pertinente de medicamento psiquiátrico como meio de garantir gravidez ou amamentação livres de riscos é uma estratégia contestável.

Sobre o envelhecer

O envelhecer é um processo natural, que caracteriza mais uma etapa da vida e traz consigo mudanças físicas, sociais e…

* Por dra. natália salgado

Sobre o envelhecer

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o Brasil será o sexto país do mundo em número de idosos, até 2025. Esse aumento populacional é devido, de forma simplificada, pelo aumento da expectativa de vida e pela diminuição da taxa de natalidade. Apesar do aumento da longevidade, ainda é grande a desinformação sobre a saúde do idoso, as particularidades e desafios do envelhecimento.

A OMS define idosa aquela pessoa acima de 60 anos em países subdesenvolvidos e 65 anos em pacientes desenvolvidos. Entretanto, é importante reconhecer que a idade cronológica não é um marcador preciso para as mudanças que acompanham o envelhecimento.

O envelhecer é um processo natural, que caracteriza mais uma etapa da vida e traz consigo mudanças físicas, sociais e psicológicas, e que sofre influência do contexto cultural que o idoso está inserido. Além disso, ele é muito heterogêneo, podendo ocorrer de forma saudável (senescência) ou com doenças (senilidade).

Envelhecimento e Saúde Mental

Com o avançar da idade, a chance de ocorrência de alguns transtornos mentais aumentam como por exemplo os transtornos neurocognitivos maiores (mais conhecidos como demências). É errado pensarmos que envelhecer é sinônimo de ter depressão, importante então frisar que não é uma condição inerente ao idoso. Mas é, entre os transtornos psiquiátricos, o mais comum nos idosos, e por isso deve ser ativamente pesquisado. Outras condições que ocorrem nessa faixa etária são os quadros ansiosos, psicóticos, além do uso e abuso de substâncias, e suicídio. A existência dos transtornos mentais é ainda maior em instituições como “lares de idosos”.

Importância do tratamento

Um vez diagnosticado um transtorno mental por um profissional capacitado, medidas de tratamentos tanto farmacológicas quanto não farmacológicas devem ser adotadas visando a melhora da qualidade de vida desse idoso, uma vez que trazem incapacidades aos seus portadores.

Com o tratamento adequado, sintomas envolvendo alterações de humor e de comportamento podem ser aliviados, fornecendo melhora da autonomia e independência que são elementos fundamentais para a funcionalidade no dia a dia.

Além disso, o tratamento de vários sintomas, como por exemplo a depressão é um fator protetor contra o desenvolvimento de condições mais graves, como as demências.

Referências:

OMS, Relatório Mundial de envelhecimento e saúde, 2005

Cerejeira J, APRAHAMIAN I . Psiquiatria Geriátrica , editora Guanabara Koogan , 2019

Por que ir ao psiquiatra?

Porque ir ao psiquiatra? Acreditamos que você já tenha se feito essa pergunta ao menos uma vez.

* Por Fabrício de Oliveira

Por que ir ao psiquiatra? Acreditamos que você já tenha se feito essa pergunta ao menos uma vez.

Por que ir ao psiquiatra?

Cresci escutando a frase: “Psiquiatra é médico de louco”. Na realidade, psiquiatra é um médico que trabalha, sobretudo, com problemas emocionais, sendo que estes podem ser de vários tipos: transtornos ansiosos, depressivos, do sono, psicóticos, entre outros. O que as pessoas não sabem é que 80% dos pacientes que procuram meu consultório apresentam problemas relacionados à ansiedade, irritabilidade, tristeza e cansaço físico e mental.

Atualmente, quem pode dizer que não apresenta alguma dessas queixas em maior ou menor grau? Não poderia ser diferente. É raro quem não enfrenta problemas cotidianos de insegurança, dificuldade de sobrevivência, falta de trabalho (ou ameaça de sua perda), incerteza quanto ao retorno positivo dos esforços profissionais, competitividade profissional e social, compromissos sempre mais exigentes, perspectivas negativas para o futuro, e assim por diante.

Quer dizer que todos que sofrem de estresse devem procurar um psiquiatra?

Não, mas todos deveriam procurar medidas que diminuam o impacto do estresse diário. A realização de atividades físicas de forma adequada e regular e uma alimentação saudável podem trazer muitos benefícios. A prática de atividades religiosas já é comum e, cada vez mais, estudos científicos estimulam que essas sejam feitas.

Infelizmente é frequente que se encontre quem esteja tão exausto que a mudança do estilo de vida lhe pareça impossível. Algumas das pessoas que passam por isso, podem estar, por exemplo, com Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG). Sintomas típicos associados ao TAG são: medo; ansiedade e preocupação generalizados; cansaço físico e mental; dificuldade de concentração; tensão muscular; irritabilidade; sono de baixa qualidade.

Todos nós podemos apresentar sintomas ansiosos e depressivos, sem que esses representem necessariamente um transtorno psiquiátrico. Mas se os mesmos estiverem ocorrendo de forma muito intensa ou por longo período, é recomendado que procure seu médico de confiança. Caso ele o encaminhe para o psiquiatra, não estranhe tal atitude, pois saiba que um tratamento bem conduzido pode trazer diminuição significativa do sofrimento emocional.

Precisamos falar sobre transtorno alimentar!

Os transtornos alimentares são transtornos psiquiátricos causados por alterações na autoimagem, ou seja, na forma como o indivíduo se vê, na sua relação com o próprio corpo e com a comida.

* Por Dr. Alexandre de Rezende.

Sim, precisamos falar sobre transtorno alimentar! Os transtornos alimentares são transtornos psiquiátricos causados por alterações na  autoimagem, ou seja, na forma como o indivíduo se vê, na sua relação com o próprio corpo e com a comida. Dentre os mais importantes podemos citar a anorexia nervosa, a bulimia nervosa e o transtorno de compulsão alimentar.

Nos últimos anos, tem havido um aumento na ocorrência desses transtornos alimentares em nosso meio, fazendo com que dados atuais apontem que em torno de 7,8% das pessoas apresentam alguma dessas condições. Porém, os transtornos alimentares podem atingir 13% das adolescentes e, em geral, 80% das pessoas não recebem tratamento adequado. Dados internacionais indicam que, desde o início dos anos 2000 até hoje, as taxas de prevalência mais do que dobraram. As mulheres jovens são o grupo mais acometido, incidindo principalmente em profissões e atividades que tenham ligação com o corpo e a estética, como modelos, bailarinas e atrizes, mas também profissionais da moda, estudantes de psicologia e nutrição.

Os transtornos alimentares são doenças de etiologia multifatorial, ou seja, estão relacionadas com fatores psicológicos, tais como baixa autoestima, tendências ao perfeccionismo, dificuldades de expressar ou lidar com as emoções; também com fatores genéticos, alterações neuroendócrinas nos moduladores cerebrais da fome e saciedade; e fatores socioculturais, como a valorização exagerada e inadequada da magreza como padrão de beleza.

Anorexia nervosa:

A anorexia nervosa se caracteriza por uma importante distorção da imagem corporal, em que o paciente, embora com perda importante de peso, tem a convicção de estar gordo e apresenta um medo muito grande de engordar ainda mais.

Com isso, utiliza-se de estratégias de restrição alimentar como uma busca desenfreada da magreza, que nunca é alcançada. A anorexia nervosa é um dos transtornos psiquiátricos mais graves, cuja mortalidade pode atingir até 20% dos casos. Um dado importante é que, tendo em vista as alterações da autoimagem, os pacientes na maioria das vezes não reconhecem o problema, julgam que seu comportamento alimentar é normal, o que só dificulta a busca e a aceitação do tratamento.

A bulimia nervosa:

A bulimia nervosa, por sua vez, tem por características a presença de episódios recorrentes de compulsão alimentar. Essas ocorrências são definidas como a ingestão num curto período de tempo de uma quantidade exagerada de alimentos, mais do que seria esperado (fala-se do consumo de 1000 calorias num espaço de 2 horas). Há também descrita pelos pacientes uma sensação de falta de controle que leva a esses comportamentos de exagero alimentar.

Após esses episódios, o paciente se sente culpado e envergonhado, pois também há uma preocupação excessiva com o peso e forma corporal. Dessa maneira, o paciente adota as chamadas medidas compensatórias, tidas como inadequadas, que vão além da indução de vômitos (purgação), mas também englobam o uso de laxantes ou outros medicamentos com o intuito de eliminar o que fora comido, realização de jejuns prolongados e atividade física em excesso. Segundo os critérios diagnósticos, esses episódios compulsivos e compensatórios devem ocorrer pelo menos 1 vez por semana por pelo menos 3 meses. Por essa razão, o peso dos pacientes com bulimia nervosa é normal ou levemente aumentado.

Transtorno de compulsão alimentar:

Por fim, temos o transtorno de compulsão alimentar (conhecido pelas iniciais TCA), também definido como a presença de episódios compulsivos ocorrendo pelo menos 1 vez por semana durante 3 meses. No TCA não existem as medidas compensatórias, mas há uma série de comportamentos associados, a saber: comer mais rapidamente do que o normal; comer até se sentir desconfortavelmente cheio; comer grandes quantidades de alimentos na ausência de sensação física de fome; sentir-se culpado e comer sozinho pela vergonha do quanto se está comendo. Há uma grande associação de TCA com obesidade.

Cerca de metade das pessoas com tal transtorno está acima do peso. A prevalência de TCA na população geral é de 2%, em obesos é de 8%, e chega a 50 até 75% em indivíduos obesos graves (a chamada obesidade grau III).

O tratamento dos transtornos alimentares requer uma equipe multidisciplinar. O grande objetivo é tratar as complicações clínicas e psiquiátricas comórbidas, promover uma recuperação da autoimagem e melhora da autoestima e insatisfação com o corpo. E, acima de tudo, tornar a relação com a comida mais adequada. Para tanto, a presença e participação da família é fundamental.