Transtorno do Estresse Pós-Traumático

O que é, os principais sintomas, como o problema pode estar sendo mantido. Leia aqui.

* Por Dr. Alexandre de Rezende

O que é o Transtorno do Estresse Pós-Traumático?

O Transtorno do Estresse Pós-Traumático – TEPT é caracterizado pelo aumento do estresse e da ansiedade após a exposição a um evento traumático, sendo que a resposta a esse estressor precisa envolver medo intenso ou terror.  Ou seja, para que a pessoa desenvolva TEPT, é necessário que ela tenha experimentado ou testemunhado situações que envolvam morte, sério ferimento ou ameaça à sua integridade física ou de pessoas próximas.

Por definição, um evento traumático é o fator causal principal no desenvolvimento do TEPT e deve ser suficientemente grave e devastador para afetar quase todas as pessoas. Pode incluir ser testemunha ou estar envolvido em um acidente ou crime violento, agressão, sequestro, vivenciar um desastre natural (enchentes, desabamentos, furacões), situações de guerra, ser vítima de abusos físicos ou sexuais, ou ser diagnosticado com uma doença grave, dentre outras possibilidades.

No entanto, nem todas as pessoas desenvolvem o transtorno após um evento traumático. Há dados mostrando que 60% dos homens e 50% das mulheres experimentam algum trauma significativo ao longo do tempo, enquanto a prevalência de TEPT durante a vida é de 8%.

Quais são os principais sintomas do TEPT?

Para que o TEPT seja diagnosticado, é preciso que a pessoa apresente, após um mês de ocorrência do trauma, sintomas que envolvam três domínios:

  1. Sintomas intrusivos após o trauma
  2. Evitação de estímulos associados ao evento
  3. 3. Aumento da excitação autonômica 
  • Sintomas intrusivos após o trauma

A pessoa fala da presença de lembranças angustiantes, recorrentes e involuntárias do evento traumático, e sonhos recorrentes ligados ao estressor. Os chamados flashbacks, nos quais o indivíduo age e sente como se o trauma estivesse ocorrendo novamente, são sintomas clássicos dessas manifestações intrusivas.

A experiência fica se repetindo na mente da pessoa, fazendo com que ela reviva o trauma constantemente, e tenha pensamentos indesejados sobre o evento estressor. Esses pensamentos podem vir como um filme, que fica passando na cabeça, ou imagens muito reais, como se a situação estivesse acontecendo novamente. Além disso, a pessoa pode passar a ter pesadelos relacionados ao trauma.

  • Evitação de estímulos associados ao evento

O indivíduo começa a empreender esforços para evitar recordações ou situações (pessoas, lugares, conversas) que despertem as lembranças do que aconteceu, podendo até mesmo apresentar alguma dificuldade para recordar algum aspecto importante do evento. Além disso, a pessoa desenvolve algumas crenças negativas a respeito de si mesmo, dos outros e do mundo (“sou mau”, “não se deve confiar em ninguém”, “o mundo é perigoso”). É bastante comum a presença de um estado emocional negativo, expresso por sentimentos de medo, raiva ou culpa, assim como interesses diminuídos em atividades significativas.

Para fugir dos sentimentos indesejados, a pessoa passa a evitar o contato com situações ou pessoas que a lembrem do ocorrido. Por exemplo: alguém que foi assaltado em um ônibus, começa a deixar de usar transportes públicos (até mesmo metrô e trem). Também ao tentar afastar pensamentos e sentimentos dolorosos, a pessoa pode acabar tendo dificuldades em sentir outras emoções, como amor, alegria, esperança, a que damos o nome de entorpecimento emocional. Ela pode apresentar sentimentos como raiva, vergonha e culpa. O interesse em atividades das quais costumava gostar também pode estar diminuído ou ausente. Esse entorpecimento emocional parece ser uma estratégia psicológica para “anestesiar” o sofrimento e o pânico gerados pela revivência.

  • Aumento da excitação autonômica

Tal domínio se caracteriza pela presença de surtos de raiva, hipervigilância, problemas de concentração, resposta de sobressalto exagerada e perturbações do sono. Tais sintomas são reações psicofisiológicas relacionadas a estímulos que estejam associados ao trauma. Isso faz com que a pessoa tenha a sensação permanente de ameaça.

Dessa maneira, a pessoa e seu corpo estão em constante estado de alerta, sempre prontos para responder imediatamente a uma situação perigosa, mesmo em contextos seguros, com nervosismo ou agitação, irritabilidade, dificuldade de concentração ou problemas para dormir.

Quando um paciente passou por um acontecimento traumático e desenvolveu TEPT, a ênfase dever ser na psicoeducação sobre o transtorno e seu tratamento, farmacológico e psicoterápico. As principais abordagens são apoio, encorajamento para discutir o evento e a educação sobre uma variedade de mecanismos de enfrentamento (por exemplo, relaxamento). É importante que cada pessoa fale do que lhe aconteceu no seu ritmo e que sua vontade seja respeitada.

Como os pensamentos influenciam no TEPT?

É importante destacar e relembrar que a forma como se interpreta as situações influencia diretamente na forma como se sente, nas reações corporais e nas ações que se realiza em cada situação.

As principais interpretações feitas por pessoas com TEPT são a de que o mundo é perigoso. Vamos novamente usar o exemplo de alguém que tenha sido vítima de um assalto à mão armada dentro de um ônibus. Em condições semelhantes, a pessoa passa a ter pensamentos automáticos (“aquela pessoa que entrou no ônibus agora vai me assaltar”), associados ao sentimento de medo e ansiedade (“eu poderia ter feito algo para evitar o que aconteceu”), com reações físicas de taquicardia, sudorese e dificuldade para respirar.

Assim sendo, uma estratégia muito usada pelas pessoas para diminuir a ansiedade de forma rápida é a evitação. Isso leva a uma redução imediata da ansiedade, porém aumenta o medo em longo prazo. No exemplo anterior, em que a pessoa foi assaltada em um ônibus, a decisão de não andar mais de ônibus dá uma sensação de alívio da ansiedade. Fazendo assim, no entanto, a pessoa reforça a ideia de que estar num ônibus é algo muito perigoso.

Como o problema pode estar sendo mantido?

Através da utilização da evitação como ferramenta de alívio imediato da ansiedade, não se aprende uma melhor forma de se lidar com ela. Evitar pensar no trauma, ao invés de fazer com que se esqueça do episódio, acaba por ter um efeito contrário.

Como lidar com o TEPT?

O principal no tratamento é que a pessoa esteja disposta e se sinta à vontade para, com a ajuda do terapeuta, falar sobre o trauma vivido. No início, não será uma tarefa fácil, mas vai ficando cada vez menos complicado.

  • Reavaliação do modo de pensar: é importante identificar os pensamentos que são causadores de medo, culpa, raiva e vergonha. Depois, o terapeuta ajudará a pessoa a enxergar as situações de formas diferentes.

Por exemplo: um motorista de ônibus que se sentia muito culpado por ter atropelado uma mulher que veio a falecer. Ao entender que foi um caso de suicídio, o pensamento do motorista se modifica. Ele consegue perceber que qualquer pessoa que estivesse dirigindo o ônibus, atropelaria a mulher.

Técnicas de enfrentamento: essa técnica visa ativar a memória traumática e todas as emoções a ela associadas, de modo que, ao final, será possível falar do trauma sem grande incômodo, apenas como algo ruim que aconteceu. O importante é perceber que o trauma está no passado e que, no presente, a vivência é outra.

  • Técnicas de manejo da ansiedade: são usadas técnicas de relaxamento e de respiração no tratamento. A prática dessas técnicas faz com que a pessoa aprenda a manejar e possa diminuir seus sintomas físicos de ansiedade, como tonteira, palpitações e suor nas mãos.

É comum que a pessoa que desenvolveu TEPT pense que nunca mais conseguirá viver como vivia antes do evento. É verdadeiramente muito difícil passar por essas situações de trauma, contudo, através do tratamento pode-se investir em pequenos passos, um de cada vez, para a melhora global da qualidade de vida.

Referência bibliográfica:

Este texto foi baseado na seguinte referência:

VENTURA, P. Capítulo 3 – Transtorno de estresse pós-traumático. In: CARVALHO, M.R.; MALAGRIS, L.E.N.; RANGÉ, B.P. Psicoeducação em Terapia Cognitivo-Comportamental. – Novo Hamburgo: Sinopsys, 2019.

Outra referência:

SADOCK, B.J.; SADOCK, V.A.; RUIZ, P. Compêndio de Psiquiatria: ciência do comportamento e psiquiatria clínica. Capítulo 11 – Transtornos relacionados a traumas e estressores – 11. Ed. – Porto Alegre: Artmed, 2017.

Você sabe o que é Psicoeducação?

É uma abordagem terapêutica que busca desenvolver no paciente, assim como em seus familiares e cuidadores, uma ampliação do conhecimento sobre sua doença e todo o processo de tratamento.

* Por Dr. Alexandre de Rezende

Você sabe o que é Psicoeducação?

A Psicoeducação é uma abordagem terapêutica que busca desenvolver no paciente, assim como em seus familiares e cuidadores, uma ampliação do conhecimento sobre sua doença e todo o processo de tratamento.

Dessa maneira, quanto mais informada estiver uma pessoa acerca de sua condição de saúde física e mental, sobre seu funcionamento (cognitivo, emocional e comportamental) e sobre a forma como pode ser conduzido seu tratamento, mais ela estará pronta para participar ativamente do processo de mudança (Lukens & McFarlene, 2004). Então, os pacientes começam a melhorar quando começam a entender sua forma de reagir e funcionar, a aprender a resolver problemas e a desenvolver um repertório de estratégias que eles mesmo podem aplicar.

Pode-se dizer que a Psicoeducação é uma importante estratégia dentro de uma perspectiva cognitivo-comportamental. Isso porque a terapia cognitivo-comportamental baseia-se no pressuposto de que os pacientes podem aprender estratégias para modificar pensamentos e crenças, manejar estados emocionais e modificar de forma produtiva seu comportamento.

Por exemplo: um paciente com crises de pânico, muito angustiado e preocupado com a possibilidade de estar com um grave problema cardíaco, tende a se acalmar quando descobre que aquelas crises estão inseridas no transtorno do pânico e aprende a lidar com essas ocorrências e com os medos e evitações por elas desencadeados.

A Psicoeducação está entre as práticas baseadas em evidências mais eficazes tanto em ensaios clínicos como em contextos comunitários (Lukens &McFarlene, 2004). Num estudo com 101 indivíduos com transtorno bipolar, aqueles que participaram do grupo de tratamento por psicoeducação, além do tratamento padrão, mostraram menos recaídas em geral, períodos mais longos sem sintomas, menos sintomas e mais adesão à medicação (Miklowitz et al., 2003).

Psicoeducação: como aplicar?

São apontados alguns princípios gerais que podem nortear a aplicação da psicoeducação, sobretudo no contexto da terapia cognitivo-comportamental (Wright et al., 2010):

  1. adaptação da psicoeducação à capacidade dos pacientes de compreender e processar informações.
  2. fornecimento de explicações claras e breves, com ênfase colaborativa, com a utilização de materiais escritos facilitadores.
  3. incentivo à participação do paciente.
  4. solicitação de feedback, de forma a verificar o entendimento do conteúdo apresentado.
  5. recomendações de leituras específicas, pesquisas ou outras atividades educativas como tarefa de casa.

Então, na Psicoeducação podem ser recomendados textos, livros, vídeos, filmes, sites, programas de computador e aplicativos de celular. É sempre importante que o material para a leitura seja conciso e não extenso.

A família do paciente ou cuidadores podem ser inseridos no processo de psicoeducação. Em relação à psicoeducação familiar, algumas metas são importantes:

  • promoção da aceitação familiar do transtorno psiquiátrico;
  • desenvolvimento de expectativas realistas em relação ao paciente;
  • explicações sobre intervenções farmacológicas e psicológicas;
  • reconhecimento de sinais precoces de recaídas e mudanças sintomatológicas.

A Psicoeducação também tem se mostrado efetiva no contexto de doenças físicas, pois o conhecimento sobre elas, suas possíveis causas, modos de controle e os efeitos colaterais das medicações, podem ajudar na adesão ao tratamento e no controle de patologias diversas. Assim, a Psicoeducação tem cada vez mais se destacado como uma importante estratégia no tratamento de diversas queixas e em uma variedade de contextos.

Para saber mais:

Carvalho, M.R., Malagris, L.E.N., & Rangé, B.P. (2019). Psicoeducação em terapia cognitivo-comportamental. Novo Hamburgo: Sinospys.

Referências bibliográficas:

Lukens, E.P. & McFarlane, W.R. (2004). Psychoeducation as evidence-based practice: Considerations for practice, research, and policy. Brief Treatment and Crisis Intervention, 4(3), 205-225.

Miklowitz, D.J., George, E.L., Richards, J.A., Simoneau, T.L., & Suddath, R.L. (2003). A randomized study of family-focused psychoeducation and pharmacotherapy in the outpatient management of bipolar disorder. Archives of General Psychiatry, 60, 904-912.

Wright, J.H., Basco, M.R., & Thase, M.E. (2008). Aprendendo a terapia cognitivo-comportamental: Um guia ilustrado. Porto Alegre: Artmed.