Qual a minha parte em quem meu filho se torna?

E qual mãe e pai não se sentiu culpado por alguma atitude do filho(a)? Qual mãe e pai não se preocupa com o futuro de seu filho(a)?

* Por Diana Lopes

Qual a minha parte em quem meu filho se torna?

Mais uma sessão, mais um psicólogo e sempre nos deparamos: Como eram seus pais? Paulo Gustavo em um vídeo super bem humorado interpreta Dona Hermínia que se indigna com a psicóloga de Marcelina, sua filha, em que a profissional “culpa” a mãe. Apesar da indignação de Dona Hermínia, há qualquer relação em como os pais influenciam a construção do “eu”  de seus filhos.

E qual mãe e pai não se sentiu culpado por alguma atitude do filho(a)? Qual mãe e pai não se preocupa com o futuro de seu filho(a)? Qual mãe e pai não se pergunta se está fazendo o melhor por seu filho(a)? Qual mãe e pai não se procura em características do filho(a)? Mas será que tudo quem é o filho(a) depende dos pais? Vamos buscar juntos uma compreensão sobre isto?

O “eu” é um processo contínuo ao longo de toda vida, assim, não está completamente acabado e estável, está sempre se “tornando”. E isso é igualmente verdadeiro para crianças em desenvolvimento e adultos em desenvolvimento que com quem elas interagem. Por um tempo é imprescindível que crianças pequenas necessitem de proteção e cuidados práticos, como dar banho e comida e colocar para dormir. No entanto, existe um aspecto que vai muito além dessas medidas práticas de sobrevivência de seu filho: o afeto. É o vínculo de apego (os estilos de apego foram tratados neste texto) que viabiliza a sobrevivência e os cuidados e, principalmente, alicerça as características do “eu” de seu filho. Mas isto quer dizer que os pais são os únicos responsáveis por quem o filho(a) se torna?

Apego

Resolvi escrever este texto ao perceber sofrimento, medo e culpa, entre amigos e pacientes maravilhosos em relação aos seus filhos. Excelentes mães e pais querem oferecer o melhor e, às vezes (ou o tempo todo), se cobram muito. Segundo Vygotsky, a relação de apego funciona apropriadamente na “zona de desenvolvimento proximal” da criança, as figuras de apego percebem os sinais da criança e organizam o seu comportamento para promover a proteção e cuidados. Isso significa que pais deveriam deixar as crianças fazerem o que elas podem fazer por si mesmas e fazer por elas o que elas não podem fazer. Esta é uma relação recíproca e sempre buscamos por reciprocidade. O melhor que você pode oferecer para seu filho é reciprocidade e amor. É dessa maneira que os pais auxiliam na criação do eu da criança e do mesmo modo, a interação com os filhos promove mudanças nos pais.

Outros aspectos a serem considerados para essa nossa proposta de compreensão, são de que as crianças recebem um número enorme de influências para construírem o próprio “eu”.  Sua personalidade e sua subjetividade interagem com a comunidade, ambiente, entra em contato com outros exemplos, outras formas de se comportar e pensar ao longo de toda vida, seja na escola, entre amigos e até dentro da própria família. Elas deverão se adaptar e deveriam ser criadas para (e pelo) mundo. É desafiador aceitar que não se tem controle total de como os filhos irão expressar todo o esforço e amor dedicado em sua formação. Deveríamos normalizar que assim que dominamos algum aspecto na educação dos filhos, a criança muda e precisa de algo novo, algo para o qual os pais não estão preparados e para o qual eles próprios devem mudar. É uma dança permanente da interação interpessoal entre pais e filhos. Por isso é tão natural que não tenhamos certeza sobre o mais correto ao educar filhos. Não há certeza sobre a “coisa certa” a fazer pela criança. Não há manual ou receita.

O caminho viável é estar atento à criança. Antes mesmo de aprender a falar, a criança já se comunica por gestos e ações, por isto o melhor guia é se perguntar: o que meu filho(a) está querendo dizer com isso? E se não conseguir traduzir exatamente, não se culpe. Se errar em algum momento com seu filho, não se culpe, não tema, tente reparar, seja empático com a criança, mas não se esqueça de ser empático consigo mesmo(a).

Lembre-se: Talvez a coisa certa a fazer nem exista, o desenvolvimento da criança não depende apenas do pai e da mãe e Dona Hermínia tem razão em se indignar. Em um processo psicoterápico buscamos desvendar o alicerce do desenvolvimento desse “eu” mas a responsabilidade de quem este “eu” se torna é também reflexo de um sentido de organização pessoal. Somos protagonistas de quem nos tornamos. Seus filhos serão protagonistas de quem se tornarem!

Referências:

GUIDANO, V. F. (1988). La complessità del Sé: Un approccio sistemico-processuale alla psicopatologia e alla terapia cognitiva. Torino: Bollati Boringhieri.

LANDA, SOPHIE & DUSCHINSKY, ROBBIE. (2013). Crittenden’s Dynamic-Maturational Model of Attachment and Adaptation. Review of General Psychology. 17. 326. 10.1037/a0032102.

VYGOTSKY, L.S. (2007). A formação social da mente. 7. ed. São Paulo: Martins Fontes.

Vídeo citado: https://www.youtube.com/watch?v=PDRTaFY4u7g

Personalidade e comportamento procrastinador

É muito importante identificar quais fatores atuam para a manutenção desse comportamento para que ações de tratamento possam ter resultado.

* Por Sabrina Gomes

Personalidade e comportamento procrastinador

Procrastinar é um comportamento muito comum e representa um dos grandes problemas da atualidade, pois pode gerar prejuízos importantes na qualidade de vida das pessoas. A procrastinação consiste no adiamento voluntário de tarefas ou da tomada de decisões e, geralmente, está associada a sentimentos negativos, como insatisfação, vergonha e culpa. Isso porque procrastinar leva a frequentes atrasos de prazo, perda de compromissos e diminuição na qualidade das tarefas realizadas.

O comportamento procrastinador normalmente é considerado difícil de ser modificado e muitas intervenções não resultam em melhora para a pessoa, por se tratar de um problema muito complexo e que pode ser resultado de diversos fatores que atuam junto. Assim, é muito importante identificar quais fatores atuam para a manutenção desse comportamento para que ações de tratamento possam ter resultado.

Dentre as diversas condições responsáveis pela procrastinação, algumas características de personalidade podem ajudar a explicar a presença e intensidade desse comportamento. Em seguida, será apresentada uma das teorias mais importantes para a compreensão da personalidade, o modelo dos Cinco Grandes Fatores.

Definindo Personalidade

A personalidade refere-se às características psicológicas, relativamente estáveis, que determinam a forma de pensar, de sentir e de agir. Um dos modelos de compreensão da personalidade é o modelo dos Cinco Grandes Fatores. Este modelo destaca cinco traços amplos que ajudam a formar a personalidade, ou seja, formam o “jeito de ser” de uma pessoa.

Os cinco fatores são:

1) Neuroticismo, que consiste na forma como uma pessoa vivencia as experiências negativas, indicando o seu grau de estabilidade emocional;

2) Extroversão, que representa o quanto uma pessoa é comunicativa, ativa e tem facilidade para estabelecer interações sociais dinâmicas;

3) Abertura para experiências, que é um fator que avalia em que medida uma pessoa tem disponibilidade para vivenciar situações novas, desconhecidas, que lhe demandem uma postura mais criativa;

4) Realização, que representa um fator que avalia o quanto a pessoa é focada, tem disposição para buscar suas metas e é realizadora;

5) Socialização, que revela em que medida a pessoa tem capacidade para estabelecer relações sociais com qualidade, de forma agradável e empática.

Traços de personalidade e a procrastinação

Considerando o modelo dos Cinco Grande Fatores, quatro desses componentes (Neuroticismo, Extroversão, Realização e Socialização) podem ter influência sobre o comportamento de procrastinar, cada um de sua forma. Abaixo, veremos como esses traços de personalidade se relacionam com a procrastinação.

Neuroticismo: pessoas com altos índices de neuroticismo tendem a emitir o comportamento de procrastinar de maneira mais generalizada, uma vez que costumam reagir de forma emocionalmente carregada a um número muito grande de tarefas ou eventos que elevam a ansiedade, a tristeza ou raiva. Geralmente, essas pessoas possuem crenças negativas sobre si mesmas e sobre o mundo, apresentam autoestima diminuída e maior disponibilidade para sintomas depressivos. Pessoas com baixa autoestima, por exemplo, diante do planejamento de uma tarefa de apresentação ao público, podem experimentar sentimentos muito negativos relacionados com pensamentos de menos valia (por ex: “eu não sou capaz de fazer um bom trabalho”; “as pessoas vão rir de mim”), o que faz com que o indivíduo evite a tarefa, uma vez que o simples planejamento desta provoca sentimentos negativos.

Essa forma de agir acaba gerando o efeito “bola de neve”, já que crenças de baixa autoeficácia – “não sou capaz”, fazem com que a pessoa procrastine, o que compromete a qualidade da tarefa e acaba reforçando a ideia de que a pessoa não é capaz de realizar um trabalho com qualidade.

Extroversão: altos índices neste fator podem estar relacionados com atitudes impulsivas e com intensa busca por sensações. Essas pessoas tendem a manter o foco em atividades que proporcionem consequências positivas imediatas e perdem o interesse em tarefas de longo prazo, adiando esse tipo de demanda.

Realização: pessoas com baixo nível de realização apresentam tendência a distração e falta de motivação para a realização de seus projetos. Essas características podem explicar o não engajamento em tarefas que acabam sendo adiadas.

Socialização: baixos níveis no fator socialização geralmente correspondem ao comportamento de confronto de autoridades, com descuido em relação às regras e normas sociais, o que também pode afetar a forma como a pessoa responde às demandas. Por exemplo, a pessoa pode deixar de cumprir um compromisso por não se preocupar com expectativas sociais. Isso quer dizer que a pessoa não sentirá tanta culpa em adiar um evento mesmo que alguém tenha a expectativa de que ela cumprirá o prazo, por exemplo.

A procrastinação é um fenômeno complexo e prevalente que tem relação com diversos fatores. A compreensão do modo de funcionamento cognitivo, emocional e comportamental da pessoa, assim como das características dos diversos ambientes dos quais ela faz parte (acadêmico, familiar, profissional) é fundamental para a elaboração de intervenções mais resolutivas. Neste texto, foi possível compreender como os traços de personalidade podem auxiliar na investigação do comportamento procrastinador.

Referências

Steel, P. (2007). The nature of procrastination: a meta-analytic and theoretical review of quintessential self-regulatory failure. Psychological bulletin133(1), 65.

Leia também o texto do Dr. Alexandre de Rezende, psiquiatra, sobre Procrastinação clicando aqui.

O que é Terapia Cognitiva Comportamental?

O tratamento do sofrimento psíquico através da TCC se baseia no modelo cognitivo – padrão de pensamentos, sentimentos e comportamentos.

* Por Laís Helena Pereira

Afinal, o que é Terapia Cognitiva Comportamental?

A Psicologia enquanto ciência e profissão é ampla e formada por um conjunto de subdisciplinas, que apresentam suas próprias concepções de indivíduo, seus próprios problemas e objetos de estudo, bem como métodos próprios para resolução destes dilemas. A Psicologia Clínica é uma das subdisciplinas e, ao mesmo tempo, é constituída por várias abordagens teóricas que norteiam o processo psicoterapêutico. A Terapia Cognitiva Comportamental ou TCC é uma dessas abordagens.

Sobre a Terapia Cognitiva Comportamental (TCC)

Desenvolvida na década de 60 por Aaron T. Beck, psicanalista e professor de psiquiatria na Universidade da Pensilvânia, a TCC se baseia na premissa de que os seres humanos são perturbados pelos significados que atribuem aos fatos, e não pelos fatos per se”. Ou seja, os indivíduos fazem uma avaliação interna dos fatos, da vida, do mundo, das pessoas e de si mesmos e a partir dessa avaliação experimentam sentimentos e reagem à situação de modo condizente ao seu entendimento. Isso significa que a cognição (os pensamentos e crenças) têm um papel mediacional entre os fatos e as reações emocionais e comportamentais a eles. Seguindo esse princípio, Beck observou que existe um padrão cognitivo entre os pacientes de acordo com o transtorno mental que apresentavam. Este padrão por sua vez é formado por um conjunto de pensamentos e crenças disfuncionais que em alguns aspectos estão distorcidos da realidade.

O tratamento

O tratamento do sofrimento psíquico através da TCC se baseia no modelo cognitivo – padrão de pensamentos/crenças, sentimentos e comportamentos – apresentado pelo indivíduo e, a partir dele, o psicólogo utiliza estratégias cognitivas e comportamentais ao longo das sessões com intuito de corrigir e reestruturar as distorções. Todo o processo acontece através de uma relação colaborativa entre o profissional e o paciente, de modo que o paciente tenha um papel ativo no seu tratamento. Outra forte característica da TCC é a presença constante de psicoeducação durante todo o tratamento. A psicoeducação permite a compreensão, pelo paciente, do seu modelo cognitivo, do seu transtorno, como funcionam e assim, pode aprender sobre o processo terapêutico, habilidades terapêuticas que podem ser aplicadas em diferentes problemas e também aprender a prevenir recorrências.

A Terapia Cognitiva Comportamental foi concebida para ser estruturada, de curta duração, voltada ao presente, direcionada para solução de problemas atuais e modificação de pensamentos e comportamentos disfuncionais.

Em resumo, TCC é uma das abordagens psicoterapêuticas utilizadas pelos psicólogos na condução dos atendimentos clínicos. Cabe ressaltar que atualmente ela é a abordagem considerada padrão ouro para o tratamento de muitos Transtornos Mentais pois milhares de estudos científicos comprovam sua eficácia.

Caso você, leitor, esteja interessado em iniciar um processo psicoterápico, espero ter contribuído para um melhor entendimento a respeito dos aspectos teóricos e práticos da psicoterapia baseada na TCC. Porém, é importante lembrar que as demais abordagens também são eficientes e o processo psicoterápico antes de tudo é uma relação humana em que você precisa se sentir confortável. Se não gostar do primeiro psicólogo que procurou, procure outro e não desista do processo!

Habilidades sociais de adolescentes com Síndrome de Down

Será apresentada uma breve introdução sobre a importância das habilidades sociais para a vida humana e, posteriormente, as informações sobre a pesquisa e seus resultados.

* Por Sabrina Gomes

Habilidades sociais de adolescentes com Síndrome de Down

Inúmeras pesquisas acadêmicas são realizadas no campo da Saúde Mental todo ano. Porém, ainda são modestas as divulgações de seus resultados para a população, o que representa um problema, uma vez que a produção cientifica tem como finalidade promover melhorias na qualidade de vida das pessoas e, portanto, deve ter fácil acesso.

Assim, neste texto, compartilho os resultados preliminares da pesquisa de mestrado que realizei recentemente, pela Universidade Federal de Juiz de Fora. O estudo teve como tema principal as habilidades sociais de adolescentes com Síndrome de Down. Para melhor compreensão, será apresentada uma breve introdução sobre a importância das habilidades sociais para a vida humana e, posteriormente, as informações sobre a pesquisa e seus resultados.

Habilidades Sociais

O tema das relações sociais sempre foi muito discutido na Psicologia. Isso porque a comunicação interpessoal é parte essencial da vida em sociedade. É com razão que a expressão “animais sociais” é muito conhecida e muito usada na definição dos seres humanos.

Na atualidade, com o ritmo de vida acelerado e complexo, fazemos parte de vários grupos e frequentamos diferentes contextos, como família, faculdade e trabalho. Para cada ambiente, novas regras são impostas, nos exigindo constante adaptação. Além disso, com frequência, costumamos atuar em dois ou mais ambientes ao mesmo tempo (o “home office” é um bom exemplo), o que demanda considerável desenvoltura social.

Um bom repertório de habilidades sociais normalmente está associado com bem-estar, bom desempenho acadêmico e sucesso profissional. Por outro lado, o déficit nessas habilidades pode levar a muitos problemas. No campo profissional, por exemplo, o comportamento social inadequado pode ser desastroso! É muito comum encontrar profissionais muito competentes do ponto de vista técnico, mas que são incapazes de interagir de forma eficiente com seus colegas, pacientes ou clientes. Acredito que exista um consenso de que um atendimento ruim pode ser muito desagradável e arruinar nosso dia.  Mas se engana quem pensa que um bom desempenho social se faz importante apenas no trabalho. Ele é necessário quando queremos manter um relacionamento amoroso ou quando queremos fazer novos amigos, por exemplo.

Desse modo, as pesquisas sobre habilidades sociais estão crescendo e podem ser aplicadas a públicos diversos. Com o objetivo de contribuir para os processos de inclusão social de pessoas com deficiência, optamos por investigar o comportamento social de adolescentes com Síndrome de Down. Os resultados serão apresentados a seguir.

A Pesquisa e seus Resultados

A pesquisa investigou as habilidades sociais de adolescentes com Síndrome de Down, buscando compreender suas potencialidades e dificuldades neste campo. Além disso, pensando no desenvolvimento desses jovens, buscou-se avaliar quais práticas educativas dos pais poderiam estar associadas com um melhor desempenho social dos adolescentes.

Identificamos que a maioria dos adolescentes apresentou mais facilidade em situações sociais de expressão de empatia (por exemplo: fazer elogio e oferecer ajuda) e em autocontrole (por exemplo: recusar pedidos e aceitar brincadeiras). Maiores dificuldades foram encontradas em situações sociais que exigiam participação (por exemplo: responder à pergunta do professor e juntar-se a um grupo) e em assertividade (por exemplo: solicitar mudanças de comportamento do outro e defender-se de acusações injustas). Essas dificuldades representam alvos terapêuticos para futuras intervenções.

Contexto familiar

Quanto ao contexto familiar, encontramos um dado muito importante para se pensar no processo de desenvolvimento desses adolescentes. De acordo com os resultados, quanto mais os pais investiam em cobrança de responsabilidade, mais habilidoso socialmente era o adolescente. Isso quer dizer que ambientes que oferecem mais espaço para o desenvolvimento de autonomia e responsabilidade podem promover maior desenvolvimento de competências sociais.

Considerando a importância das habilidades sociais para o desenvolvimento humano, pode ser muito útil para as pessoas aprender mais sobre o próprio comportamento social. Além disso, pode ser ainda mais interessante saber que tal comportamento pode ser modificado e conhecer algumas formas de alcançar essas mudanças. Assim, espera-se que os resultados deste estudo encorajem a realização de mais pesquisas na área.

Referências

Caballo, V. E. (2006). Manual de avaliação e treinamento das habilidades sociais. Santos.