* Por Dr. Leonardo Martins
O consumo problemático de álcool é mais comum que imaginamos. Você sabia que existem registros do consumo de álcool ao longo de milhares de anos da história da humanidade?
Você saberia dizer qual é o padrão de consumo que os estudos apontam como podendo ser considerado um consumo problemático?
Registros arqueológicos apontam que o consumo de bebidas alcoólicas está presente na história da humanidade há mais de 13 mil anos. A sua produção pode inclusive ter iniciado mesmo antes do desenvolvimento das primeiras técnicas agrícolas, necessárias ao cultivo de cereais presentes em
bebidas fermentadas.
Álcool presente em diversos contextos
Com diferentes apresentações, variando em ingredientes, gradação alcoólica, modos de produção e consumo, o álcool está presente na cultura de diversos povos. O seu uso é feito nos mais variados contextos, indo desde o religioso e ritualístico, passando pelo seu uso recreativo presente tanto
na celebração de eventos especiais, quanto em situações cotidianas.
Contudo, o uso de bebidas alcoólicas, em qualquer destes cenários, pode estar associado com episódios de intoxicação, apresentando riscos para a saúde física e mental, assim como consequências sociais relevantes.
O uso problemático de álcool pode ser caracterizado por aquele que está associado com riscos aumentados e prejuízos em qualquer área da vida. Quanto maior a frequência e maior a dose consumida, maior a exposição a fatores que podem levar a tais problemas. A despeito desta relação, elementos contextuais podem alterar a gravidade destas consequências, gerando em alguns casos, recomendações expressas de redução do consumo ou mesmo abstinência.
Riscos do consumo de álcool
O consumo de álcool durante a gravidez é um exemplo, uma vez que neste contexto, todo e qualquer consumo envolve risco para o bebê, sendo expressamente recomendado a não ingestão desta substância. Em um outro contexto, mesmo um único episódio de intoxicação, quando associado com
maiores riscos, pode inclusive envolver desfechos fatais, tais como no caso de acidentes automobilísticos oriundos da associação entre o consumo de álcool e a condução de veículos automotores.
Apesar destes contextos específicos serem muito importantes, evidências apontam de forma clara que o consumo de álcool, mesmo em doses consideradas baixas, não melhora nenhuma condição de saúde, sendo que o seu consumo problemático está relacionado com mais de 200 tipos de problemas de saúde. Neste grupo inclui-se quadros graves, como alguns tipo de câncer, além do desenvolvimento da própria dependência de álcool.
Álcool e saúde mental
Não só a nossa saúde física, mas também nosso bem-estar e saúde mental podem ser afetados pelo consumo problemático de álcool. Estudos consistentes apontam para problemas que muitas vezes nem imaginávamos.
Um exemplo comum, são os prejuízos com o sono, uma vez que o seu consumo prejudica a qualidade e as funções reparadoras do mesmo. O mito da automedicação também segue na mesma direção, já que estudos indicam que é errôneo considerar o uso de álcool como recurso para lidar com tensões do dia-a-dia, uma vez que o mesmo pode tornar-se um gatilho que conduz a experiências de maior tensão, pior humor, aumentando a chance de uma autoadministração futura.
A própria ressaca envolve um conjunto de prejuízos relacionados ao desempenho em tarefas que exigem tanto esforço físico como cognitivo.
Padrões de consumo considerados problemáticos
Mesmo que estejamos cada vez mais conscientes sobre os riscos associados com o consumo exagerado de algumas substâncias, podemos afirmar que o uso problemático de bebidas alcoólicas é amplamente negligenciado. De uma forma geral, tendemos a associar problemas relacionados ao seu
consumo apenas aos casos mais graves, especialmente àqueles relacionados à dependência.
Contudo, o que sabemos que a maior parte dos problemas mencionados aqui, têm seu risco aumentado ou surgem entre pessoas que não são dependentes, mas que fazem um consumo pesado de álcool.
Essas pessoas são também chamadas de usuários de risco e incluem desde pessoas que exageram nos finais de semana, até quem passa por anos bebendo em padrão pesado, mas que ainda não experimentou os prejuízos relacionados. Pensar que somente os casos mais graves correm risco, seria análogo a considerarmos que o consumo exagerado de açúcar pudesse ser um problema apenas para pessoas com diabetes ou com um quadro de obesidade.
Assim como prevenimos problemas de saúde ficando atentos à nossa alimentação e prática de atividades físicas, também podemos prevenir
problemas importantes ao estarmos atentos ao nosso consumo de álcool e seus riscos associados.
Quando procurar ajuda de um profissional
Você consome álcool ou convive com alguém que faz o seu consumo de forma problemática?
Quer saber mais sobre os riscos específicos relacionados à cada condição de saúde ou receber orientações sobre como diminuir seu consumo ou parar de beber?
Recomendamos que caso tenha respondido sim para alguma destas perguntas, procure a ajuda de um profissional de saúde capacitado.
Ao longo dos anos, acumulamos um conjunto importante de evidências científicas que apoiam tratamentos e estratégias de prevenção para os diversos níveis de gravidade associados com o consumo de álcool, incluindo à própria dependência. O papel de um profissional qualificado que conheça essas diferentes estratégias é fundamental para o apoio à pessoa
que vem apresentando problemas ou que possui risco de apresentar no futuro.
Alguns recursos adicionais, apesar de não dispensarem a consulta de um profissional de saúde, podem até ser úteis para que você conheça mais sobre o seu consumo e tenha informações sobre tais problemas. Um exemplo são os sites de informações sobre o assunto desenvolvidos por grupos de
pesquisa, tais como o www.informalcool.org.br (UNIFESP/UFJF/UFPR) e o www.alcoolesaude.com.br desenvolvido por pesquisadores da UFJF.
Leita também sobre transtorno alimentar, clicando aqui.
FONTE: National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism (NIAAA).
Casswell, S. (2019). Will alcohol harm get the global response it deserves?. The Lancet, 394(10207), 1396-1397.
Liu, L., Wang, J., Rosenberg, D., Zhao, H., Lengyel, G., & Nadel, D. (2018). Fermented beverage and food storage in 13,000 y-old stone mortars at Raqefet Cave, Israel: Investigating Natufian ritual feasting. Journal of Archaeological Science: Reports, 21, 783-793.
Steward, J., & Oppenheim, L. A. (1953). Symposium: Did man once live by beer alone. Am Anthro, 55, 515-526.