Boas práticas no uso e conservação de medicamentos

Mais de 1,7 milhão de pessoas buscaram atendimento pela utilização incorreta de remédios no Brasil.

* Texto por Helen Lima, em entrevista à Fernanda Rezende, enfermeira.

Boas práticas no uso e conservação de medicamentos

Mais de 1,7 milhão de pessoas buscaram atendimento pela utilização incorreta de remédios no Brasil.

Você tem uma “farmacinha” própria em casa? Em nome da comodidade e bem-estar imediato, é comum mantermos alguns medicamentos guardados, mas essa prática demanda cautela. A Organização Mundial da Saúde estima que metade de todos os pacientes não utilizam essas substâncias corretamente. Somente em 2022, mais de 1,7 milhão de pessoas buscaram atendimento ambulatorial no Brasil em decorrência do uso incorreto de remédios, de acordo com dados do Ministério da Saúde. A instituição reforça que as dosagens e períodos prescritos devem ser seguidos rigorosamente e a automedicação deve ser evitada.

 

Para lhe ajudar a garantir o efeito esperado e evitar riscos, conversamos com Fernanda Rezende, Enfermeira da Clínica Rezende, que listou uma série de boas práticas no uso e conservação de medicamentos. Confira:

Qual é o local ideal para o armazenamento de remédios?

Fernanda Rezende explica que os medicamentos devem ser mantidos em um lugar fresco, seco e longe da luz, geralmente em armários trancados ou prateleiras mais altas, para evitar o alcance de crianças e pets. Há pessoas que costumam guardar os fármacos na cozinha, o que pode ser perigoso já que o ambiente está sujeito à oscilação de temperatura por conta do fogão e geladeira. A especialista também destaca os perigos do armazenamento no banheiro, pois esse espaço é afetado pela umidade.

“Outra dica é sempre ficar atento aos medicamentos que precisam ser refrigerados, como pomadas dermatológicas, determinados tipos de antibióticos, insulina e remédios para tratar a obesidade”, comenta.

O armazenamento incorreto pode comprometer a eficácia do fármaco e até mesmo gerar algumas substâncias tóxicas capazes de prejudicar o tratamento.

Quais são os principais cuidados ao tomar uma medicação por via oral?

 A enfermeira orienta que os medicamentos psiquiátricos, de maneira geral não devem ser tomados em jejum. Ela explica que esse cuidado reduz a incidência de efeitos colaterais, sobretudo gástricos, como tontura e náusea.

Posso partir os comprimidos ao meio?

 Ocasionalmente, alguns médicos podem indicar o uso de meio comprimido, sobretudo no início do tratamento, para que o organismo vá se acostumando aos poucos com a medicação, prevenindo reações adversas. Nesse caso, o ideal é o uso de comprimidos sulcados, que podem, dessa forma, ser partidos.

Com exceção desses casos, Fernanda não indica a fragmentação dos comprimidos, ainda que seja feita com o uso de cortadores, pois não existe garantia de que as doses repartidas estarão devidamente uniformes.

Quais são as principais dicas para não esquecer o horário de tomar os remédios?

Fernanda Rezende conta que a criação de alarmes no celular é uma das práticas mais comuns e efetivas entre os usuários e destaca a importância de guardar a prescrição junto com o medicamento, já que o documento reúne informações essenciais como dosagens, horários e período de uso. Ela recomenda que os pacientes colem a receita em um local que seja visto, como no guarda-roupas ou na geladeira. Caso a prescrição fique retida na farmácia, não deixe de fazer uma cópia.

Ainda assim, algumas pessoas, principalmente idosos, esquecem de tomar o remédio no horário certo. Nesses casos, a indicação da enfermeira é contar com a ajuda de familiares ou amigos para lembrá-los. “Uma outra dica que funciona bem com pacientes mais velhos é trabalhar com desenhos. Faça um sol nas caixas dos medicamentos que devem ser tomados durante o dia e uma lua ou estrela nos medicamentos da noite”.

A preocupação em seguir as orientações dos médicos não é à toa, afinal, somente dessa forma é possível alcançar os desfechos desejados. No caso de ansiolíticos e antidepressivos, por exemplo, Fernanda explica que existem determinados tipos de substâncias que demoram cerca de 6 semanas para alcançar o efeito pleno no organismo. Por isso, é necessário paciência e disciplina no uso dessas medicações. “Não adianta tomar só no momento em que você está precisando, como no estado de tristeza durante a depressão. As medicações precisam ser tomadas de modo contínuo”, destaca.

A enfermeira também faz um alerta importante aos pacientes, principalmente para aqueles que fazem tratamentos de saúde mental: “apesar de ser essencial, o remédio não vai resolver todos os seus problemas num passe de mágica. Ele existe para dar um pontapé inicial na recuperação, mas sozinho nem sempre é suficiente. Terapia, atividade física e fé são alguns recursos importantes para complementar esse tratamento”.

Conte sempre com a orientação de um profissional de saúde para fazer o uso consciente dos medicamentos.

Quais são as consequências psicológicas do alcoolismo?

O consumo excessivo de bebidas alcoólicas pode alterar as funções cognitivas do usuário, comprometer relações sociais e afetar a saúde mental de seus familiares e amigos.

* Texto por Helen Lima, em entrevista à Amanda Oliveira, psicóloga.

Quais são as consequências psicológicas do alcoolismo?

O consumo excessivo de bebidas alcoólicas pode alterar as funções cognitivas do usuário, comprometer relações sociais e afetar a saúde mental de seus familiares e amigos.

Danos ao fígado, aumento do risco de cânceres e doenças cardiovasculares, perigo de lesões, episódios de violência e acidentes de trânsito. Esses são alguns dos problemas de saúde associados ao alcoolismo, condição em que a pessoa estabelece uma relação de dependência com a bebida alcoólica. Além dos danos à saúde física, o alcoolismo tem o potencial de comprometer a saúde mental do indivíduo, impactando diversas áreas da sua vida, desde a dinâmica familiar às atividades do trabalho. Segundo Amanda Oliveira, Psicóloga da Clínica Rezende, esses setores estão intimamente relacionados, gerando um efeito dominó que afeta todo o aspecto emocional do paciente. “No caso de dependência, o ato de beber se torna o afazer central na vida do indivíduo, logo, todos os comportamentos são direcionados para o consumo. Os gastos financeiros e os lugares de interesse giram em torno da substância, assim como a proximidade de pessoas que apresentam padrão semelhante de consumo”.

A especialista explica que o uso abusivo do álcool está associado a modificações cognitivas, como alteração da capacidade de memória, maior impulsividade e dificuldades de atenção e aprendizagem. Os vínculos sociais e ocupacionais do usuário também são fragilizados, podendo levar a conflitos familiares, falta de confiança entre amigos e dificuldade para se manter em um emprego. Esses efeitos contribuem para que a pessoa tenha uma visão negativa de si. “Percepções como ‘eu não consigo fazer nada útil’, ‘não tenho valor’ e ‘sou um zero à esquerda’ podem aparecer acompanhadas de emoções desconfortáveis, como vergonha, medo e tristeza, intensificando o isolamento social”, destaca.

Os efeitos emocionais não se restringem a quem sofre com a dependência

Além de evidenciar os prejuízos que o alcoolismo pode trazer à saúde mental dos usuários, a psicóloga reforça que o consumo de álcool é uma questão de saúde pública, trazendo consequências para toda a sociedade. Quem faz parte da rede de apoio de um indivíduo com dependência tem a possibilidade ainda maior de se expor a esses riscos. “Essas pessoas podem sentir e/ou observar negligências na manutenção da relação, o que pode impactar sua autopercepção, principalmente em casos em que o indivíduo com dependência é uma figura parental. Elas ainda têm o maior potencial de passar por vivências traumáticas e situações ansiogênicas, como antecipar problemas em festas de final de ano, por exemplo”.

Amanda Oliveira pontua que amigos e familiares também podem internalizar que são os responsáveis pela dependência do usuário, assumindo para si a capacidade de fazer o outro mudar de comportamento. “Isso é um prato cheio para frustração, sensação de incapacidade e culpa”, afirma. Compreender a nossa limitação diante das escolhas e atitudes do outro é uma das principais orientações que a profissional oferece às pessoas que integram as redes de apoio. Além disso, ela lista outras iniciativas para quem quer ajudar um ente querido, mas não sabe como:

  • Em primeiro lugar, cuide de si e da sua própria saúde;
  • Ofereça apoio e acolhimento ao usuário com uma escuta ativa e, se possível, sem julgamentos;
  • Evite confrontos diretos com a pessoa, principalmente em momentos de crise;
  • Incentive o tratamento com profissionais especializados.

Não existe consumo seguro de álcool

 Apesar de vivermos em uma sociedade que naturaliza e estimula o consumo de bebidas alcoólicas, a Organização Mundial da Saúde é categórica ao declarar que não existe limite seguro para o uso da substância. Essa ambivalência pode gerar certa confusão entre as pessoas em relação ao comportamento de consumo. A psicóloga destaca que devemos ficar atentos aos prejuízos que esse hábito pode gerar, como gastos indevidos, relações sexuais sem proteção, brigas, acidentes e lesões. Caso você tenha dificuldade em alterar seu padrão de consumo, perceba que está aumentando a quantidade, realize o consumo em situações inoportunas, beba por mais tempo que o planejado e/ou reduza atividades importantes em função do álcool, é recomendado que busque ajuda.

Leia também: Quando o consumo de álcool se torna dependência?

A luta contra a dependência de álcool é complexa, repleta de estigmas e preconceitos que podem prejudicar a autoestima e a recuperação dos pacientes. Amanda Oliveira levanta uma reflexão oportuna sobre o tema: “Por que bebemos e usamos drogas? Qual é a finalidade? Falamos sobre os impactos da dependência, mas, nessa via de mão dupla, a perda de um emprego, conflitos familiares e a sensação de solidão também podem estimular o uso”. Contar com acompanhamento psicológico é importante para lidar com emoções e eventos como esses, de forma que eles não se tornem a causa, nem a consequência, de problemas ainda mais graves.

Mês do Idoso: tire suas dúvidas sobre o Alzheimer

A doença de Alzheimer tem caráter progressivo, ou seja, as alterações de memória devem piorar de forma contínua ao longo do tempo. As queixas também devem trazer limitações funcionais para o paciente, como a dificuldade para ir à padaria comprar o café da manhã, sacar dinheiro no caixa eletrônico ou cuidar das tarefas domésticas, por exemplo.

* Texto por Helen Lima, em entrevista ao Dr. Danilo Jorge da Silva, neurologista.

Mês do Idoso: tire suas dúvidas sobre o Alzheimer

Em outubro é comemorado o Dia Nacional do Idoso (01/10), data em que as autoridades políticas, entidades sociais e instituições de saúde chamam a atenção para estratégias em prol do envelhecimento saudável. O número de pessoas acima dos 60 anos está crescendo no Brasil e, segundo projeção do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nosso país terá mais idosos do que jovens em 2060. A terceira idade é a fase em que as pessoas celebram a experiência de vida e o descanso depois de longos anos dedicados ao trabalho, mas também é marcada pelo alto risco de problemas de saúde e comprometimento das atividades cotidianas. O Alzheimer, por exemplo, é a forma mais comum de demência que se conhece, levando a um processo neurodegenerativo que não tem cura e ocasiona limitações funcionais nos pacientes, principalmente após os 65 anos.

Conversamos com o Dr. Danilo Jorge da Silva, Neurologista da Clínica Rezende, para tirar as principais dúvidas sobre a doença e destacar a importância do diagnóstico precoce na qualidade de vida das pessoas que vivem com essa enfermidade. Confira a seguir:

Atenção aos sinais de alerta

O Dr. Danilo explica que todos os indivíduos, independente da idade, estão sujeitos a eventos que causam o comprometimento da memória, como a má qualidade do sono, hábitos de vida inadequados e episódios depressivos. O que diferencia esses casos da demência, como o Alzheimer, são critérios que devem ser avaliados cautelosamente por um profissional especializado.

“A doença de Alzheimer tem caráter progressivo, ou seja, as alterações de memória devem piorar de forma contínua ao longo do tempo. As queixas também devem trazer limitações funcionais para o paciente, como a dificuldade para ir à padaria comprar o café da manhã, sacar dinheiro no caixa eletrônico ou cuidar das tarefas domésticas, por exemplo. Além disso, nós não podemos falar em Alzheimer quando o comprometimento ocorre em apenas uma modalidade cognitiva, como o recordatório de nomes, fatos e eventos”, destaca. Vale ressaltar que essa enfermidade também impacta a linguagem e percepção de mundo, provocando mudanças no comportamento, humor e personalidade dos pacientes.

O especialista também chama atenção para uma particularidade na herança genética da doença, o que chama de “uma exceção incomum”: “o fato de se ter um familiar com Alzheimer, via de regra, não aumenta seu risco de manifestá-la”.

Prevenção e diagnóstico precoce

Atualmente, não há nenhum tipo de tratamento capaz de prevenir ou retardar o processo neurodegenerativo do Alzheimer, mas existem estratégias para estimular o desenvolvimento cerebral que podem ajudar a abrandar os sintomas da doença, caso ela se manifeste. “Atividades como caça-palavras, palavras cruzadas, leitura e trabalhos manuais como crochê e tricô são considerados saudáveis para o cérebro e auxiliam na manutenção de uma boa reserva cognitiva”, recomenda o Neurologista.

O Dr. Danilo também reforça o valor da detecção precoce da doença, mesmo que ainda não seja possível curá-la. “O diagnóstico precoce é importante para que se tomem medidas que impeçam que causas concorrentes (doenças evitáveis, hábitos e rotinas inadequados) possam piorar os sintomas cognitivos. Além disso, há tratamentos que visam melhorar essas manifestações e garantir uma melhor qualidade de vida ao paciente”.

Esperança para o futuro

Cerca de 100 mil novos casos da Doença de Alzheimer são diagnosticados por ano no Brasil, segundo o Ministério da Saúde. Em todo o mundo, o número chega a 50 milhões de pessoas e, de acordo com estimativas da Alzheimer’s Disease International, essa marca poderá ultrapassar os 130 milhões em 2050, devido ao envelhecimento da população. As estatísticas alarmantes caracterizam, nas palavras do ministério, “uma crise global de saúde que deve ser enfrentada”.

A ciência vem se empenhando na busca por tratamentos mais eficientes para a doença. O Dr. Danilo Jorge da Silva afirma que estamos vivendo uma “era dourada” para a pesquisa relacionada a enfermidades antes tidas como intratáveis ou incuráveis. “Terapias genéticas e imunobiológicas de ponta estão se tornando uma realidade cada vez mais acessível e próxima da população em geral”; e finaliza com uma mensagem otimista: “a perspectiva de novos tratamentos para o Alzheimer é bastante sólida a médio prazo”.

Psicanálise?

“Há quem diga que “esse papo de Freud está ultrapassado. Com tantas mudanças em um século, Freud já era!” Ou ainda: “A psicanálise já era!””

* Por Vívian Hauck

“Há quem diga que “esse papo de Freud está ultrapassado. Com tantas mudanças em um século, Freud já era!” Ou ainda: “A psicanálise já era!””

(Maurano, 2010, p.9)

 

A pré-história da psicanálise

A criação da psicanálise tem sua origem nas investigações de Freud acerca da histeria no fim do século XIX. Os quadros histéricos da época traziam consigo o enigma do que haveria para além dos quadros orgânicos já conhecidos pela medicina, desafiando os conhecimentos científicos com sintomas que não correspondiam às alterações nervosas esperadas. Eram pacientes, por exemplo, que desenvolviam uma paralisia em membros inferiores sem correspondência de alteração específica no sistema nervoso.

Após testemunhar múltiplas tentativas por parte dos médicos da época de intervenções sem sucesso, Freud acompanha e investe no trabalho com o hipnotismo juntamente com Josef Breuer, médico vienense. O trabalho consistia em induzir a paciente enferma, sob hipnose, a recordar seus traumas esquecidos – aos quais não tinham acesso em estado de consciência –  e reagir de modo a exteriorizar seu afeto, procedimento denominado de “método catártico”. Como efeito desse procedimento ocorria o desaparecimento do sintoma, que passa a ser compreendido, então, como uma conversão de um afeto que não pôde ser exteriorizado em um quadro somático sem correspondência orgânica.

A hipnose, contudo, foi abandonada por Freud por identificar que os resultados deste método, apesar de perceptíveis pouco tempo após a intervenção, eram pouco duradouros e fortemente dependentes da relação pessoal do paciente com o médico. Freud segue então para a criação da psicanálise, que herda alguns aspectos deste tempo de trabalho com o hipnotismo, como:

  •  o reconhecimento da autenticidade dos fenômenos histéricos;
  • a compreensão de que a etiologia dos sintomas histéricos estaria vinculada à vida emocional (afetiva) e a um jogo de forças psíquicas (impulso X supressão de afetos);
  •  a noção de que os sintomas, as manifestações patológicas, seriam dotadas de sentido e não formações aleatórias;
  •  e o mais importante aspecto da teoria psicanalítica, a prova da existência de processos psíquicos inconscientes:

“Ele [o inconsciente] se tornou pela primeira vez concreto, palpável e objeto de experimento.” – Freud, 1924, p.224-225

Um pouco sobre o início da psicanálise

Com o abandono da hipnose, Freud deparou-se com a necessidade de substituí-la por outra técnica que pudesse também fazer emergir algo do inconsciente. Instituiu, assim, a técnica da associação livre, a “regra psicanalítica fundamental”, que consistia em instruir aos pacientes que se entregassem ao curso de seus pensamentos espontâneos e involuntários e os transmitisse ao psicanalista ainda que fossem desagradáveis ou que lhes parecessem absurdos. Sua expectativa era de que, suprimida a intenção do pensamento consciente, a fala do paciente seria determinada pelo material inconsciente.

Contudo, esbarrou com uma resistência constante, que não aparecia durante a hipnose e que dificultava a comunicação do conteúdo de etiologia patológica. Só assim pôde identificar que os conteúdos patológicos não eram esquecidos de forma aleatória. Seu esquecimento seria o resultado de outra força psíquica que objetivava o afastamento dessas lembranças do consciente, ou seja, a sua repressão. O sintoma, portanto, seria uma expressão deste conteúdo reprimido, um substituto para satisfações proibidas. Satisfações essas que já não poderiam ser satisfeitas desde a infância, período da vida que deteve a atenção de Freud em seu estudo sobre as neuroses.

Não sendo então possível acessar sem barreiras o inconsciente, como escutá-lo? Freud passa a enfatizar dois elementos cotidianos que dariam notícia do inconsciente e seriam passíveis de serem escutados a partir da fala dos pacientes. O primeiro, os atos falhos, que antes eram tidos como elementos desimportantes, vinculados apenas ao cansaço ou à desatenção: pequenos esquecimentos, troca de palavras na fala ou de letras na escrita, mudança involuntária de um objeto de local etc.. O segundo, os sonhos – que tiveram seu mecanismo estudado extensamente por Freud por identificar a similaridade entre a sua formação e o mecanismo de formação dos sintomas neuróticos-, acessíveis parcialmente pelo relato dos pacientes nas sessões.

Essas descobertas vieram dar notícia não só sobre os fenômenos patológicos, mas também sobre o funcionamento humano dito normal. A partir disso, Freud assume que o jogo de forças entre desejo e repressão, a possibilidade ou não de acesso de determinados pensamentos à consciência, estaria presente no funcionamento de todo ser humano, seríamos todos sujeitos ao funcionamento do inconsciente.  A Psicanálise faz sua passagem, assim, de um estudo exclusivo da patologia para o estudo do funcionamento do psiquismo humano com ênfase no papel fundamental do inconsciente.

 

Psicanálise hoje: a psicanálise já era?

A partir do que pudemos ver com a história da criação da Psicanálise, constatamos que ela se origina lá nos primeiros trabalhos em busca de desvendar os enigmas dos sintomas da histeria. É com a compreensão de que esses sintomas teriam “algo a mais” a dizer e de que viriam para noticiar um mal-estar psíquico, uma insatisfação, que a psicanálise inicia sua busca para a construção de um arcabouço teórico-clínico que pudesse dar conta da formação desses sintomas. Quanto ao mal-estar e à insatisfação, Freud os encara não como algo necessariamente ruim a ser sanado/resolvido, mas como algo inerente e crucial para a constituição de cada sujeito inserido num contexto social e numa cultura – especialmente nas sociedades ocidentais desde o fim do século XVIII. É preciso abdicar parcialmente dos próprios desejos para que se possa conviver em sociedade e se inserir em relações afetivas. O que significa dizer que os sintomas, em menor ou maior grau, se farão presentes na vida de todos nós. Quando se fala de estrutura neurótica, não há outra forma.

É por isso mesmo, por ser a insatisfação e a impossibilidade de realização direta dos desejos constituintes de cada sujeito, que podemos dizer que os sintomas de outrora seguem presentes na contemporaneidade, ainda que com apresentações diversificadas e com novos enigmas. No nosso tempo, são inclusive inúmeras as tentativas de resolver e minar essa insatisfação e essa falta, como, por exemplo, pela via do consumo excessivo de medicações, substâncias psicoativas, tecnologias, informação, alimentos etc. ou por profissionais “milagrosos” que prometem ensinar “x passos para que você seja, finalmente, 100% feliz”. Não é surpresa dizer que essas promessas fáceis não funcionam e que, inclusive, muitas vezes só acabam gerando maior sofrimento, angústia e afastamento dos próprios desejos.

Na contramão dessas propostas, encontra-se a Psicanálise, que:

desde seus suados primórdios no rigor da ética cunhada por Freud, [sua proposta] foi a de ser uma estratégia para tratar desse vazio, que na maior parte do tempo traduzimos por falta de alguma coisa ou falta de alguém. Sua intenção não foi a de constituir-se como promessa de saná-lo. Aqui, o tratamento é a cura, já que não podemos nos curar da ferida de sermos humanos. Ou seja, substituindo a idéia de cura como o que estaria na finalização de um tratamento, por meio da extirpação de um mal, entra em cena o procedimento investigativo do tratamento psicanalítico, que traz como uma de suas conseqüências o efeito terapêutico. O vazio é impossível de ser extirpado, mas cabe-nos encontrar meios menos nefastos de abordá-lo. Como li num folhetim: “Não se pode mudar a direção do vento, mas pode-se alterar a posição das velas.” (Maurano, 2010, p.14-15).

 

A psicanálise não recua diante do mal-estar inerente à vida humana. Não recuou há mais de cem anos e não recua hoje, diante dos sintomas de nossa época. Em tempos de escassez de palavras, relações frágeis e excesso de estímulos, ela dá lugar a cada sujeito, a seu mal-estar, sintomas e dificuldades sem promessas de soluções instantâneas, mas com a escuta atenta que cada um que adentra o consultório merece. Escuta que se desdobra em produções clínico-teóricas dos mais diferentes quadros clínicos para pensar hipóteses acerca das formações de sintoma e das direções de tratamento. Não à toa, a formação de um psicanalista é prevista para a vida toda. A psicanálise era e ainda é: enquanto houver trabalho clínico, haverá questionamento, estudo, atualizações e reatualizações. Diante do mal-estar contemporâneo não haverá fuga ou resoluções rápidas. Haverá, isso sim, escuta e muito trabalho.

Principais referências utilizadas para a escrita do texto:

FREUD, S. Resumo da Psicanálise (1924). In: Obras Completas, volume 16: O eu e o id, “autobiografia” e outros textos (1923-1925) [tradução Paulo César de Souza]. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.

MAURANO, D. Pra que serve a psicanálise? Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2010 (3ª ed.).

Crianças agitadas e desatentas: nem sempre é TDAH!

Psicóloga explica os comportamentos que podem ser associados ao transtorno e alerta sobre os cuidados para evitar diagnósticos equivocados.

* Texto por Helen Lima, em entrevista à Ana Carolina Arantes, Psicóloga infantil.

Crianças agitadas e desatentas: nem sempre é TDAH!

Psicóloga explica os comportamentos que podem ser associados ao transtorno e alerta sobre os cuidados para evitar diagnósticos equivocados.

Inquietude, impulsividade e desatenção, esses são alguns dos sintomas que podem indicar o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), condição neurobiológica que acomete entre 5% a 8% da população mundial, segundo a Associação Brasileira do Déficit de Atenção – ABDA. O transtorno ganhou visibilidade por meio das redes sociais, que ampliaram o debate acerca dos sintomas e tratamento, mas também acenderam um alerta em relação à complexidade do seu diagnóstico. Ana Carolina Arantes, Psicóloga da Clínica Rezende e Especialista em Saúde Mental da criança e do adolescente, reforça que não se deve acreditar em qualquer informação disponível no meio digital e que apenas um profissional especializado é capaz de identificar o TDAH com propriedade.

“Nem toda agitação e desatenção é TDAH. Esses comportamentos podem representar uma série de questões do desenvolvimento infantil e precisam ser avaliadas com cuidado. Qualidade do sono, ambiente familiar e metodologia escolar são exemplos de algumas dimensões a serem observadas”. Ana Carolina Arantes ressalta a importância de avaliar o contexto em que a criança está inserida antes de atribuir uma atitude ao transtorno. “O comportamento arteiro muitas vezes é a demonstração de que algum elemento no meio em que ela vive não está atendendo às suas demandas, como por exemplo, a necessidade de expressar suas emoções”.

A especialista destaca ainda que outros transtornos de ordem mental, como os transtornos de ansiedade, incluindo o do estresse pós-traumático e os de humor, como a depressão, podem apresentar sintomas semelhantes ao do TDAH e por isso devem ser descartados por um psicólogo/psiquiatra especialista em infância. Há também condições médicas que merecem avaliação para diagnóstico diferencial como transtornos do sono, epilepsia, síndromes genéticas, deficiência de ferro e vitaminas e mau funcionamento da tireoide, pois essas condições também podem gerar sinais parecidos com os do TDAH. “O diagnóstico do TDAH é essencialmente clínico, não há exames. É preciso uma equipe de saúde mental especializada para investigar o histórico médico, psicológico, comportamental e cognitivo da criança a fim de detectar a origem dos sintomas de agitação/impulsividade e/ou desatenção”.

Ana Carolina também chama a atenção para a ampla oferta de informações sobre o transtorno que estão disponíveis na internet. “Uma pesquisa recente mostrou que grande parte dos conteúdos são feitos por profissionais que não são especializados em saúde mental, então, eles acabam generalizando conceitos e passando informações erradas para as pessoas”. Ela recomenda verificar se quem está falando sobre TDAH é verdadeiramente um profissional de saúde atuante e se este está registrado junto ao conselho de sua categoria.

É possível prevenir o TDAH?

O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade apresenta um importante componente genético que faz com que filhos de pai ou mãe com essa condição tenham uma maior predisposição a manifestá-la. Porém, a especialista conta que o transtorno se desenvolve a partir da interação entre genética e ambiente, sendo assim, é possível aumentar os fatores de proteção à criança, tomando, entre outras, as providências a seguir:

  • Monitoramento positivo dos pais e demais cuidadores que acompanham e supervisionam as atividades dos filhos, inclusive as escolares;
  • Estimulação diária do brincar em diferentes dimensões (imaginativo, jogos de “minha vez e sua vez”, brincadeiras de corpo inteiro, brincadeiras sensoriais, etc.);
  • Alimentação balanceada e um sono de qualidade;
  • Escolha de uma escola respeitosa às características do seu filho(a);
  • Estabelecimento de limites realistas e estilo parental não punitivo (focado no apoio e desenvolvimento de habilidades);
  • Incentivo ao contato com a natureza e brincadeiras com colegas da mesma idade;
  • Promoção de um ambiente familiar afetuoso, que propicie à criança expressar suas emoções e desenvolver sua autonomia;
  • Limites ao tempo de tela, seguindo as recomendações da Sociedade Brasileira de Pediatria;
  • Incentivo à prática da atividade física regular;
  • Elaboração com imagens na organização diária da rotina, construída preferencialmente junto com a criança.

Do diagnóstico ao tratamento, o TDAH tem se mostrado muito heterogêneo, podendo ter uma manifestação desatenta, impulsiva/hiperativa ou, até mesmo, uma manifestação combinada desses dois comportamentos. Ana Carolina Arantes explica que existem ainda outras questões envolvidas, como o temperamento da criança e a configuração familiar e, por isso, se faz necessário um acompanhamento individualizado. “É preciso o olhar de um psicólogo especialista para cada singularidade, pois o TDAH afeta a qualidade de vida da criança e de sua família de diferentes maneiras”.

Por fim, a profissional ressalta o quão importante é a participação dos pais em todo o processo: “o tratamento psicoterápico com maior evidência científica contempla a Orientação de pais pelo viés da Terapia Cognitivo Comportamental. É preciso que o psicólogo ofereça informações à família sobre o que é o TDAH e proponha reflexões nas habilidades dos pais para o desenvolvimento de posturas e estratégias práticas que busquem minimizar os desafios do transtorno”.

Se você está percebendo indícios do Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade em uma criança, conte com a ajuda de um profissional de saúde. Psicólogos, Psiquiatras e Pediatras são os especialistas mais indicados para o acompanhamento e eventuais encaminhamentos desse caso.

Quais são os sinais que indicam excesso no uso de telas pelas crianças?

Psicóloga Infantil alerta para as consequências desse comportamento à saúde mental dos pequenos.

* Texto por Helen Lima, em entrevista à Laís Verçoza, psicóloga infantil.

Quais são os sinais que indicam excesso no uso de telas pelas crianças?

Psicóloga Infantil alerta para as consequências desse comportamento à saúde mental dos pequenos.

As crianças da geração atual já nasceram em um mundo hiperconectado, repleto de estímulos visuais e sonoros vindos de dispositivos eletrônicos como celulares, televisores e tablets.  Se utilizada de forma responsável, essa interatividade pode ser uma ferramenta importante no processo de aprendizado, mas especialistas chamam atenção para o excesso de exposição às telas. A prática se consolidou durante a pandemia, diante da impossibilidade dos pequenos frequentarem a escola e saírem para brincar ao ar livre. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o uso exagerado das telas pode influenciar no atraso do desenvolvimento de habilidades de comunicação e interação social. 

Laís Verçoza, Psicóloga Infantil na Clínica Rezende, destaca que são inúmeras as consequências desse hábito na infância, entre elas o aumento de sintomas ansiosos e depressivos, isolamento social, agressividade e dificuldade de concentração em outras atividades do cotidiano. “De forma geral, todo o desenvolvimento emocional da criança pode ser prejudicado com o uso excessivo das telas, pois se elas passam a maior parte do tempo envolvidas com os dispositivos eletrônicos, terão menos oportunidades de interagir pessoalmente com seus pares e explorar seus sentimentos”. 

A especialista também reforça a influência que as redes sociais podem exercer na formação da autoestima dos pequenos. “Eles podem sentir que não estão atendendo aos padrões – muitas vezes irreais – estabelecidos pela sociedade, fazer comparações com outras pessoas e até mesmo serem vítimas de cyberbullying (quando as agressões e intimidações acontecem no ambiente digital)”. 

Familiares devem ficar atentos aos sinais de excesso

Os pais e demais pessoas envolvidas no cuidado das crianças são aliados importantes para combater o uso nocivo dos eletrônicos. Laís Verçoza lista alguns indícios de que o tempo de tela está ultrapassando um limite saudável, confira: 

  • Mudanças de comportamento, como querer ficar sempre sozinho no quarto e deixar de fazer atividades que gostava, como sair de casa e praticar esportes;
  • Impaciência, ansiedade e agressividade, principalmente quando a família tenta proibir ou reduzir o uso de eletrônicos; 
  • Alterações no padrão de sono;
  • Diminuição do rendimento acadêmico. 

Diante desses sinais, a profissional recomenda o acompanhamento psicológico como uma alternativa extremamente benéfica para auxiliar os pequenos a estabelecerem uma relação mais saudável com as telas. “Ao realizar uma avaliação individualizada, o Psicólogo irá entender melhor o padrão de uso da criança, bem como os hábitos e comportamentos relacionados, identificando aspectos emocionais que podem estar influenciando nesse excesso. O tratamento ajuda na regulação emocional, no manejo da ansiedade e de outros sentimentos”. Laís complementa dizendo que esse acompanhamento também tem a função de orientar os cuidadores, apoiando-os na definição de estratégias para o bom uso das telas. 

A responsabilidade é coletiva

A Sociedade Brasileira de Pediatria possui um Manual de Orientação sobre o uso de telas, no qual recomenda a limitação de tempo de acordo com a faixa etária da criança: 

  • Até dois anos de idade, é bom evitar a exposição às telas, mesmo que passivamente; 
  • De 2 a 5 anos, o tempo deve ser limitado a no máximo 1 hora por dia, sempre sob supervisão de um adulto; 
  • Crianças entre 6 e 10 anos devem limitar o tempo de 1 até 2 horas por dia, sob supervisão; 
  • Adolescentes entre 11 e 18 anos não devem ultrapassar o máximo de 3 horas por dia, ainda sob supervisão. É importante evitar o uso à noite, não sendo indicado “virar a madrugada” nas telas. 
  • Em todas as idades, é fundamental não utilizar as telas durante as refeições e se desconectar uma ou duas horas antes de dormir.

A Psicóloga da Clínica Rezende aconselha que os pais e demais responsáveis incentivem programas offline, como brincadeiras ao ar livre e atividades artísticas, promovendo momentos de maior convivência familiar. Ela também chama a atenção para os cuidados com a segurança das crianças no ambiente digital. “Monitorar o que o seu filho está vendo e jogando é muito importante. Estimule a comunicação e oriente sobre a importância do equilíbrio”. 

Laís Verçoza ressalta a necessidade dos responsáveis se envolverem ativamente no desenvolvimento de hábitos saudáveis relacionados ao uso das telas. “As crianças aprendem principalmente pelo exemplo e pela observação dos comportamentos da família. Se elas veem o adulto passar muito tempo nos dispositivos eletrônicos, sem disponibilidade para estar efetivamente presente, é natural que o interesse pelas telas aumente”.

O uso do Ozempic no tratamento do diabetes

Medicamento é recomendado para controle da glicose no sangue e tem como um dos principais benefícios a redução do apetite. Especialista alerta para a necessidade de acompanhamento durante o tratamento.

*Texto por Helen Lima, em entrevista à Dra. Mariana Ferreira, Endocrinologista.

O uso do Ozempic no tratamento do diabetes

Medicamento é recomendado para controle da glicose no sangue e tem como um dos principais benefícios a redução do apetite. Especialista alerta para a necessidade de acompanhamento durante o tratamento.

Se no passado o diagnóstico de diabetes era encarado como uma sentença, o presente traz uma perspectiva mais otimista: com o tratamento adequado, é possível conviver com a doença e ter qualidade de vida. O uso de medicamentos é uma das principais estratégias de controle do diabetes, doença crônica na qual o corpo não produz insulina ou não consegue empregar adequadamente a insulina que produz, e o Ozempic tem se destacado nessa tarefa.

O fármaco contém o princípio ativo da semaglutida, substância semelhante ao hormônio GLP-1, que é produzido no intestino e reduz o açúcar no sangue em momentos de elevação. Além disso, ele atua no controle dos hormônios do apetite e na diminuição da velocidade de esvaziamento do estômago. A eficácia da semaglutida viralizou nas redes sociais levando a casos de escassez nas farmácias do Brasil e do mundo. Seu diferencial está na efetividade em promover a perda de peso e o seu uso, que antes era aprovado apenas para o tratamento do diabetes, agora também é permitido para auxiliar no combate à obesidade, só que em uma dosagem ainda não comercializada no país.

Apesar das vantagens evidentes, é preciso cautela no uso do Ozempic, como explica a Dra. Mariana Ferreira, endocrinologista da Clínica Rezende. “Primeiramente, é fundamental utilizar o remédio sob prescrição pois, como toda medicação, ele conta com indicações e contraindicações, além de ter o perfil de paciente que se beneficia mais dessa terapia. Durante a consulta, orientamos sobre a forma de aplicação e conservação do medicamento. Esse acompanhamento também é necessário para avaliar a resposta e possíveis efeitos colaterais, como os enjoos”.

A especialista reforça a importância da atuação do médico endocrinologista no tratamento do diabetes. “Somos nós que conhecemos bem as medicações, podemos manejar bem as dosagens e auxiliar o paciente a ter melhores respostas”.

Tratamento deve ser multidisciplinar

Embora seja muito eficiente, o Ozempic não controla o diabetes sozinho. O tratamento da doença envolve o cuidado multidisciplinar para a manutenção de um estilo de vida saudável. “As recomendações gerais são uma alimentação balanceada, rica em fibras e com a quantidade adequada de proteínas. Se possível, é bom fazer o acompanhamento com um nutricionista. Também é importante estar com o corpo ativo e fazer exercícios físicos se não houver contraindicações”, orienta a endocrinologista.

 A Dra. Mariana Ferreira conclui destacando a importância do suporte psicológico para favorecer a continuidade do tratamento. “Essa prática auxilia o paciente a seguir melhor as recomendações. Sempre digo que para vivermos com saúde, é preciso cuidar das nossas emoções”.

Transtorno do Espectro Autista na fase adulta

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um transtorno neurodesenvolvimento. Isso quer dizer que os sintomas se manifestam cedo no desenvolvimento da pessoa, em geral antes de a criança ingressar na escola.

* Por Sabrina Gomes

O DIAGNÓSTICO DO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA NA FASE ADULTA

O que é o Transtorno do Espectro Autista?

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um transtorno neurodesenvolvimento. Isso quer dizer que os sintomas se manifestam cedo no desenvolvimento da pessoa, em geral antes de a criança ingressar na escola. De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5-TR), as características essenciais do TEA podem ser organizadas em dois grupos (Critérios A e B):

  • prejuízo persistente na comunicação social e na interação social e
  • padrões restritos e repetitivos de comportamentos, interesses ou atividades.

Esses sintomas precisam estar presentes desde o início da infância (Critério C) com frequência e intensidade que limitam e prejudicam o bom funcionamento da pessoa no seu cotidiano (Critério D). Além disso, deve-se investigar se essas alterações não são melhor explicadas por outra condição (Critério E).

O TEA pode se apresentar em diferentes níveis.

O TEA pode ser classificado em diferentes níveis. Esses níveis são avaliados considerando os prejuízos vivenciados pela pessoa na comunicação social e em padrões de comportamento rígido e restrito, sendo classificados em Nível 1 (exigindo apoio), Nível 2 (exigindo apoio substancial) e Nível 3 (exigindo muito apoio substancial).

Os casos em que os prejuízos podem ser classificados como de gravidade menor, considerando os três níveis existentes, normalmente são diagnosticados mais tardiamente. Algumas pessoas podem chegar à idade adulta sem o diagnóstico de TEA, ainda que tenha passado por dificuldades importantes nos processos de comunicação e interação social (por exemplo: uma pessoa que consegue se envolver na comunicação, embora apresente falhas na conversação com os outros e comumente não obtenha sucesso nas tentativas de fazer amizade). Essas pessoas também podem passar por dificuldades no processo de desenvolvimento de independência, uma vez que a inflexibilidade no comportamento causa interferência no funcionamento em um ou mais ambientes (por exemplo: dificuldade em trocar de atividades, problemas para organizar e planejar atividades).

TEA em adultos

Considerando as possibilidades de apresentação do TEA, o processo de diagnóstico do TEA Nível 1 (com menor necessidade de suporte) é o mais desafiador, especialmente quando realizado tardiamente. Isso porque a condição pode ser confundida com outros transtornos ou passar despercebida, já que muitos indivíduos com níveis menores de prejuízo podem apresentar boa capacidade de independência. Além disso, muitos adultos utilizam estratégias compensatórias para mascarar suas dificuldades em público. Entretanto, é importante destacar que essas pessoas podem carregar um sentimento frequente de inadequação ou podem se sentir esgotadas pelo esforço constante de se adequar socialmente. Assim, é comum que o TEA esteja associado a quadros depressivos e ansiosos (fobias específicas, ansiedade social e agorafobia são exemplos mais comuns).

Como sinais e sintomas do TEA se manifestam no cotidiano do adulto?

 Abaixo serão apresentados alguns sintomas e comportamentos comuns do TEA na fase adulta.

1) Prejuízos na comunicação e na interação social:

  • Dificuldade para comunicar seus sentimentos para as outras pessoas;
  • Evita situações de interação social, tende ao isolamento;
  • Dificuldade para iniciar e manter uma conversa;
  • Costuma falar com um tom de voz monótono (em outras palavras, com menor inflexão da voz do que a maioria das pessoas).
  • Pode parecer socialmente desajeitado (a), mesmo quando tenta ser cordial;
  • Tem dificuldade para acompanhar o fluxo de uma conversa;
  • Considera difícil compreender qual comportamento é esperado em determinada situação;
  • Pode parecer emocionalmente distante, com dificuldades para demonstrar seus sentimentos;
  • Dificuldade para perceber quando os outros estão tentando tirar vantagem;
  • Tem dificuldade em fazer amigos, mesmo dando o melhor de si;
  • Evita contato visual ou tem contato visual diferente;
  • Considera difícil compreender o que o outro está sentindo apenas olhando para o rosto da pessoa.

2) Padrões restritos e repetitivos de comportamento:

  • Tem mais dificuldades do que outras pessoas com mudança na sua rotina;
  • Não consegue tirar algo da mente quando começa a pensar sobre isso;
  • Tem uma variedade de interesses incomuns;
  • É considerado (a) uma pessoa metódica, que tende a fazer as coisas sempre do mesmo jeito;
  • Pensa ou fala sobre a mesma coisa repetidamente;
  • Pode se sentir sobrecarregado (a) na presença de muitos estímulos (por exemplo: barulho, luz, cheiro);
  • Tem comportamentos repetitivos e que podem ser considerados estranhos por outras pessoas (por exemplo: balançar as mãos, puxar a pele do canto das unhas, rasgar a ponta da camisa);
  • Apresenta interesses sensoriais que os outros acham diferentes (por exemplo: cheirar ou olhar para as coisas de um modo especial).

A presença desses comportamentos e sintomas (ou a maioria deles) é um sinal de alerta, mas não representa o diagnóstico de TEA. Para o diagnóstico de TEA, todos os critérios citados no início deste texto precisam ser preenchidos (Critérios A, B, C, D e E). Por isso, é necessária uma investigação cuidadosa, que normalmente é realizada por mais de um profissional.

Diante da dúvida, a busca por profissionais especializados é o caminho mais indicado. O psiquiatra e o neurologista (áreas da medicina) e o psicólogo especialista em avaliação neuropsicológica (neuropsicólogo) são exemplos de profissionais capacitados para esse tipo de avaliação.

Referências

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais – 5 ed., texto revisado. (DSM-5-TR). Porto Alegre: Artmed, 2023.

CONSTANTINO, J; GRUBER, P. C. SRS-2 – Escala de Responsividade Social. 2. ed. São Paulo: Hogrefe, 2020.