Dia do Psicólogo

Ser psicólogo me ensinou a acreditar no potencial que existe dentro de cada um de nós. O que implica em reconhecer com consciência, amor e coragem, que junto de nossos melhores ou piores momentos…

* Por Prof. Dr. Leonardo Martins

Ser psicólogo me ensinou a acreditar no potencial que existe dentro de cada um de nós. O que implica em reconhecer com consciência, amor e coragem, que junto de nossos melhores ou piores momentos, sempre temos um convite para seguirmos em direção à melhor versão de nós mesmos. A história de cada um, junto do contexto atual a que estamos submetidos, invariavelmente faz com que obstáculos em nosso caminho diminuam a clareza com que enxergarmos nossa própria potência. Ainda assim, mesmo diante deste véu que surge frente aos obstáculos que nos limitam, sempre será possível que a angústia resultante nos convide a desafiar o que parece sem solução – seja mudando por completo nossa direção, seja aceitando de forma compreensiva que alguns limites podem fazer parte de nossa história, sem que isso remova a possibilidade de seguirmos adiante.

Um guia que se mostra sempre à mão diante deste convite surge da imagem que cada que podemos construir ao pensarmos cuidadosamente sobre uma vida que possa valer à pena ser vivida. Do lugar em que nos encontramos, até os arredores deste lugar que desejamos chegar, uma série de possibilidades emergem, ainda que em meio a um sem fim de obstáculos e incertezas. Não é raro desejarmos uma linha reta, direta e sem interrupções que seguiria de onde estamos até onde queremos chegar. Apesar de ser válido desejarmos que nossas vidas sejam assim, poucas histórias seguem essa linearidade. Atalhos impensados, curvas, serras, descidas e subidas tornam-se muitas vezes as únicas opções disponíveis para seguirmos em frente. Não é raro ainda que voltar ao começo ou seguir na direção que parece contrária, possa ser na verdade nossa única forma de seguirmos mais adiante. Até mesmo esperar parado por um tempo, pode ser o mais sensato para nos recuperarmos e irmos adiante.

Com maior ou menor clareza, e a depender de como estão os dias, é bem assim que vejo uma parte da vida. Partimos de algum lugar que não conhecemos tão bem quanto gostaríamos, e seguimos para algum outro que por mais difícil que seja acreditarmos, estará sempre aberto em possibilidades. O caminho que fizemos é o que caminho que caminhamos; e guarda nossas dores e delícias, ambas em proporções particulares e nem sempre tão bem divididas quanto gostaríamos. Assim seguimos, carregando em nós um pouco destes lugares em que passamos. Ao seguir também guardamos sempre em potência a possibilidade dos lugares por onde ousaremos passar.

Dessa forma, conectando cada um destes lugares visitados e por visitar, vamos vendo a trajetória que escolhemos ou que nos foi imposta contingências que não prevíamos. Ao olhar onde estamos, vemos vestígios de onde passamos e o vislumbre da direção e sentido que podemos buscar. Não é raro que deste esforço consciente surjam uma multiplicidade de possibilidades, algumas mais reais do que as outras, mas todas compartilhando a essência que guarda cada destino possível. A cada caminho escolhido por mais beleza que possamos encontrar, temos que lidar sempre com o fato de termos renunciado a tantos outros. Não é raro que a nossa história e nosso contexto atual nos faça refletir sobre o assunto, colocando à mesa as possibilidades perdidas ou múltiplos das que podem ainda ser vividas. Raramente este exercício é por si só bem-sucedido, é o comum que o múltiplo do possível ou do deixado para traz possa nos fazer sentir sem rumo na estrada. Ao nos depararmos com esta sensação, é comum que fiquemos paralisados, que ignoremos a questão ou que sigamos por um caminho que não era de fato nosso. Como consequência, ao invés de resolvermos o que nos aflige, mais hora menos hora a ausência de sentido grita por meio do desânimo, da falta de motivação, ansiedade, compulsões e outras manifestações que se dão no corpo e na mente.

É difícil saber a razão ou o momento exato, mas como psicólogo invariavelmente meu caminho se cruza com alguém que está experimentando um desafio nesta caminhada que vai de onde estamos para onde queremos chegar. Cada qual, diante de sua história única, busca algo que é por princípio especial. Às vezes, uma intenção é encontrar uma direção mais clara, por vezes o objetivo é buscar uma direção menos óbvia. Por outros momentos é voltar pelo caminho já conhecido, mas talvez com um novo ritmo, passando pelas dificuldades que negligenciamos. Independente do motivo ou do desafio, acreditar no potencial de desenvolvimento inerente a cada um de nós me ensinou que de um ponto ao outro, seja da forma que for, sempre será possível buscarmos um sentido e um ritmo que nos leva pela a estrada de uma vida que possa valer a pena.

Por falar no assunto, uma vida que vale à pena ser vivida, por mais que seja planejada e que receba toda nossa atenção e esforço, invariavelmente apresentará barreiras, obstáculos, perdas ou mesmo paisagens que não gostaríamos de ter presenciado. Muitos destes desafios estão completamente fora de nosso controle, tal como fatalidades ou mesmo a pandemia que vivemos em 2020. A clareza em estarmos seguindo de forma coerente com nossos valores e com o que de fato nos importa, não elimina muitos destes obstáculos, mas pode fazer com que cada um destes desafios seja tomado diante do tamanho que possuem, mas sobretudo como parte de nossas histórias e não como pontos finais. Nesse sentido, descobrir nossa potência envolve por vezes aceitar tais condição e limites para seguirmos em frente. A sabedoria em aceitar o que não podemos mudar e o que está fora de nosso controle, não elimina a dor de uma perda ou seus prejuízos, mas nos liberta para seguirmos em frente ao invés de seguirmos paralisados tentando mover do caminho uma montanha que lá sempre esteve e que por lá sempre permanecerá. Despertar potência é reconhecer tal montanha e mover-se apesar dela. Aqui não se trata de um otimismo ingênuo, mas talvez exatamente o contrário disso. Trata-se de perdermos a esperança em resolver nossos destinos insistindo nas soluções ou caminhos que não nos tem ajudado, para então seguirmos em direção a uma nova alternativa.

No dia do psicólogo(a), meu depoimento atravessa o caminho deste texto, que por sua vez atravessa parte dos caminhos que percorro em meu exercício profissional ao lado de quem acompanho. Para terminar, reforço o convite cotidiano que Proust nos faz e que costumo refazer aos meus pacientes, clientes, supervisandos, alunos de mestrado e doutorado. O convite considera tudo que já escrevi acima, mas reconhece que o início da verdadeira viagem de descobrimento não precisa começar pela busca de caminhos ou paisagens ainda não vistos, mas sim por vermos a nós mesmos com novos olhos. A minha profissão pode ser descrita de diferentes maneiras e constituir-se de um sem fim de intervenções baseadas no melhor conhecimento disponível, mas confesso que quase sempre começo por esse convite e sigo por essa história.

Automedicação e seus riscos

A automedicação é uma prática caracterizada fundamentalmente pela iniciativa de uma pessoa, ou de seu responsável…

* Por Fernanda Rezende

A automedicação é uma prática caracterizada fundamentalmente pela iniciativa de uma pessoa, ou de seu responsável, em obter e utilizar um produto que acredita lhe trazer benefícios no tratamento de uma doença ou alívio de sintomas. Assim, a orientação médica é substituída inadvertidamente por sugestões de medicamentos provenientes de pessoas não autorizadas, entre estas, familiares, amigos ou balconistas em farmácias. Outra forma de automedicação seria a reutilização de receitas.

As razões pelas quais as pessoas se automedicam são inúmeras. A propaganda desenfreada e massiva de determinados medicamentos contrasta com as tímidas campanhas que tentam esclarecer os perigos da automedicação. A dificuldade e o custo de se conseguir uma opinião médica, a limitação do poder prescritivo, restrito a poucos profissionais de saúde, o desespero e a angústia desencadeados por sintomas ou pela possibilidade de adquirir uma doença; o acesso a algumas informações pela internet ou outros meios de comunicação, a falta de regulamentação e fiscalização daqueles que vendem e a falta de programas educativos sobre os efeitos muitas vezes irreparáveis da automedicação, são alguns dos motivos que levam as pessoas a utilizarem medicamentos mais próximos.

Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) mostram que, em todo o mundo, mais de 50% de todos os medicamentos receitados são dispensados ou vendidos de forma inadequada. Cerca de um terço da população mundial tem carência no acesso a remédios essenciais e metade dos pacientes tomam medicamentos de forma inadequada (1). No Brasil, a prevalência de automedicação na população adulta em alguns estudos de boa qualidade metodológica foi de 35% (2). Aproximadamente, um terço das hospitalizações no Brasil se devem ao uso incorreto de medicamentos (3).

Os riscos da automedicação para o indivíduo são o atraso no diagnóstico ou o diagnóstico incorreto, devido ao mascaramento dos sintomas, possibilitando o agravamento do problema, a escolha do medicamento inadequado, a administração incorreta, dosagem inadequada e uso excessivamente curto ou prolongado da medicação, a dependência, reações alérgicas e intoxicações. Além do impacto sobre a vida humana, as reações adversas a medicamentos também influenciam significativamente nos custos despendidos com saúde.

Em uma sociedade, os hábitos de consumo de medicamentos podem ser afetados positivamente pelas políticas nacionais quando promovem a regulamentação do suprimento e a disponibilização racional de medicamentos essenciais, pressupondo o acesso ao diagnóstico e prescrição por profissionais habilitados. Por outro lado, o consumo pode ser influenciado negativamente pelo acesso sem barreiras e pela promoção e publicidade de medicamentos, que muitas vezes estimulam a utilização desnecessária e irracional. Os governos precisam conhecer as razões e as formas de uso irracional de medicamentos, é necessário ter informações específicas para verificar a magnitude desse problema, identificar estratégias e monitorar o impacto das possíveis intervenções.

Não há como acabar com a automedicação, talvez pela própria condição humana de testar e arriscar decisões. Há, contudo, meios para minimizá-la. Programas de orientação para profissionais de saúde, balconistas e população em geral, além do estímulo a fiscalização apropriada, são fundamentais nessa situação.

Medicamentos Psicotrópicos

Os medicamentos psicotrópicos têm como principal objetivo o tratamento de pessoas em sofrimento psíquico, contudo, são prescritos e utilizados para as mais diversas situações. O uso exacerbado desses medicamentos é um fato na sociedade atual, gerando preocupação entre as autoridades de saúde, pois é sabido que a utilização prolongada dos psicofármacos, além de efeitos colaterais indesejáveis, alguns podem provocar dependência química e geram dificuldades quanto ao término do tratamento.

Segundo informações obtidas no Relatório do Departamento Internacional de Controle de Narcóticos, da Organização das Nações Unidas (ONU), apesar do grande número de pessoas em sofrimento psíquico, o uso de medicamentos controlados e específicos vem aumentando consideravelmente.

A sociedade atual apresenta características diferenciadas e estas trazem implicações variadas sobre os sujeitos. O ritmo de vida acelerado, as cobranças por produtividade, a necessidade de demostrar felicidade e bem-estar a todo custo, o imediatismo que permeia as relações, a rapidez de acesso às informações, o desenvolvimento científico; enfim, este conjunto de fatores pode levar os sujeitos à busca por soluções rápidas e práticas aos problemas decorrentes dessa realidade.

Por todo o exposto, concluímos que a automedicação é um grande risco para a nossa saúde! Assim sendo, devemos sempre buscar a orientação de profissionais habilitados para realizar o diagnóstico e propor o melhor tratamento. No caso da saúde mental, essas intervenções passam pelo uso de medicações, mas certamente deve incluir outras condutas, podendo-se citar a realização de atividade física e, sobretudo, o acompanhamento psicoterápico. Em relação aos psicotrópicos, o uso consciente e sob orientação correta trará benefícios, tais como a melhora na qualidade de vida, sem representar um dano para os pacientes.

Referências Bibliográficas

  1. Wannmacher L. Condutas baseadas em evidências sobre medicamentos utilizados em atenção primária à saúde. Uso racional de medicamentos. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2012. p. 9-14.
  2. Domingues MG et al. Prevalence of self-medication in the adult population of Brazil: a systematic review. Rev. Saúde Pública. 2015; 49:36.
  3. Aquino D. Por que o uso racional de medicamentos deve ser uma prioridade? Cienc Saúde Coletiva. 2008; 13 (suppl):733-6.

O que é avaliação neuropsicológica?

Saiba o que é uma avaliação neuropsicológica.

* Por Sabrina Gomes

Você já ouviu falar em Avaliação Neuropsicológica? Neste texto, vamos explicar o que é a Avalição Neuropsicológica, como é realizada e quando ela é indicada.

O QUE É AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA?

Primeiramente, é importante compreendermos que a neuropsicologia é um campo de conhecimento interessado em estudar a relação entre o funcionamento do cérebro e o comportamento humano. Ela se apoia, principalmente, em conhecimentos das neurociências e da psicologia, buscando contribuir para o tratamento de alterações cognitivas e comportamentais.

A Avaliação Neuropsicológica é um procedimento de investigação detalhado que tem como objetivo avaliar as funções cognitivas do indivíduo, tais como, atenção, memória, linguagem, entre outras. Além disso, o processo de avaliação também se concentra em aspectos sociais, emocionais e funcionais da pessoa.

A partir das informações colhidas, pode-se estabelecer o Perfil Neuropsicológico do paciente, identificando suas potencialidades e dificuldades. Estas informações são muito importantes para auxiliar no diagnóstico e no planejamento de um tratamento mais eficiente.

COMO É FEITA A AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA?

A Avaliação Neuropsicológica é solicitada quando há a necessidade de um diagnóstico clínico mais amplo. Nesses casos, a avaliação pode ser requerida por um psiquiatra ou neurologista, dependendo do caso, para auxiliar na identificação das causas de problemas enfrentados pela pessoa no cotidiano (por exemplo, desempenho acadêmico e/ou profissional abaixo do esperado, problemas ao fazer tarefas diárias habituais, déficit em habilidades sociais, entre outros).

Uma parte essencial da avaliação neuropsicológica é a administração de testes neuropsicológicos e questionários. Além disso, outros dois procedimentos são extremamente importantes: a observação e as entrevistas clínicas com diferentes informantes. A quantidade de sessões irá depender de cada pessoa e dos conteúdos avaliados. Ao final do processo, o (a) neuropsicólogo (a) emite um laudo neuropsicológico, que consiste em um documento com os resultados da avaliação. Este documento contém a síntese dos resultados encontrados, com recomendações pertinentes ao caso, visando promover o desenvolvimento do paciente e, consequentemente, melhorar sua qualidade de vida.

QUANDO É INDICADA?

A Avaliação Neuropsicológica é indicada, principalmente, quando há suspeita diagnóstica de transtornos psiquiátricos ou do neurodesenvolvimento. Por exemplo:

– Transtornos de Aprendizagem

– Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH)

– Demências

– Transtornos de Ansiedade

– Deficiência Intelectual

– Transtorno do Espectro Autista

Referência bibliográfica

Fuentes, D., Malloy-Diniz, L. F., de Camargo, C. H. P., & Cosenza, R. M. (2014). Neuropsicologia: Teoria e Prática. Artmed Editora.

Acompanhamento psicológico e cirurgia bariátrica

A obesidade é uma doença crônica e multifatorial que, atualmente, representa um grave problema de saúde pública, afeta todas as faixas etárias e está relacionada à redução na expectativa de vida, por causar diversos danos à saúde física e mental do indivíduo.

* Por Laís Pereira

Acompanhamento psicológico e cirurgia bariátrica

A obesidade é uma condição crônica e multifatorial que, atualmente, representa um grave problema de saúde pública, afeta todas as faixas etárias e está relacionada à redução na expectativa de vida, por causar diversos danos à saúde física e mental do indivíduo.

As pesquisas mostram que fatores psicológicos como estresse, ansiedade, depressão, transtorno da compulsão alimentar, alcoolismo, baixo repertório de habilidades sociais, baixa autoestima, entre outros, podem estar associados ao ganho excessivo de peso, interferem na adesão ao tratamento para emagrecimento, retroalimentam a obesidade e podem aparecer após a realização da cirurgia bariátrica. Além disso, a obesidade, em sua grande maioria, está associada a intenso sofrimento experimentado por conta de uma difícil relação com a alimentação e também por conta do preconceito social. Diante disso, podemos considerar que aspectos psicológicos e emocionais contribuem para o desenvolvimento e a manutenção da obesidade, interferem no tratamento e também podem ser consequências dessa condição na vida do indivíduo. Sendo assim, é fundamental e imprescindível que tais aspectos sejam considerados neste contexto e que psicólogos integrem as equipes multidisciplinares de tratamento da obesidade e do emagrecimento.

A cirurgia bariátrica é uma alternativa dentre os tipos de tratamento para obesidade, mas assim como todos os outros, não garante, por si só, a sua remissão completa. De acordo com a resolução 2131/2015 do Conselho Federal de Medicina, ela é indicada para pessoas com IMC >40 kg/m2 ou >35 kg/m2 e portadores de comorbidades que tenham passado por tratamento clínico prévio insatisfatório por, pelo menos, 2 anos e tenham acima de 18 anos. Além disso, é uma grande cirurgia que envolve riscos e a decisão por fazê-la deve ser muito consciente.

 

Papel do psicólogo na cirurgia bariátrica

O emagrecimento gerado pela cirurgia bariátrica engloba uma série de transformações que afetam as relações do indivíduo consigo e com os outros. Antes mesmo da realização do procedimento, é importante que o paciente tenha conhecimento de tais mudanças e vá para cirurgia sem nenhuma dúvida ou ambivalência.

Ao contrário do que muitos pensam, o psicólogo que realiza a avaliação para cirurgia bariátrica não tem o intuito de barrar o procedimento, mas sim de avaliar se o paciente está emocionalmente apto para a cirurgia, adequar as expectativas de um novo corpo elucidando as possibilidades reais e auxiliá-lo na compreensão de todos os aspectos envolvidos no pré e pós-operatório.

Fase pré-operatória

A fase pré-operatória vai possibilitar a compreensão dos aspectos psicológicos envolvidos na obesidade, aspectos que fazem parte da história de vida do paciente, que exercem uma função importante na sua vida e que, certamente, sofrerão grandes transformações com a cirurgia bariátrica. Por isso, é também uma fase de muitas orientações, autoconhecimento e esclarecimentos, oferecendo ao paciente um melhor nível de entendimento a respeito das mudanças que ocorrerão e se ele está de fato disposto a enfrentar. Caso seja identificada alguma distorção importante ou transtorno mental desajustado, é possível tratar e dar seguimento no processo da cirurgia bariátrica. Com a avaliação e o acompanhamento psicológico na fase pré-operatória bem conduzidos, é possível diminuir o desenvolvimento de transtornos mentais e sofrimento psíquico, bem como o agravamento daquele já existente antes da cirurgia.

Fase pós operatória

A fase pós-operatória é caracterizada pela vivência de todas as transformações imaginadas e orientadas, nesse momento o acompanhamento psicológico auxilia, principalmente, na adaptação. Adaptação aos novos hábitos alimentares e de atividade física, a perda de peso rápida e as mudanças corporais, as novas sensações experimentadas e também a ausência delas, entre outras adaptações, afinal é uma nova vida, uma vida fora da zona de conforto experimentada por ele nos últimos anos e até mesmo décadas. Também pode ocorrer a vivência do sentimento de arrependimento, especialmente nos primeiros dias pós-cirúrgicos que são bastante rigorosos e, portanto, o psicólogo poderá ajudá-lo no enfrentamento desses momentos iniciais. Além disso, mudanças sociais e nos relacionamentos acontecem devido ao aumento da autoestima e das mudanças de comportamento. Com o passar do tempo, o reganho de peso torna-se uma realidade e muitas vezes isso pode trazer angústias ao bariatricado, porém, através do acompanhamento multidisciplinar, é possível superar as dificuldades e manter o reganho dentro do esperado.

Acima de qualquer aspecto específico, o acompanhamento psicológico na cirurgia bariátrica visa trazer consciência e bem-estar ao paciente, ajudando-o a fazer as melhores escolhas para a sua vida.

Leia aqui sobre cirurgia bariátrica e o abuso de álcool.

Referências:

Chaves, L. & Navarro, A. C. (2011). Compulsão Alimentar, Obesidade e Emagrecimento. Revista Brasileira de Obesidade, Nutrição e Emagrecimento, 5(27), 110-120.

Conselho Federal de Medicina (2015). Altera o anexo da Resolução CFM nº   1.942/10. Resolução n°2131, de 12 de novembro de 2015. Brasília.

Vasques, F., Martins, F. C. & Azevedo, A. P. (2004). Aspectos psiquiátricos do tratamento da obesidade. Revista de Psiquiatria Clínica, 31(4), 195-198.

Terapia Cognitivo-Comportamental baseada nos princípios ACT

Texto pelo Dr. Leonardo Martins, psicólogo da Clínica Rezende.

* Por Dr. Leonardo Martins

Terapia Cognitivo-Comportamental baseada nos princípios da Acceptance and Commitment Therapy (ACT).  

O que é a ACT

A ACT é uma abordagem que surgiu na década de 90. Apesar de recente, conta hoje com estudos científicos que demostram sua efetividade, sendo opção de primeira escolha para o tratamento de diversos transtornos mentais graves, incluindo aqueles relacionados com ansiedade, depressão, esquizofrenia e transtorno por uso de substâncias.

Além destes, estudos também apontam que esta abordagem é efetiva para ajudar pessoas que tiverem prejuízos em sua qualidade de vida fruto da limitação imposta por doenças crônicas, incluindo até mesmo o manejo da dor crônica.

Outros quadros

Diversos outros quadros também podem trabalhados através desta abordagem, tal como estresse no trabalho, ansiedade social, procrastinação, dentre outros eventos associados com desconforto e prejuízos em diversas ordens.

Seguindo uma vertente positiva, a ACT também tem evidências de que pode auxiliar pessoas que não possuem problemas ou transtornos mentais. Estudos demostram que a ACT pode ser útil no desenvolvimento de potencialidades, contribuindo para promoção do bem-estar e qualidade de vida, aprendizagem de novas habilidades, maior flexibilidade diante de desafios, além da busca por uma vida com mais sentido.

O acrônimo ACT significa ação em inglês, pois nosso trabalho é voltado para que nossos pacientes e clientes possam agir em consonância com seus valores, seguindo em direção ao que mais lhes importa.

Nossa busca pode ser resumida em fornecer os meios para que possamos “viver uma vida que possa valer a pena ser vivida”, mudando o que pode ser mudado e aprendendo a aceitar o que não controlamos, para seguirmos em frente.

Diversas emoções, sentimentos, pensamentos ou mesmos hábitos podem representar barreiras para que nossa ação não vá na direção do que importa. Na ACT aprendemos a identificar essas barreiras e a lidarmos de uma nova maneira com elas, buscando em seguida o compromisso com mudanças que sejam importantes de serem feitas.

O corpo tem alguém como recheio

O aspecto relacional da alimentação e a vinculação intrínseca entre a imagem corporal e a constituição do sujeito.

* Por Vívian Hauck

O corpo tem alguém como recheio

Ao longo do mês de Junho, mês da conscientização dos Transtornos Alimentares, a Clínica Rezende se dedicou à produção de conteúdos acerca destes transtornos, visando proporcionar informações confiáveis e também sensibilizar sobre estes quadros clínicos e suas possibilidades de tratamento e suporte. Finalizando esta série de conteúdos, proponho neste texto uma breve reflexão acerca de dois aspectos que permeiam os Transtornos Alimentares: o aspecto relacional da alimentação e a vinculação intrínseca entre a imagem corporal e a constituição do sujeito.

O aspecto relacional da alimentação

“Você tem sede de quê?
Você tem fome de quê?”¹

Não é necessário ser um(a) grande pesquisador(a) para observar, cotidianamente, que o comportamento alimentar é permeado por implicações subjetivas. Um dia de grande alegria, um momento de tristeza, uma mudança brusca de vida, a ansiedade, a paixão, o término de um relacionamento: come-se mais, come-se menos, come-se muito mais, come-se muito menos. A alimentação tem vinculação estreita com a nossa relação com a vida, com o outro e com as vivências emocionais do dia-a-dia.  Não à toa, se nos lembrarmos de que é através da alimentação que vivenciamos nossas primeiras experiências de satisfação na vida, ainda quando bebês.

Neste sentido, a psicanalista Maria Helena Fernandes indica que “se pode constatar que o comportamento alimentar, originário e essencial desde o nascimento remete o sujeito à complexidade da sua relação com o próprio corpo, marca indelével dos efeitos da alteridade.”² Faz-se importante, então, para um maior entendimento dos fenômenos relacionados aos Transtornos Alimentares, a tentativa de compreender como a relação do sujeito com o seu próprio corpo e, consequentemente, com os outros que o cercam vai interferir no comportamento alimentar.

Imagem corporal e constituição do Eu

“O corpo tem alguém como recheio”³

Como pontuado acima, o comportamento alimentar remete o sujeito à sua relação com o próprio corpo. Assim, é comum que nos Transtornos Alimentares esteja presente um temor em ganhar peso, bem como uma distorção na percepção da imagem corporal do sujeito.  Por volta dos anos 30, Paul Schilder (psiquiatra, psicanalista e pesquisador) definiu “imagem corporal” como “a figura que se forma para o sujeito, no interior de seu aparelho psíquico, do tamanho e da forma de seu próprio corpo e os sentimentos suscitados a partir da픲. Maria Helena Fernandes refere também à ampliação da noção de imagem corporal conferida por Françoise Dolto, ao final dos anos 50, quando afirma que “a imagem inconsciente do corpo vai se moldando ao longo do tempo […] como uma espécie de elaboração de sensações e emoções precoces experimentadas na relação intersubjetiva com as figuras parentais, um verdadeiro substrato relacional que passa pelo corpo, lugar da comunicação precoce.”² Quando fala de “um verdadeiro substrato relacional que passa pelo corpo”, há que se lembrar como, para a Psicanálise, a constituição do Eu está intimamente vinculada ao corpo de um sujeito, no sentido de que o Eu só pode se constituir a partir de estímulos internos e externos que, necessariamente, passam pelo corpo.

A inscrição no corpo daquilo que (ainda) não encontra palavra

A partir do exposto, pode-se considerar que as dificuldades de um sujeito que vivencia um Transtorno Alimentar não necessariamente passam pela materialidade concreta do alimento, mas talvez pelas representações e dimensões psíquicas que o envolvem. Pensando nisso, fico com uma citação de Rubens Volich (2002), por Maria Helena Fernandes:

“Muitas vezes, diante do sofrimento e da perda, entre o vazio e a palavra, o corpo se vê convocado (…) Inscrevem-se ali os prazeres, os encontros felizes e gratificantes, mas também as dores, as perdas, as separações, mais difíceis de serem compartilhadas. Entre o real e o imaginário, inclina-se muitas vezes o corpo à exigência de conter o sofrimento indizível, de suportar a dor impossível de ser representada.”

Por fim, questiono:

Seria mesmo possível, como vendem a cultura e as redes sociais, constituir um corpo – e, consequentemente, uma psique – ideal, invulnerável, isento de dor, falhas e faltas?

 

Referências:

¹ Trecho da música “Comida”, da banda Titãs, da qual aproveito para destacar também o seguinte trecho: “A gente não quer só comer / A gente quer comer e quer fazer amor / A gente não quer só comer / A gente quer prazer pra aliviar a dor”.

² Trecho do livro “Transtornos Alimentares: anorexia e bulimia” (2006), de autoria da psicanalista Maria Helena Fernandes. Este, inclusive, foi o principal livro utilizado para a elaboração deste texto.

³ Trecho de “Momento nº8”, de Arnaldo Antunes: “O corpo existe e pode ser pego. / É suficientemente opaco para que se possa vê-lo. / Se ficar olhando anos você pode ver crescer o cabelo. / O corpo existe porque foi feito. / Por isso tem um buraco no meio. / O corpo existe, dado que exala cheiro. / E em cada extremidade existe um dedo. / O corpo se cortado espirra um líquido vermelho. / O corpo tem alguém como recheio.”

Relato de Anorexia Nervosa

Paciente J, sexo feminino, 40 anos.

Relato de Anorexia Nervosa da paciente J, sexo feminino, 40 anos.

Hoje com 40, desde os 14 convivo com um transtorno alimentar. Nos seis últimos anos, o meu quadro, que já foi bastante agudo, se estabilizou. Trata-se de um exercício diário de amor próprio e do entendimento de que aquilo que me norteou por toda adolescência e parte da juventude estava equivocado.

Não é fácil, mas tampouco é impossível. Foram idas e vindas, muitas pessoas envolvidas, o cotidiano da minha família, que sempre esteve ao meu lado, afetado. Estar no limite crítico não bastou para que eu tomasse consciência da gravidade do quadro. Isso só aconteceu após uma junção de eventos, dentre os quais uma internação por três meses numa enfermaria de comportamento alimentar em um hospital psiquiátrico. Este fato pontual foi meu primeiro passo rumo à redenção. Soma-se à ele a sorte de ter encontrado pela primeira vez, após diversos tratamentos, uma equipe competente para me resgatar.

A presença incondicional daqueles que me amam também compõe esta equação. Acredito que a cada dia dou um novo passo e a evolução se faz presente em pequenos momentos que comprovam que existe uma vida além das obsessões, regras e tabus impostos pela anorexia. Se eu pudesse voltar no tempo, certamente diria àquela garota de 14 anos para buscar um propósito que a libertasse deste fardo.

Existe por aí um mundo cheio de cores e possibilidades e reduzi-lo a um ideal estético é penoso demais. A batalha ainda é diária, mas me sinto fortalecida, capaz de lidar com assédio de pensamentos doentes que invariavelmente virão. Sigo a minha jornada e hoje, mais do que nunca, acredito que o pior ficou para trás.

Saúde Mental no contexto interdisciplinar

Texto pelo psiquiatra Dr. Fabrício de Oliveira.

* Por Dr. Fabrício de Oliveira

Saúde Mental no contexto interdisciplinar

Falar que os transtornos mentais são patologias muito freqüentes não é novidade. Várias projeções do aumento do número desses casos já são discutidos amplamente, havendo aqueles que defendam que a pandemia de doenças mentais será maior e mais duradoura do que a própria pandemia causado pelo novo corona vírus. Dentro deste contexto o valor do trabalho interdisciplinar nunca esteve tão evidente.

Por conta da Reforma Psiquiátrica potencializada pelo atual contexto global, ocorre gradualmente uma profunda transformação no eixo do tratamento das doenças mentais.

Os psiquiatras, até então, intensamente isolados em suas práticas passaram a se integrar com outros profissionais da saúde. Um argumento simples para sustentar tal mudança é o inequívoco fato que as informações colhidas com um profissional que tenha maior contato com o paciente pode mudar toda uma forma de perceber a situação e possibilitar enxergar integralmente o paciente.  A comunicação com outros profissionais (por exemplo, enfermeiros, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, psicólogos entre outros) é importantíssima e desloca a centralização do cuidado da doença para o processo de adoecer e para a pessoa doente.

PLANEJAMENTO DE TRATAMENTO

O modelo de interconsulta psiquiátrica na qual o profissional atua de forma mais episódica e mais reducionista está perdendo espaço. Além disso, desse profissional é exigido não só a capacidade de dialogar com a equipe de saúde, mas também é necessário saber de forma mais consistente o que o sistema de saúde e a equipe podem oferecer para elaboração de um planejamento de tratamento. Não podemos nos esquecer da realidade de cada local e de cada indivíduo, sempre de forma empática.  As limitações do nosso sistema de saúde batem às portas de todos.

Citarei alguns serviços essenciais oferecidos por alguns profissionais a seguir. A psicologia da saúde pode promover a saúde no três níveis de intervenção (primário, secundário e terciário). As intervenções podem ser voltadas ao paciente em si, bem como no manejo da equipe com relação à pessoa que está recebendo o tratamento.

O TRABALHO INTERDISCIPLINAR

Através da atuação do psicólogo o plano terapêutico de outras áreas poderá ser colocado em prática. Esse profissional pode promover “a tradução” e compreensão dos procedimentos aplicados. Já a atuação do serviço social possui seus desafios próprios. Não é raro encontrar quem, ainda hoje, associe a profissão à ajuda ou caridade.

De forma bem simplificada, o serviço social é a profissão que lida com pessoas, em especial, com as dificuldades por elas apresentadas em relação à vida e à sobrevivência. Realiza a mediação com outros profissionais, serviços e equipamentos sociais e diferentes políticas públicas. Sabe-se que muitos quadros de saúde mental são intensificados por conta de condições sociais. Dessa forma, seu trabalho é imprescindível.

O enfermeiro é o profissional que mais tempo permanece com o paciente e a família, sendo o agente principal para estabelecer limites e orientá-los com relação aos seus direitos e responsabilidade relativas ao tratamento. Os terapeutas ocupacionais podem atuar em diversos níveis do tratamento (prevenção, tratamento, reabilitação, promoção de saúde e inclusão social). Com um acompanhamento adequado, poderá avaliar e/ou melhorar as atividades funcionais dos pacientes como as atividades básicas de vida diária (ABVD) e as atividades instrumentais da vida diária (AIVD).

Relato de Bulimia Nervosa

Primeiro relato de uma paciente com Bulimia Nervosa para a campanha do Mês de Conscientização dos Transtornos Alimentares da Clínica Rezende.

Relato de Bulimia Nervosa, Paciente D, do sexo feminino, 24 anos.

Desde os meus 12 anos minha busca por endocrinologistas, nutrólgos e nutricionistas sempre foi com o objetivo de emagrecer. Usei medicamentos com tal objetivo desde essa idade e sempre a partir do “incentivo” e de receitas desses profissionais. Nenhum deles nunca me questionou sobre práticas relacionadas a transtorno alimentar. Eu sabia que minha relação com minha alimentação e com o meu corpo não era saudável, mas achava que era esse o processo que eu deveria me submeter para alcançar o corpo sonhado.

ALIMENTAÇÃO DE FORMA CONSCIENTE

Busquei ajuda da nutrição consciente com a Lili primeiramente em 2018, mas porque enfrentava mais uma das minhas oscilações de peso e queria emagrecer. Na consulta, pela primeira vez me foi questionado se eu já tive algum transtorno alimentar. Eu respondi que não, mas descrevi todas as minhas práticas (e que, sim, caracterizavam um transtorno alimentar). Abandonei o tratamento por questões pessoais e só retornei no início de 2020, após ter passado por um semestre esgotante em 2019, no qual eu tive várias sequências de compulsão e purgação em um espaço de tempo muito curto. O estalo de verdade veio quando me vi, literalmente, devorando alimentos em quantidades absurdas e que não faziam sentido pra mim. Na maioria das vezes nem era porque eu gostava, mas sim por ser o que estava disponível.

NUTRIÇÃO HUMANIZADA

A princípio me deparei com um método de tratamento assustador, rs. Nada era proibido, mas tudo era equilibrado. Para quem lida com esses transtornos o medo do descontrole é gigantesco, então, perceber que eu sou capaz comer o que eu gosto de forma consciente foi um grande incentivo para persistir no tratamento. O apoio profissional e as etapas do processo que incluíam a observação de emoções e a consequência disso na minha alimentação também foram motivadoras.

Se hoje eu pudesse compartilhar algo para quem também passa por isso, eu diria que realmente é muito difícil aceitar que precisamos de ajuda e, apesar de acharmos que somos capazes de lidar com isso sozinhos, não somos, pois a gente acha que “é só dessa vez”, “é por pouco tempo essa dieta hipocalórica e sem nutrientes”, “só até perder 5kg”, “só esse jejum”, “só 1 mês de remédio” e não é! O ciclo se reinicia. Certos comportamentos só descobrimos que são transtornos com o tempo e a partir de um profissional, mas a maioria deles nós sabemos quais são e ao primeiro sinal deles é importante buscar ajuda.

Meu conselho é encontrar um profissional humanizado e que, de preferência, trabalhe com alimentação consciente que seja capaz de resinificar a relação com a alimentação e com o próprio corpo. Além disso, é muito importante confiar no processo e ser paciente com seu corpo e com o seu tempo. É comum recaídas nos comportamentos e que ocorram variações de peso, mas ao persistir no tratamento tudo se equilibra, juro!

DESAFIOS

Foram muitos desafios, rs, mas o que eu gostaria de registrar é o de aceitar que posso acreditar no meu corpo quando ele diz que está com fome, satisfeito ou com vontade de comer chocolate. Ceder as vontades não altera repentinamente meu peso ou minha forma. Parece besteira, mas depois de tanto tempo moldada a dietas rígidas, a comer de 3 em 3 horas, a enganar a vontade de doce com fruta rsrs e a contar calorias é difícil confiar no instinto.

Outra questão marcante pra mim foi o próprio fato de buscar ajuda. No começo desse ano eu estava extremamente insatisfeita com o meu corpo e pronta para encarar novamente os remédios pra emagrecer e todo o ciclo que recomeça a partir disso. Lembro de ter entrado no consultório da Lili e uma das primeiras coisas que eu disse foi “estou aqui num ato de sanidade e consciência muito doido e na verdade eu queria uma fórmula rápida kkkkk mas estou aqui”. Ter paciência e confiar no tratamento foi desafiador, de verdade.

Dessa vez eu busquei ajuda com o objetivo maior de estar mais consciente sobre minha alimentação e melhorar minha relação com o meu corpo, pois sabia que tinham coisas muito erradas.

Considero todo o processo uma vitória. Ter sido honesta sobre recaídas, ter realizado a proposta até o final, ter criado uma rotina de atividade física que eu goste, para mim, já foram questões grandiosas.

Além disso, considero um sucesso a forma como encaro minha relação com a comida hoje e também a resposta do meu corpo. De pouco a pouco tenho emagrecido aproximadamente 1 kg por mês como uma consequência de todo o processo, mas não como o foco central da minha vida e da minha alimentação.

O papel da nutrição nos Transtornos Alimentares

Quando falamos sobre o papel da nutrição nos transtornos alimentares, precisamos primeiro pensar sobre os principais gatilhos que levam uma pessoas desenvolver esse tipo de transtorno.

*Por Anelisa Rezende

O papel da nutrição nos Transtornos Alimentares

Quando falamos sobre o papel da nutrição nos transtornos alimentares, precisamos primeiro pensar sobre os principais gatilhos que levam uma pessoas desenvolver esse tipo de transtorno.

Sabemos que “nem toda dieta resulta em transtorno alimentar, mas quase todo transtorno alimentar começa com uma dieta.”(1)  Isso porque a “a alimentação é o principal fator ambiental na modulação da expressão gênica.”(2)

O PAPEL DAS NUTRICIONISTAS

Sendo assim, nós precisamos entender que nós nutricionistas podemos ser responsáveis pelo surgimento de um transtorno alimentar dependendo do tipo de alimentação que sugerimos aos pacientes, pois não saberemos quem tem ou não genética para tal. Por isso, é muito importante entender que dietas restritivas, julgamentos sobre corpos e escolhas alimentares, pressões sobre resultados devem ser substituídos por mais acolhimento, incentivo à autoaceitação, autocuidado de maneira gentil, autoconhecimento e consciência! Atitudes como essa podem prevenir e auxiliar no tratamento, que deve ser multidisciplinar, de transtornos alimentares. Isso ocorre porque o acompanhando passa a contar com a verdade, algo muito raro em consultas nutricionais, ainda mais quando há algum tipo de Transtorno Alimentar envolvido!

Muitas vezes as pessoas têm vergonha de contar sobre episódios compulsivos e ou purgativos, sobre as horas que ficou sem se alimentar, sobre o que comeu, etc! Por isso, quando saímos do papel de julgadores e assumimos o papel de acolhimento, a verdade surge e os resultados começam a aparecer, como a diminuição de restrições alimentares (seja em relação a grupos alimentares ou a quantidades ingeridas), a diminuição de episódios compulsivos e/ou purgativos, a diminuição da frequência de pesagens em casa, o reequilibro de excessos de atividades físicas, diminuição de horas em jejum, etc.

É importante dizer que o processo é no tempo de cada pessoa, pois tudo irá depender da história e contexto que cada uma está inserida. Então paciência e amor no processo são fundamentais para que haja envolvimento e tranquilidade nessa construção.

Referências bibliográficas:

1. Hilbert A, Pike KM, Goldshmidt AB et al. Risk factors across the Eating Disorders. Psychiatry Res. 2014 Dec 15; 220 (1-2): 500-6.
2. Ordovas JM & Corella D. Nutritional genomics. Annu Rev Genomic Hum Genet. 2004; 5:71-118.