Fevereiro Roxo: Se não houver cura, que no mínimo haja conforto

A campanha do Mês Roxo visa a conscientização e o melhor entendimento das doenças: Alzheimer, Lúpus e Fibromialgia…

* Por Dra. Natalia Salgado

Você já ouviu falar em Fevereiro Roxo?

A campanha do Fevereiro Roxo visa a conscientização e o melhor entendimento das doenças: Alzheimer, Lúpus e Fibromialgia. Doenças que tem em comum o seu caráter crônico devido a falta de cura, mas que não significa a falta de controle dessas patologias. Tem como lema “SE NÃO HOUVER CURA, QUE NO MÍMINO HAJA CONFORTO”.

Como Psicogeriatra vou focar especificamente na Doença de Alzheimer, trazendo algumas informações sobre essa patologia.

ALZHEIMER

A Doença de Alzheimer é o tipo de demência mais comum entre as demências. O principal fator de risco para o seu aparecimento é a idade. Assim, quanto maior a idade maior a chance de termos essa demência. Não é novidade que o mundo, e o Brasil, passa por um processo importante de envelhecimento populacional, assim a incidência e prevalência dessa demência cresce de forma importante. Outros fatores de risco também estão relacionados com o aparecimento dessa condição como : baixa escolaridade, diabetes, hipertensão arterial, tabagismo, obesidade, depressão , histórico familiar de Alzheimer, perda auditiva e visual entre outros.

A demência devido a Doença de Alzheimer tem início lento, mas evolui de de forma gradual, progressiva ao longo do tempo, com média variável de 8 anos de sobrevida após o seu  diagnostico. É uma doença neurodegenerativa, em que regiões cerebrais específicas se atrofiam devido processos complexos de depósito e acúmulo  de proteínas  anômalas.

A maioria das pessoas diagnosticadas com Demência de Alzheimer têm 65 anos ou mais , mas algumas podem ter a apresentação pré-senil (antes de 65 anos).

Essa demência  se apresenta com prejuízos cognitivos , comportamentais e funcionais a seu portador , e com impacto físico e mental importante aos seus cuidadores – familiares e a toda a sociedade.

A apresentação clássica, e mais comum,  dessa demência é o comprometimento da memória e da aprendizagem , que se manifestam de várias formas e gravidade ao longo da progressão da doença. Em quadros iniciais o seu portador pode ter dificuldades em recordar acontecimentos recentes, dificuldades para lembrar de datas, compromissos, e de esse recordar de atividades de sua rotina como pagamento de contas e uso de medicações. Podendo evoluir para dificuldades de reconhecer familiares, reconhecer sua casa, apresentar desorientação espacial,  comprometimento na linguagem, na resolução de problemas e na tomadas de decisão, entre tantos outros declínios cognitivos.

A doença pode apresentar  também alterações comportamentais como irritabilidade, agitação psicomotora, depressão, distúrbios do sono, e agressividade. Trazendo desgaste a todos que diretamente estão em contato com esse doente.

Não existe tratamento que visa a cura da doença de Alzheimer. Hoje utilizamos medicamentos que têm como objetivo melhorar a qualidade de vida do paciente , proporcionado controle de sintomas cognitivos e comportamentais, que consequentemente melhoram a funcionalidade para a realização de atividades diárias de vida, trazendo uma maior autonomia ao seu portador e menor sobrecarga aos cuidadores- familiares.

Aliado ao tratamento medicamentoso, existem várias técnicas de abordagens comportamentais adotas pelos cuidadores- familiares para  o melhor manejo das alterações comportamentais advindas dessa enfermidade . Associação Brasileira de Alzheimer ) , estou a disposição para maiores informações.

O diagnóstico muitas vezes não é simples  de ser feito, principalmente nas fases leves da doença, pois outros  transtornos psiquiátricos podem cursar com alterações cognitivas (mais especificamente na memória) como a depressão por exemplo. A busca pelo diagnóstico deve ser feita por profissionais habilitados por meio da avaliação médica criteriosa, avaliações cognitivas  feitas  por neuropsicológos e exames como os de Neuroimagem. Existem outros métodos diagnósticos mais complexos (uso de biomarcadores)  e caros , muitas vezes são utilizados em centro de pesquisas como nas Universidades.

A importância de um diagnóstico precoce da Doença de Alzheimer envolve criar estratégias  (medicamentosa e comportamental ) de cuidado e o entendimento de todos os indivíduos diretamente envolvidos nessa patologia, com objetivo de lidar com essa doença de forma mais segura e clara, apesar de sua vasta complexidade e inestimáveis impactos social, funcional e emocional.

Existem associações formadas por profissionais de saúde , pacientes,  cuidadores – familiares com o objetivo de trocas de informações e de experiências por meio de grupos de apoio e de psicoeducação , proporcionando uma melhor compressão da dinâmica dessa doença e um espaço de acalento também . Aqui em Juiz de Fora , contamos com uma regional mineira da  ABRAz ( Associação Brasileira de Alzheimer ) , estou a disposição para maiores informações.

Transtorno do pânico

O que você precisa saber sobre Transtorno do Pânico.

* Por Dr. Alexandre de Rezende

O que é transtorno do pânico?

O Transtorno do Pânico se caracteriza pela ocorrência de sintomas intensos de ansiedade (ataques ou crises de pânico), que geram bastante medo e desconforto, e podem acontecer de repente, em qualquer local ou situação.

Características do DSM-5*

O Transtorno do Pânico se refere à ocorrência de ataques de pânico inesperados e recorrentes, definidos como um surto abrupto de medo ou desconforto intensos que alcança um pico em minutos e durante o qual ocorrem sintomas físicos e mentais associados à ansiedade e medo.

Sintomas físicos:

Palpitações, sudorese, tremores, sensação de falta de ar, desconforto torácico, náuseas, sensação de tonteira ou desmaio, calafrios ou ondas de calor, sensação de formigamento.

Sintomas mentais:

Sensação de morte iminente, medo de sofrer um ataque cardíaco, de perder o controle ou enlouquecer.

Pelo menos um dos ataques foi seguido de um mês (ou mais) de uma ou ambas as seguintes características:

  1. preocupação persistente sobre a possibilidade de ter novos ataques ou sobre suas consequências;
  2. mudanças comportamentais significativas.

Após o início, os sintomas atingem um pico em até 10 minutos e tem duração autolimitada, geralmente menos de uma hora, muitas vezes alguns minutos.

Por conta de todo esse desconforto, a pessoa começa a evitar alguns lugares e situações, por medo de ter novas crises de pânico. A principal informação para quem teve uma crise de pânico é a certificação de que, apesar de muito desagradáveis desconfortáveis, as crises não são tão perigosas como a pessoa chega a imaginar.

As manifestações de um ataque de pânico fazem parte da ativação de um sistema de defesa do organismo para lidar com situações de risco, serve para nos alertar e proteger, ou seja, tem uma função que preza pela nossa sobrevivência. No Transtorno do Pânico esse sistema parece estar “desregulado”, sendo ativado sem uma real necessidade, como se fosse um “alarme falso”.

O tratamento do Transtorno do Pânico se baseia no uso de medicações e em abordagens psicoterápicas. O objetivo do tratamento não é apenas suprimir as crises de pânico, mas também reduzir as evitações fóbicas, a ansiedade antecipatória e a hipervigilância em relação aos sintomas corporais de ansiedade.

Como os pensamentos influenciam no Transtorno do Pânico?

Diante de um evento da nossa vida, a maneira como avaliamos essa situação influencia diretamente na forma como sentimos, nos comportamos e como nosso corpo reage por meio de reações fisiológicas.         No entanto, se por algum motivo fazemos uma interpretação não adequada das situações, ou até de nossas sensações, teremos reações emocionais, comportamentais e fisiológicas coerentes com essa avaliação errônea, ou seja, sofremos sem ter uma real necessidade.

No Transtorno do Pânico há uma tendência de direcionar a atenção para as sensações, e os pensamentos que se costuma ter sobre as sensações geralmente são catastróficas, antecipando os piores desfechos possíveis, tais como “estou morrendo”, “não vou aguentar”. Essas interpretações sobre perigo aumentam ainda mais a ansiedade, gerando um ciclo de pensamentos negativos, embora as situações temidas nunca se concretizem.

Como o problema pode estar sendo mantido?

A experiência de ansiedade intensa e as ideias de morte, loucura ou perda de controle de uma crise de pânico geram grande desconforto. Assim, a repetição das crises gera uma ansiedade antecipatória e medo das consequências de novas ocorrências, o que pode levar a diversas evitações (como não sair de casa). No entanto, esse comportamento traz um conforto apenas imediato, mas isso reforça ainda mais o transtorno, pois você aprende que se livrar das situações é a maneira com que pode se pode lidar com as sensações, além de se sentir cada vez mais incapaz de enfrentar o problema.

Um outro fator que também contribui para a manutenção do quadro é a forma como se interpreta as sensações corporais. Se a interpretação for de perigo, o corpo irá reagir provocando as manifestações de ansiedade como mecanismo de proteção, e aí uma crise de pânico pode acontecer.

Não aceitar ou entender que as sensações podem acontecer é o que faz com que você tente evitar qualquer ocorrência de ansiedade. Mas viver sem ansiedade é impossível, pois ela faz parte das características dos seres humanos.

Como lidar com o Transtorno do Pânico?

Durante o tratamento com base cognitivo-comportamental, você aprenderá algumas estratégias de como lidar com o Transtorno do Pânico:

 

  • Aceitação da ansiedade: deve-se aceitar as próprias sensações, não tentando afastá-las. Ao resistir, haverá uma tendência de prolongar ainda mais o desconforto.
  • Manejo dos sintomas: deve-se aprender estratégias para lidar com os sintomas, ou seja, treinar seu corpo para tentar diminuir a ativação provocada pela ansiedade. Por exemplo, utilizando técnicas de respiração.
  • Questionar pensamentos: deve-se relativizar a maneira como você pensa acerca das sensações, questionando a validade dos seus pensamentos, buscando se basear em evidências. Você já parou para se perguntar se tudo o que você teme realmente acontece?
  • Enfrentamento: deve-se desenvolver estratégias para lhe ajudar a enfrentar as situações que costuma evitar, de forma gradual e no seu tempo. Vai descobrir que o enfrentamento é o que realmente diminui o seu medo e não a evitação.

Muitas pessoas acreditam que nunca mais conseguirão ficar bem dos sintomas do Transtorno do Pânico. De fato, é muito difícil vivenciar sensações e medos tão desconfortáveis, mas o tratamento ocorre de forma gradual, de acordo com os limites que você determinar e, aos poucos, você ganhará mais autoconfiança para permanecer em constante melhora, sentindo-se cada vez mais capaz.

Sugestão de leitura: Vencendo o pânico – Manual do cliente. Autores: Bernard Rangé e Angélica Borba. Editora Cognitiva, 2019.

* DSM-5 (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders): Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais – 5ª edição, publicado em 2013, é um manual elaborado pela Associação Americana de Psiquiatria para auxiliar no diagnóstico dos transtornos mentais.

Referência bibliográfica:

Este texto foi baseado na seguinte referência:

CARVALHO, M.R.; DIAS, T.R.S. Capítulo 1 – Transtorno de pânico. In: CARVALHO, M.R.; MALAGRIS, L.E.N.; RANGÉ, B.P. Psicoeducação em Terapia Cognitivo-Comportamental. – Novo Hamburgo: Sinopsys, 2019.

Você sabe o que é Psicoeducação?

É uma abordagem terapêutica que busca desenvolver no paciente, assim como em seus familiares e cuidadores, uma ampliação do conhecimento sobre sua doença e todo o processo de tratamento.

* Por Dr. Alexandre de Rezende

Você sabe o que é Psicoeducação?

A Psicoeducação é uma abordagem terapêutica que busca desenvolver no paciente, assim como em seus familiares e cuidadores, uma ampliação do conhecimento sobre sua doença e todo o processo de tratamento.

Dessa maneira, quanto mais informada estiver uma pessoa acerca de sua condição de saúde física e mental, sobre seu funcionamento (cognitivo, emocional e comportamental) e sobre a forma como pode ser conduzido seu tratamento, mais ela estará pronta para participar ativamente do processo de mudança (Lukens & McFarlene, 2004). Então, os pacientes começam a melhorar quando começam a entender sua forma de reagir e funcionar, a aprender a resolver problemas e a desenvolver um repertório de estratégias que eles mesmo podem aplicar.

Pode-se dizer que a Psicoeducação é uma importante estratégia dentro de uma perspectiva cognitivo-comportamental. Isso porque a terapia cognitivo-comportamental baseia-se no pressuposto de que os pacientes podem aprender estratégias para modificar pensamentos e crenças, manejar estados emocionais e modificar de forma produtiva seu comportamento.

Por exemplo: um paciente com crises de pânico, muito angustiado e preocupado com a possibilidade de estar com um grave problema cardíaco, tende a se acalmar quando descobre que aquelas crises estão inseridas no transtorno do pânico e aprende a lidar com essas ocorrências e com os medos e evitações por elas desencadeados.

A Psicoeducação está entre as práticas baseadas em evidências mais eficazes tanto em ensaios clínicos como em contextos comunitários (Lukens &McFarlene, 2004). Num estudo com 101 indivíduos com transtorno bipolar, aqueles que participaram do grupo de tratamento por psicoeducação, além do tratamento padrão, mostraram menos recaídas em geral, períodos mais longos sem sintomas, menos sintomas e mais adesão à medicação (Miklowitz et al., 2003).

Psicoeducação: como aplicar?

São apontados alguns princípios gerais que podem nortear a aplicação da psicoeducação, sobretudo no contexto da terapia cognitivo-comportamental (Wright et al., 2010):

  1. adaptação da psicoeducação à capacidade dos pacientes de compreender e processar informações.
  2. fornecimento de explicações claras e breves, com ênfase colaborativa, com a utilização de materiais escritos facilitadores.
  3. incentivo à participação do paciente.
  4. solicitação de feedback, de forma a verificar o entendimento do conteúdo apresentado.
  5. recomendações de leituras específicas, pesquisas ou outras atividades educativas como tarefa de casa.

Então, na Psicoeducação podem ser recomendados textos, livros, vídeos, filmes, sites, programas de computador e aplicativos de celular. É sempre importante que o material para a leitura seja conciso e não extenso.

A família do paciente ou cuidadores podem ser inseridos no processo de psicoeducação. Em relação à psicoeducação familiar, algumas metas são importantes:

  • promoção da aceitação familiar do transtorno psiquiátrico;
  • desenvolvimento de expectativas realistas em relação ao paciente;
  • explicações sobre intervenções farmacológicas e psicológicas;
  • reconhecimento de sinais precoces de recaídas e mudanças sintomatológicas.

A Psicoeducação também tem se mostrado efetiva no contexto de doenças físicas, pois o conhecimento sobre elas, suas possíveis causas, modos de controle e os efeitos colaterais das medicações, podem ajudar na adesão ao tratamento e no controle de patologias diversas. Assim, a Psicoeducação tem cada vez mais se destacado como uma importante estratégia no tratamento de diversas queixas e em uma variedade de contextos.

Para saber mais:

Carvalho, M.R., Malagris, L.E.N., & Rangé, B.P. (2019). Psicoeducação em terapia cognitivo-comportamental. Novo Hamburgo: Sinospys.

Referências bibliográficas:

Lukens, E.P. & McFarlane, W.R. (2004). Psychoeducation as evidence-based practice: Considerations for practice, research, and policy. Brief Treatment and Crisis Intervention, 4(3), 205-225.

Miklowitz, D.J., George, E.L., Richards, J.A., Simoneau, T.L., & Suddath, R.L. (2003). A randomized study of family-focused psychoeducation and pharmacotherapy in the outpatient management of bipolar disorder. Archives of General Psychiatry, 60, 904-912.

Wright, J.H., Basco, M.R., & Thase, M.E. (2008). Aprendendo a terapia cognitivo-comportamental: Um guia ilustrado. Porto Alegre: Artmed.

Janeiro Branco: O sentido da vida

Vale destacar que a felicidade não é o resultado de uma fórmula. Também não se resume a uma vida livre de frustrações e de momentos de sofrimento.

* Por Sabrina Gomes

A campanha “Janeiro Branco” faz um importante convite para a reflexão sobre o cuidado em saúde mental. Uma das contribuições desta proposta está em direcionar nossa atenção para as possibilidades de investimento em ações de prevenção ao adoecimento mental e de promoção de comportamentos que possam nos aproximar de uma vida mais feliz.

Muitas são as propostas que apresentam a felicidade como um alvo a ser perseguido. São muito comuns as publicações que oferecem o “passo a passo” para a felicidade. No entanto, contrariando esta concepção, quero apresentar a introdução a uma visão diferente de felicidade, a qual pode contribuir para o processo pessoal de desenvolvimento de cada um dos interessados em seguir com essa leitura.

Primeiramente, por mais que possa parecer óbvio, vale destacar que a felicidade não é o resultado de uma fórmula. Também não se resume a uma vida livre de frustrações e de momentos de sofrimento. Devemos considerar que o processo de busca por uma vida feliz é único, individual, o que torna impossível a ideia de um percurso único a ser trilhado por todos. Além disso, ao invés de negarmos nossas limitações e inseguranças, o caminho é o investimento na capacidade de lidarmos com as adversidades e com os momentos de angústia, uma vez que são inevitáveis.

Viktor Frankl, um psiquiatra e neurologista que se dedicou a estudar e observar o comportamento das pessoas, pode nos ajudar a compreender a vida de uma maneira bem interessante. Ele percebeu que a busca por sentido está no centro da vida humana. Para Frankl, a busca por um sentido de vida representa a principal força motivadora humana, sendo a felicidade um dos efeitos colaterais deste investimento. E há um ponto muito importante: o caminho para o sentido da vida está em amarrar nossas escolhas com um propósito e todos podemos fazer isso!

Frankl concluiu seu pensamento observando pessoas que estiveram como prisioneiras em campos de concentração e que encontraram, mesmo imersas em uma condição de intenso sofrimento, um sentido para permanecerem vivas. E ainda há um ponto fundamental nesta investigação: Frankl também foi prisioneiro em alguns campos de concentração, vivendo na pele a experiência (você pode ter acesso aos registros no livro “Em busca de sentido” –  vale a leitura).

Com esta breve reflexão de início de ano, neste mês especial para a Saúde Mental, o convite está feito: que você possa investir tempo na construção cuidadosa de um projeto de vida autêntico e que evite distrações que te distanciem daquilo que represente um sentido de vida para você. É importante lembrar que esse pode ser um caminho complexo em alguns momentos, e que pode ser muito positivo buscar a ajuda de pessoas qualificadas sempre que você julgar necessário.

 Referência

Frankl, V. E. (2013). Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração (Vol. 3). Editora Sinodal.

Saúde Mental: Integrar é preciso

Aceitar que as emoções são parte importantíssima de nossa vida pode nos trazer um estado mental mais harmônico e uma melhor saúde física.

* Por Dr. Fabrício de Oliveira

Saúde Mental: Integrar é preciso

Estados mentais subjetivos são influenciados por fatores físicos como medicamentos, exercícios e dieta. De modo inverso, uma quantidade de distúrbios físicos é influenciada por fatores psicológicos.

São muito comuns os distúrbios psicofisiológicos, nos quais o sofrimento mental persistente provoca alterações nos tecidos, o que, por sua vez, causa sintomas. Exemplos incluem cefaleias, indisposições gastrintestinais, problemas dermatológicos e dor musculoesquelética de todos os tipos.

Muitos pacientes ficam preocupados por pensarem que o profissional de saúde, ao propor uma explicação que envolva a abordagem de fatores psicológicos, indique que pensamos que a dor deles é imaginária, ou que “é tudo da minha cabeça”. Eles também podem temer ser acusados de simulação. É preciso explicar que talvez o problema  é causado por alterações no corpo e que é, em todos os sentidos, real.

Evidentemente é imperativo que antes de considerarmos que o aparecimento ou persistência de determinada alteração tenha origem ou influência de fatores psicogênicos, todos os pacientes devem passar por um exame clínico completo para excluir causas orgânicas não diagnosticadas.

Algumas pessoas podem se perguntar: “Será que esse papo de origem psicológica é verdade?”

Cada vez mais a ciência nos permite entender e comprovar a influência das emoções no corpo físico. Podemos usar a resposta de “luta-ou-fuga” para uma melhor elucidação.

Todos os mamíferos compartilham uma resposta de emergência altamente adaptativa, sofisticada e remota muitas vezes chamada de sistema de luta-ou-fuga. Quando um mamífero é ameaçado, seu sistema nervoso simpático e seu eixo hipotalâmico-pituitário-suprarrenal (HPA) são ativados, resultando em aumento de epinefrina (adrenalina) na corrente sanguínea e alterações fisiológicas correspondentes (Sapolsky, 2004).

Quase toda mudança fisiológica ocasionada por esse sistema pode causar ou exacerbar um sintoma relacionado a estresse se o sistema permanecer continuamente ativo.

Dessa forma, o organismo pode manifestar uma vulnerabilidade à sobrecarga psicológica e/ou fisiológica que, quando persistente, causa desgastes orgânicos, originando doenças.

Visto que esses distúrbios são com frequência mantidos por uma combinação de fatores médicos, psicológicos e comportamentais, se faz necessário desenvolver intervenções integradas, flexíveis, que tentam tratar todos esses elementos.

Os estressores psicossociais, como o trauma interpessoal, podem ter efeitos biológicos profundos ao alterarem o funcionamento do cérebro. Ademais, pensar na psicoterapia como um tratamento para “transtornos com base psicológica” e em medicamentos como um tratamento para “transtornos biológicos ou cerebrais” é uma distinção ilusória. O impacto da psicoterapia sobre o cérebro está bem estabelecido (ver Gabbard, 2000).

Os achados da neurobiologia vêm aumentando o entendimento sobre psicoterapia nos últimos anos. Um breve panorama desses achados evidencia o fato de que a psicoterapia tem um impacto importante sobre o cérebro e não pode ser desprezada como um mero “apoio” ou uma tranquilização afável.

A combinação de psicoterapia e farmacoterapia é cada vez mais comum, conforme se acumulam evidências de que muitas condições respondem melhor ao tratamento combinado do que a apenas uma das modalidades isoladamente (Gabbard e Kay, 2001). Visto que ambos os tratamentos afetam o cérebro, em um sentido bastante real, os dois são intervenções biológicas. Entretanto, os mecanismos de ação dos dois tratamentos podem ocorrer em áreas muito diferentes do cérebro.

Aceitar que as emoções são parte importantíssima de nossa vida pode nos trazer, não só um estado mental mais harmônico, mas também uma melhor saúde física.

Um novo ano, folhas em branco pela frente.

Caso você pudesse escolher, reconhecendo com gentileza tudo o que representa o seu ontem, como você gostaria de escrever o seu dia de amanhã?

* Por Dr. Leonardo Martins

Um novo ano, folhas em branco pela frente.

Caso você pudesse escolher, reconhecendo com gentileza tudo o que representa o seu ontem, como você gostaria de escrever hoje o seu dia de amanhã? O que lhe impede neste momento de seguir na direção daquilo que de fato importa em sua vida?

Janeiro Branco

Neste mês ocorre uma das principais campanhas de conscientização sobre saúde mental no Brasil. Os seus idealizadores nomearam esse movimento como “Janeiro Branco”, inspirados por outras campanhas, tal como o “Outubro Rosa” em que o tema é a conscientização sobre o câncer de mama.
A escolha exata do mês e da cor branca faz referência a sensação que alguns de nós temos ao começarmos um ano novo. Em janeiro temos pela frente todos os demais dias do ano em branco. Diante desta imagem, ao pensarmos nos dias que virão como folhas de papel em branco, é natural que surja o desejo de escrevermos nas próximas páginas uma nova história. Resoluções de ano novo, promessas de mudança, o compromisso com novos sonhos ou mesmo a retomada do que deixamos para traz são temas comuns nesse âmbito.

Todo o tipo de esperança pode emergir quando percebemos que nossa história ainda está por ser escrita. Quando esta está conectada de forma íntima e sincera com tudo aquilo que de fato nos importa, daqui muitas vezes emerge o próprio sentido para vida. Geralmente, guardamos aqui o que não abrimos mão mesmo no contexto das maiores adversidades, as coisas ou modos de viver pelos quais nós lutaríamos nossas maiores batalhas. Seguir na direção do que importa e daquilo que nos traz sentido produz um movimento que nos dá geralmente a sensação de vivermos uma vida que vale a pena ser vivida.

É fato que o momento e o contexto em que vivemos impacta sobremaneira a chance de termos esperança e de seguirmos na direção de dias melhores. Diversos fatores são importantes para que isso ocorra de modo natural e alguns deles podem estar ausentes ou mesmo depender de coisas que não estão no nosso controle. Ainda assim, temos o direito de escolher a maneira como desejamos passar pela vida, como lidamos com aquilo que está fora do nosso controle e como lidamos com aquilo que está em nossas mãos. Fazer esse movimento, ainda que na adversidade, nos faz seguir por uma jornada em direção à uma vida valorada e com sentido. Folhas em branco, escritas com a tinta do que importa, passam a versar hoje sobre a vida que buscaremos viver hoje e que fala do que buscamos para amanhã. Saúde mental, neste sentido, não fala sobre um estado interno individual, mas sim da nossa potência como indivíduos e sociedade de aprendermos como nosso passado e de assim nos movimentarmos no presente em direção aos dias que gostaríamos de viver no futuro. Não é raro que o oposto à saúde mental represente justamente a repetição do ontem, o medo do amanhã que nos paralisa ou mesmo a sensação de estarmos presos em uma história ou modo de viver que já não nos cabe mais.

A campanha “Janeiro Branco” nos lembra que independente da história que vivemos, temos hoje um amanhã em branco pela frente; e que este pode ser preenchido por uma vida possa valer a pena ser vivida. O “Janeiro Branco” nos alerta sobretudo de que quando esse movimento não nos é possível, talvez seja a hora de não só pensarmos sobre isso, mas hora de insistirmos em seguir por uma nova direção, como indivíduos ou sociedade, e com a devida ajuda caso necessário for.

Eu sou o diagnóstico ou estou o diagnóstico?

Na verdade, nem um e nem outro. A intenção é chamar atenção para o que e para quem é importante o diagnóstico em Saúde Mental.

* Por Diana Lopes

Eu sou o diagnóstico ou estou o diagnóstico?

Na verdade, nem um e nem outro. A experiência de ser e estar é muito mais ampla do que qualquer tipo de categorização.

Com o avanço da ciência médica e com os recursos diagnósticos cada vez mais precisos, a prática clínica ganhou suporte e opções de tratamentos mais eficazes e eficientes. E assim, o diagnóstico se tornou cada vez mais central no tratamento de diversas doenças.

E em saúde mental, qual será o lugar do diagnóstico?

Assistimos ao longo dos anos uma sociedade mais atenta aos enquadramentos psíquicos. Em uma busca rápida em sites para esta finalidade, facilmente encontramos testes  e informações que verificam em  quais categorias de transtorno as pessoas com determinadas características pertencem.

É um movimento controverso, uma vez que se por um lado o acesso à informação pode ser uma via de esclarecimento, reconhecimento e busca por um tratamento adequado, por outro lado pode decorrer em banalização diagnóstica tanto por parte das pessoas de um modo geral como por parte de profissionais.

Longe de querer esgotar neste texto um assunto que envolve um nível alto de complexidade, a intenção é chamar atenção para o que e para quem é importante o diagnóstico em Saúde Mental. Para isto devemos partir da concepção de que a condição humana é marcada por uma gama de aspectos que se traduzem na experiência de viver e no modo como nos relacionamos com o mundo. Isto nos leva a considerar que todos os modos de existir são legítimos porque são formas de viabilizar a própria existência. Por isso o diagnóstico não poderia ter este papel tão central e generalizado como podemos constatar nos últimos anos. O diagnóstico serve de referência para o profissional guiar sua conduta clínica, mas está longe de traduzir precisamente quem é uma pessoa.

E como consequência dessa ênfase no diagnóstico, podemos constatar com alguma frequência pessoas e profissionais buscando tratamentos para sentimentos comuns. Por exemplo, a tristeza, o sofrimento após um luto, uma separação tem levado pessoas a buscar medicamentos ou enquadramento em uma psicopatologia para a “cura” de eventos que fazem parte da dinâmica da vida. Ou quando um problema coletivo como a educação brasileira, por exemplo, é transformado em um problema pessoal, quando diagnosticamos uma criança em algum transtorno mental por apresentar um comportamento que foge ao esperado pela normativa.

Allen Frances, que dirigiu o DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico) durante anos, em entrevista ao “El País”,  mostrou preocupação em relação a esta tendência de epidemia de diagnósticos. Para ele seres humanos são maleáveis e capazes de se adaptar em condições muito adversas. Ainda se fala pouco sobre esse assunto no Brasil que atinge o mundo inteiro. Aqueles que tentam abordar este tema podem ser desqualificados inclusive pela comunidade acadêmica mesmo sabendo que a ciência só se avança pelo questionamento.

Claro que estamos passando por um momento jamais antes vivido e com isto lidamos com sentimentos intensos da esfera mais íntima às experiências coletivas. Diante do desconhecido, da morte iminente, de ter nossa autonomia capturada pela pandemia, do isolamento social, da crise socioeconômica, de ficar longe de quem amamos e ter nossa vida completamente revirada, somos impactados significativamente em nossa experiência de ser e de estar. E reagimos naturalmente a isto. Mas será que tudo deve ser patologizado?

É neste momento que precisamos buscar entender o que acontece e de que modo isto nos impacta, e junto com profissionais sérios e qualificados buscar modos de superação. A busca frenética e cega por diagnósticos pode aprisionar uma existência sem resolver o problema realmente. Tanto pacientes quanto profissionais deveriam buscar a compreensão do modo como funcionamos, de como nos organizamos e estabelecemos relação com o mundo, o que pode ser a saída fundamental para a melhora e avanço na qualidade de vida, pois somos e podemos muito mais do que mostramos superficialmente .

Neste final de ano a Clínica Rezende resolveu preparar uma surpresa…

Passamos por um ano difícil e, por isso, gostaríamos de agradecer a todos os profissionais da Clínica Rezende, que fizeram com que os dias fossem mais leves por aqui.

Passamos por um ano difícil e, por isso, gostaríamos de agradecer a todos os profissionais da Clínica Rezende, que fizeram com que os dias fossem mais leves por aqui. Essa é a mensagem do Dr. Alexandre de Rezende para toda a equipe: Aline, Anelisa, Diana, Eliza, Fabrício, Fernanda, Juliana, Laís, Leonardo, Natália, Roseli, Sabrina e Vívian. E também a todos os amigos e pacientes da Clínica Rezende! 💙

Nesses tempos difíceis,Quando as portas se fecharam e a solidão invadiu nossas moradas, pude contar com a presença da sua escuta. Quando as luzes se apagaram e o medo se impôs sem compaixão, eu sabia dos seus olhos a me dizer todas as palavras. Quando o silêncio gritou seus fantasmas e a dor tomou posse do nosso peito, a sua voz me trouxe coragem. Nesses tempos de solidão, de medo, de silêncio, de dor, Você foi a presença de uma mão que me trouxe conforto e afago. Nesses tempos ainda difíceis, Quero que o silêncio se rompa e a minha voz se construa num obrigado. Agora que os olhos marejam de esperança, Quero gravar em você toda a minha gratidão. Porque a gratidão é assim: Tecida do fio nobre e frágil da marca que você deixou em mim. E que o futuro costure nossos caminhos juntos novamente!

Texto: Dr. Alexandre de Rezende

Vídeo: @maxwellcosta

 

Pandemia de medo e covid-19: impacto na Saúde Mental e possíveis estratégias.

Para entender as repercussões psicológicas e psiquiátricas de uma pandemia, as emoções envolvidas, como medo e raiva, devem ser consideradas e observadas.

* Por Fernanda Rezende

“PANDEMIC FEAR” AND COVID-19: MENTAL HEALTH BURDEN AND STRATEGIES.

Para entender as repercussões psicológicas e psiquiátricas de uma pandemia, as emoções envolvidas, como medo e raiva, devem ser consideradas e observadas. O medo é um mecanismo de defesa animal adaptável que é fundamental para a sobrevivência e envolve vários processos biológicos de preparação para uma resposta a eventos potencialmente ameaçadores. No entanto, quando é crônico ou desproporcional, torna-se prejudicial e pode ser um componente essencial no desenvolvimento de vários transtornos psiquiátricos. Em uma pandemia, o medo aumenta os níveis de ansiedade e estresse em indivíduos saudáveis e intensifica os sintomas daqueles com transtornos psiquiátricos pré-existentes.

Durante as epidemias, o número de pessoas cuja saúde mental é afetada tende a ser maior que o número de pessoas afetadas pela infecção. Tragédias anteriores mostram que as implicações para a saúde mental podem durar mais tempo e ter maior prevalência que a própria epidemia e que os impactos psicossociais e econômicos podem ser incalculáveis se considerarmos sua ressonância em diferentes aspectos.

Outro estudo relatou que pacientes infectados com COVID-19 (ou suspeita de infecção) podem sofrer intensas reações emocionais e comportamentais, como medo, tédio, solidão, ansiedade, insônia ou raiva, como já foi relatado em situações semelhantes no passado. Tais condições podem evoluir para transtornos, sejam depressivos, ansiedade (incluindo ataques de pânico e estresse pós-traumático), psicóticos ou paranoides, e podem até levar ao suicídio. Essas manifestações podem ser especialmente prevalentes em pacientes em quarentena, cujo sofrimento psicológico tende a ser maior. Em alguns casos, a incerteza sobre infecção e morte ou sobre infectar familiares e amigos pode potencializar estados mentais disfóricos.
Mesmo entre pacientes com sintomas comuns de gripe, o estresse e o medo devido à semelhança das condições podem gerar sofrimento mental e piorar os sintomas psiquiátricos.

Embora alguns protocolos tenham sido estabelecidos, a maioria dos profissionais de saúde que trabalha em unidades de isolamento e hospitais não é treinada para prestar assistência em saúde mental durante pandemias, nem recebe atendimento especializado.

O fornecimento de primeiros socorros psicológicos é um componente de assistência essencial para populações vítimas de emergências e desastres, mas não existem protocolos ou diretrizes universais eficazes para as práticas de apoio psicossocial.

Especificamente para esse novo cenário da COVID-19, Xiang et al. Sugere que três fatores principais sejam considerados ao desenvolver estratégias de saúde mental:

  • Equipes multidisciplinares de saúde mental (incluindo psiquiatras, enfermeiros psiquiátricos, psicólogos clínicos e outros profissionais de saúde mental);
  • Comunicação clara envolvendo atualizações regulares e precisas sobre o surto de COVID-19;
  • Estabelecimento de serviços seguros de aconselhamento psicológico (por
    exemplo, via dispositivos ou aplicativos eletrônicos).

Por fim, é extremamente necessário implementar políticas públicas de saúde mental em conjunto com estratégias de resposta a epidemias e pandemias antes, durante e após o evento. Recentemente a OMS e o Centro de Controle de Prevenção de Doenças dos EUA (CDC) publicaram uma série de recomendações psicossociais e de saúde mental. Isso está de acordo com os dados longitudinais da OMS que demonstram que os fatores psicológicos estão diretamente relacionados às principais causas de morbimortalidade no mundo.

Referência Bibliográfica:
ORNEL, F. et al. Pandemia de medo e COVID-19: Impacto na Saúde Mental e
possíveis estratégias. Debates em psiquiatria, Rio de Janeiro. N 02, p. (12-17),
Abril – junho 2020.

Sofrimento emocional na gestação

Transtornos e sintomas psiquiátricos são frequentes, especialmente, no primeiro e no terceiro trimestres de gestação e nos primeiros 30 dias de puerpério.

* Por Dr. Fabrício de Oliveira

Sofrimento emocional na gestação

Transtornos e sintomas psiquiátricos são frequentes, especialmente, no primeiro e no terceiro trimestres de gestação e nos primeiros 30 dias de puerpério. Os fatores envolvidos na alta prevalência dizem respeito às diversas dimensões da gravidez e da maternidade. Além de alterações hormonais, que provocam transformações no comportamento e no psiquismo, gravidez e maternidade implicam várias mudanças na inserção social. Outros fatores como poucos recursos materiais, alta demanda ocupacional, responsabilidades domésticas intensas e relações familiares conflituosas podem piorar a situação.

A ponderação relativa aos riscos da exposição às medicações versus o impacto de uma doença não tratada nos resultados obstétricos e no desenvolvimento infantil tornam-se um grande dilema para o clínico e para a paciente. O que ambos precisam levar em conta é que não há escolha livre de risco.

As reações da gestante estão vinculadas a alterações metabólicas, principalmente no eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA), que de modo peculiar podem influenciar o feto. Sua exposição a um ambiente uterino desfavorável tem sido associada ao aumento significativo de doenças na idade infantil e adulta, fenômeno denominado programação fetal.

Transtornos depressivos

Até 70% das pacientes têm sintomas depressivos durante a gravidez, sendo que de 10 a 16% preenchem critérios para o diagnóstico de depressão.

Os transtornos do humor do puerpério dividem-se, classicamente, em quadros de depressão mais leve, chamados de disforia do pós-parto e depressão. Disforia pós-parto (puerperal blues) é um fenômeno extremamente comum e considerado fisiológico por alguns autores. Até 85% das puérperas descrevem algum grau de tristeza ou humor depressivo nos primeiros dias do pós-parto. Essa incidência diminui a partir do décimo dia de puerpério. Normalmente, esses sintomas depressivos são leves, acompanhados de labilidade emocional, irritabilidade, tensão e sentimentos de inadequação. Não chegam a comprometer o funcionamento social ou a relação da mãe com o recém-nascido. A remissão espontânea dos sintomas sugere que não há necessidade de tratamento médico. A persistência do humor depressivo deve ser encarada como uma possível depressão maior, o que necessita de avaliação especializada e tratamento adequado.

Lamentavelmente, sintomas e sinais francamente depressivos durante a gravidez muitas vezes não são adequadamente percebidos e avaliados. Essa desvalorização de manifestações clínicas depressivas por parte das próprias gestantes, familiares e médicos tem relação com o mito de que a gestação deva ser necessariamente um período de bem-estar mental. Neste contexto cultural, muitas gestantes sentem-se culpadas por não estarem felizes e com vergonha de pedirem ajuda.

De acordo com a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), a paciente com depressão na gestação apresenta uma gravidez de alto risco. No entanto, somente cerca de 14% das grávidas com depressão realizam algum tipo de tratamento.

A depressão da gestação está associada a um maior risco de: crescimento intrauterino restrito; pré-eclâmpsia; DM gestacional; prematuridade; baixo peso ao nascer; escores de Apgar mais baixos; prejuízos no desenvolvimento infantil (cognitivos, sociais, afetivos); dificuldades na amamentação; vínculo inseguro entre mãe e criança; depressão pós-natal; uso materno de álcool, tabaco e outras drogas; abortamento; e suicídio materno.

Transtorno bipolar perinatal

Independentemente da terapia medicamentosa, o TB na gestação está associado a maiores riscos de: uso de álcool, tabaco e outras drogas; malformações congênitas (p. ex., microcefalia); prematuridade; baixo peso ao nascer; placenta prévia; hemorragias; prejuízos no desenvolvimento infantil (cognitivos, sociais, afetivos). Portanto, a manutenção ou mesmo o início de tratamento farmacológico de prevenção à recorrência de TB durante o período perinatal é uma conduta pertinente.

Transtorno de ansiedade generalizada perinatal

A prevalência do transtorno de ansiedade generalizada é em torno de 2% a 6% na população geral; a prevalência mínima é de 8,5% na gravidez e 4,4% no pós-parto.

Estudos mostram que a ansiedade durante a gestação é fator de risco independente para trabalho de parto prematuro e depressão pós-parto. Outras consequências são baixo peso ao nascer, maior necessidade de analgésicos durante o parto e dificuldade de amamentar

Deve-se considerar que episódios psiquiátricos não tratados estão associados à maior probabilidade de importantes intercorrências obstétricas, maternas, neonatais e puerperais, com implicações negativas para o desenvolvimento da criança e para as relações familiares. Portanto, na ausência de uma alternativa terapêutica apropriada, evitar o uso pertinente de medicamento psiquiátrico como meio de garantir gravidez ou amamentação livres de riscos é uma estratégia contestável.