Não à gordofobia! Sim ao tratamento da obesidade!

Quando falamos em Obesidade, várias ideias e imagens vêm à nossa mente. A maioria baseada em conceitos antigos ou influenciados pelo que vemos nas mídias e redes sociais que tratam a condição clínica de forma pejorativa.

* Por Luiza Junqueira

Quando falamos em Obesidade, várias ideias e imagens vêm à nossa mente. A maioria baseada em conceitos antigos ou influenciados pelo que vemos nas mídias e redes sociais que tratam a condição clínica de forma pejorativa.

Obesidade é uma doença crônica

Primeiramente, é importante destacar que a Obesidade é uma doença crônica, multifatorial, associada a várias outras doenças e que reduz a expectativa de vida. Ela tem uma importante base genética combinada com fatores ambientais relacionados ao meio em que vivemos. A base genética da doença não pode ser alterada, mas podemos atuar orientando mudanças dos hábitos de vida saudáveis, utilizando recursos terapêuticos como medicamentos e cirurgia. Assim, entendendo os mecanismos fisiopatológicos, tratamos a doença embasados em evidências científicas.

Neste ano de 2022, a Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO) nos trouxe a campanha “Conhecimento, cuidado e respeito”, com o foco em ampliar o conhecimento sobre a Obesidade, para assim reduzir o preconceito e levar a melhoria no cuidado às pessoas. O foco é em combater a Obesidade e não a pessoa com Obesidade.

Em uma pesquisa on-line realizada pela ABESO, 85,3% dos participantes com excesso de peso (sobrepeso ou obesidade) relataram ter sofrido constrangimento por causa do seu peso. E desses, 60% referiram ter sofrido algum preconceito dentro do consultório médico, mostrando não só a falta de conhecimento pela população, como o despreparo de profissionais que lidam com esses pacientes.

Respeitar os tipos de corpos

O combate à Gordofobia não significa apologia ao excesso de peso. Significa respeitar os diferentes tipos de corpos, não almejar metas irrealistas e baseadas em padrões de beleza impostos, refutar qualquer tipo de preconceito, para assim poder tratar a Obesidade sem estigmas.

Afirmar que uma pessoa com Obesidade tem “preguiça”, “falta de força de vontade”, “que precisa mudar a cabeça” é uma forma muito preconceituosa de tratar a doença, negando as alterações metabólicas, hormonais e de neurotransmissores que ocorrem no organismo. Esse tipo de preconceito pode levar ao atraso na procura do tratamento médico adequado, à automedicação, à busca por terapias milagrosas sem evidências cientificas com risco à saúde, além de interferir diretamente na autoestima e saúde mental.

Diante uma pessoa com qualquer doença, devemos respeitar e acolher. O objetivo do tratamento da Obesidade não é atingir um determinado número na balança, mas sim melhorar a saúde e qualidade de vida. Impor metas pode causar frustrações, uma vez que cada organismo funciona de uma forma. Perdas de peso sustentadas de 10-15% já levam à melhora da saúde, mesmo que o paciente ainda tenha excesso de peso.

O objetivo da campanha, apoiado pelos profissionais de saúde que tratam a Obesidade, é levar conhecimento, sempre com respeito, para assim poder oferecer um tratamento multidisciplinar sério e impactar positivamente na saúde individual e pública.

REFERÊNCIAS:

Tomiyama AJ, Carr D, Granberg EM, Major R, Robinson E, Sutin AR et al. How and why weight stigma drives obesity epidemic and harms health. BMC Med 2018; 16(1): 123.

Ochner CN, Tsai AG, Kushner RF, Wadden TA. Treating obesity seriously: when recommendations for lifestyle change confront biological adaptations. Lancet Diab End 2015; 3(4): 232-4.

Cartilha: Obesidade e a Gordofobia. Percepções 2022. ABESO / SBEM.

Dia Mundial da Conscientização do Autismo

O Autismo é um transtorno do neurodesenvolvimento caracterizado por prejuízo na comunicação e interação social além de padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades.

* Por Carolina Conti

Dia 2 de abril é o dia Mundial da Conscientização do Autismo. Essa data foi criada pela organização Mundial das Nações Unidas com o objetivo de conscientizar a população e o poder publico sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e garantir o respeito e a inclusão desses indivíduos e suas famílias.

O que é Autismo?

O Autismo é um transtorno do neurodesenvolvimento caracterizado por prejuízo na comunicação e interação social além de padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades.

Os prejuízos na comunicação e interação social podem se manifestar na forma de pouco contato visual, atraso no desenvolvimento da linguagem, pouca reciprocidade social ou emocional, dificuldade em se adaptar a diferentes situações sociais, dificuldade em entender linguagem não verbal das outras pessoas.

Em relação aos padrões de comportamento restrito e repetitivo pode ocorrer interesse restrito ou  hiperfoco; adesão excessiva a rotinas; movimentos repetitivos ou estereotipias com objetos ou falas; hiper ou hiporreação aos estímulos do ambiente; sensibilidade a barulhos, cheiros, texturas; ou extremo interesse em luzes, brilhos e determinados movimentos repetitivos.

Como cada individuo é único os autistas não precisam apresentar todos os sintomas e nem de forma igual. Algumas pessoas podem apresentar nuances diversas dentro das características descritas acima. Por isso, o próprio termo utilizado hoje, Transtorno do Espectro Autista (TEA) se refere a uma ideia de amplitude e variedade de sintomas.

O TEA deve ser enfrentado com a participação e o apoio de toda a sociedade, além do poder público. Precisamos desenvolver estratégias e projetos na área da saúde e da educação que incluam os indivíduos com TEA e suas família de forma efetiva!

Quais os sinais precoces devemos estar atentos?

  • Pouco ou nenhum contato visual e ausência do sorriso social – é observado quando a criança não corresponde às expressões sociais, fala ou brincadeiras dos pais.
  • Não responde ao próprio nome – a criança parece não ouvir quando chamada, pode ser confundido com frequência com perda auditiva.
  • Perder habilidades já adquiridas – a criança começa a falar algumas palavras e depois de alguns meses não fala mais.
  • Baixa atenção aos rostos humanos, apresenta preferência por objetos.
  • Incômodo exagerado com sons altos
  • Distúrbios do sono
  • Dificuldade em compartilhar a atenção, ou seja, dividir a atenção entre a fala dos pais e o objeto do qual estão falando.
  • Brincadeiras repetitivas e fragmentadas – a criança explora os objetos, mas tem dificuldade em brincar de forma funcional e utilizar o faz de conta.
  • Restrição de interesses, tanto para brincadeiras e objetos quanto para alimentos.
  • Atraso na aquisição da linguagem – não verbal (gestos) e verbal (fala).


    Lembrando que nem sempre que a criança apresenta um dos sinais acima significa que ela tem Autismo! É preciso buscar ajuda médica e multiprofissional para fazer o diagnóstico. As crianças são únicas, elas podem apresentar esses sinais de formas e intensidades diferentes.

    Se notar sinais ou sintomas preocupantes invista na intervenção precoce.

Transtorno do Estresse Pós-Traumático

O que é, os principais sintomas, como o problema pode estar sendo mantido. Leia aqui.

* Por Dr. Alexandre de Rezende

O que é o Transtorno do Estresse Pós-Traumático?

O Transtorno do Estresse Pós-Traumático – TEPT é caracterizado pelo aumento do estresse e da ansiedade após a exposição a um evento traumático, sendo que a resposta a esse estressor precisa envolver medo intenso ou terror.  Ou seja, para que a pessoa desenvolva TEPT, é necessário que ela tenha experimentado ou testemunhado situações que envolvam morte, sério ferimento ou ameaça à sua integridade física ou de pessoas próximas.

Por definição, um evento traumático é o fator causal principal no desenvolvimento do TEPT e deve ser suficientemente grave e devastador para afetar quase todas as pessoas. Pode incluir ser testemunha ou estar envolvido em um acidente ou crime violento, agressão, sequestro, vivenciar um desastre natural (enchentes, desabamentos, furacões), situações de guerra, ser vítima de abusos físicos ou sexuais, ou ser diagnosticado com uma doença grave, dentre outras possibilidades.

No entanto, nem todas as pessoas desenvolvem o transtorno após um evento traumático. Há dados mostrando que 60% dos homens e 50% das mulheres experimentam algum trauma significativo ao longo do tempo, enquanto a prevalência de TEPT durante a vida é de 8%.

Quais são os principais sintomas do TEPT?

Para que o TEPT seja diagnosticado, é preciso que a pessoa apresente, após um mês de ocorrência do trauma, sintomas que envolvam três domínios:

  1. Sintomas intrusivos após o trauma
  2. Evitação de estímulos associados ao evento
  3. 3. Aumento da excitação autonômica 
  • Sintomas intrusivos após o trauma

A pessoa fala da presença de lembranças angustiantes, recorrentes e involuntárias do evento traumático, e sonhos recorrentes ligados ao estressor. Os chamados flashbacks, nos quais o indivíduo age e sente como se o trauma estivesse ocorrendo novamente, são sintomas clássicos dessas manifestações intrusivas.

A experiência fica se repetindo na mente da pessoa, fazendo com que ela reviva o trauma constantemente, e tenha pensamentos indesejados sobre o evento estressor. Esses pensamentos podem vir como um filme, que fica passando na cabeça, ou imagens muito reais, como se a situação estivesse acontecendo novamente. Além disso, a pessoa pode passar a ter pesadelos relacionados ao trauma.

  • Evitação de estímulos associados ao evento

O indivíduo começa a empreender esforços para evitar recordações ou situações (pessoas, lugares, conversas) que despertem as lembranças do que aconteceu, podendo até mesmo apresentar alguma dificuldade para recordar algum aspecto importante do evento. Além disso, a pessoa desenvolve algumas crenças negativas a respeito de si mesmo, dos outros e do mundo (“sou mau”, “não se deve confiar em ninguém”, “o mundo é perigoso”). É bastante comum a presença de um estado emocional negativo, expresso por sentimentos de medo, raiva ou culpa, assim como interesses diminuídos em atividades significativas.

Para fugir dos sentimentos indesejados, a pessoa passa a evitar o contato com situações ou pessoas que a lembrem do ocorrido. Por exemplo: alguém que foi assaltado em um ônibus, começa a deixar de usar transportes públicos (até mesmo metrô e trem). Também ao tentar afastar pensamentos e sentimentos dolorosos, a pessoa pode acabar tendo dificuldades em sentir outras emoções, como amor, alegria, esperança, a que damos o nome de entorpecimento emocional. Ela pode apresentar sentimentos como raiva, vergonha e culpa. O interesse em atividades das quais costumava gostar também pode estar diminuído ou ausente. Esse entorpecimento emocional parece ser uma estratégia psicológica para “anestesiar” o sofrimento e o pânico gerados pela revivência.

  • Aumento da excitação autonômica

Tal domínio se caracteriza pela presença de surtos de raiva, hipervigilância, problemas de concentração, resposta de sobressalto exagerada e perturbações do sono. Tais sintomas são reações psicofisiológicas relacionadas a estímulos que estejam associados ao trauma. Isso faz com que a pessoa tenha a sensação permanente de ameaça.

Dessa maneira, a pessoa e seu corpo estão em constante estado de alerta, sempre prontos para responder imediatamente a uma situação perigosa, mesmo em contextos seguros, com nervosismo ou agitação, irritabilidade, dificuldade de concentração ou problemas para dormir.

Quando um paciente passou por um acontecimento traumático e desenvolveu TEPT, a ênfase dever ser na psicoeducação sobre o transtorno e seu tratamento, farmacológico e psicoterápico. As principais abordagens são apoio, encorajamento para discutir o evento e a educação sobre uma variedade de mecanismos de enfrentamento (por exemplo, relaxamento). É importante que cada pessoa fale do que lhe aconteceu no seu ritmo e que sua vontade seja respeitada.

Como os pensamentos influenciam no TEPT?

É importante destacar e relembrar que a forma como se interpreta as situações influencia diretamente na forma como se sente, nas reações corporais e nas ações que se realiza em cada situação.

As principais interpretações feitas por pessoas com TEPT são a de que o mundo é perigoso. Vamos novamente usar o exemplo de alguém que tenha sido vítima de um assalto à mão armada dentro de um ônibus. Em condições semelhantes, a pessoa passa a ter pensamentos automáticos (“aquela pessoa que entrou no ônibus agora vai me assaltar”), associados ao sentimento de medo e ansiedade (“eu poderia ter feito algo para evitar o que aconteceu”), com reações físicas de taquicardia, sudorese e dificuldade para respirar.

Assim sendo, uma estratégia muito usada pelas pessoas para diminuir a ansiedade de forma rápida é a evitação. Isso leva a uma redução imediata da ansiedade, porém aumenta o medo em longo prazo. No exemplo anterior, em que a pessoa foi assaltada em um ônibus, a decisão de não andar mais de ônibus dá uma sensação de alívio da ansiedade. Fazendo assim, no entanto, a pessoa reforça a ideia de que estar num ônibus é algo muito perigoso.

Como o problema pode estar sendo mantido?

Através da utilização da evitação como ferramenta de alívio imediato da ansiedade, não se aprende uma melhor forma de se lidar com ela. Evitar pensar no trauma, ao invés de fazer com que se esqueça do episódio, acaba por ter um efeito contrário.

Como lidar com o TEPT?

O principal no tratamento é que a pessoa esteja disposta e se sinta à vontade para, com a ajuda do terapeuta, falar sobre o trauma vivido. No início, não será uma tarefa fácil, mas vai ficando cada vez menos complicado.

  • Reavaliação do modo de pensar: é importante identificar os pensamentos que são causadores de medo, culpa, raiva e vergonha. Depois, o terapeuta ajudará a pessoa a enxergar as situações de formas diferentes.

Por exemplo: um motorista de ônibus que se sentia muito culpado por ter atropelado uma mulher que veio a falecer. Ao entender que foi um caso de suicídio, o pensamento do motorista se modifica. Ele consegue perceber que qualquer pessoa que estivesse dirigindo o ônibus, atropelaria a mulher.

Técnicas de enfrentamento: essa técnica visa ativar a memória traumática e todas as emoções a ela associadas, de modo que, ao final, será possível falar do trauma sem grande incômodo, apenas como algo ruim que aconteceu. O importante é perceber que o trauma está no passado e que, no presente, a vivência é outra.

  • Técnicas de manejo da ansiedade: são usadas técnicas de relaxamento e de respiração no tratamento. A prática dessas técnicas faz com que a pessoa aprenda a manejar e possa diminuir seus sintomas físicos de ansiedade, como tonteira, palpitações e suor nas mãos.

É comum que a pessoa que desenvolveu TEPT pense que nunca mais conseguirá viver como vivia antes do evento. É verdadeiramente muito difícil passar por essas situações de trauma, contudo, através do tratamento pode-se investir em pequenos passos, um de cada vez, para a melhora global da qualidade de vida.

Referência bibliográfica:

Este texto foi baseado na seguinte referência:

VENTURA, P. Capítulo 3 – Transtorno de estresse pós-traumático. In: CARVALHO, M.R.; MALAGRIS, L.E.N.; RANGÉ, B.P. Psicoeducação em Terapia Cognitivo-Comportamental. – Novo Hamburgo: Sinopsys, 2019.

Outra referência:

SADOCK, B.J.; SADOCK, V.A.; RUIZ, P. Compêndio de Psiquiatria: ciência do comportamento e psiquiatria clínica. Capítulo 11 – Transtornos relacionados a traumas e estressores – 11. Ed. – Porto Alegre: Artmed, 2017.

Desenvolvimento da pessoa com Síndrome de Down: Intervenção no ciclo vital

Apesar de se falar em características comuns às pessoas com SD, o processo de desenvolvimento é único, dinâmico e passível de múltiplas trajetórias.

* Por Sabrina Gomes

Introdução

A síndrome de Down (SD) consiste em modo de estar no mundo que demonstra a possibilidade de diversidade humana. É uma condição geneticamente determinada, geralmente caracterizada por uma trissomia do cromossomo 21, mas que também pode ser caracterizada por outras alterações cromossômicas menos comuns. Dentre as condições clínicas específicas da SD, encontra-se a deficiência intelectual, provavelmente relacionada a um atraso global no desenvolvimento que varia de pessoa para pessoa.

Apesar de se falar em características comuns às pessoas com SD, o processo de desenvolvimento é único, dinâmico e passível de múltiplas trajetórias. Isso quer dizer que as diferenças entre as pessoas com SD, tanto em aspectos físicos quanto de desenvolvimento psicossocial, decorrem de questões genéticas individuais, de estimulação, dos contextos familiar e social, entre outros fatores que irão contribuir para a produção de formas diferentes de desenvolvimento. O que se sabe é que as pessoas com SD, quando atendidas e estimuladas adequadamente, têm potencial para uma vida saudável e plena inclusão social.

Avanços na atenção à pessoa com SD

Nos últimos anos, os avanços em relação ao entendimento acerca das potencialidades da pessoa com SD permitiram a elaboração de diferentes ações de intervenção com vistas à escolarização, ao futuro profissional, à autonomia e à qualidade de vida dessas pessoas. Assim, atualmente, o foco das práticas direcionadas às pessoas com SD passou a ser o amadurecimento social, o desenvolvimento de independência e a transição da escola para o mercado de trabalho.

A proposta de um trabalho de cuidado singularizado e que considere o ciclo vital pode ser o mais adequado. Isso porque em cada ciclo da vida é importante que o indivíduo alcance habilidades que possibilitem a ele responder de maneira adequada às diversas demandas dos ambientes dos quais ele faz parte. Assim, esse cuidado personalizado busca o melhor desenvolvimento das potencialidades da pessoa com SD, visando sua qualidade de vida e inserção social e econômica. Além dos cuidados em relação à manutenção e promoção de um estilo de vida saudável (alimentação, higiene do sono, exercícios físicos), o investimento no desenvolvimento psicossocial é fundamental. A seguir, serão apresentadas algumas das principais possibilidades de intervenção psicossocial em diferentes fases da vida da pessoa com SD.

Intervenção psicossocial no ciclo vital

Crianças: a atenção psicossocial à criança com SD deve priorizar o investimento no desenvolvimento de autonomia para as atividades de vida diária (tais como: vestir-se, tomar banho e alimentar-se). O foco também deve estar na aquisição de habilidades sociais e acadêmicas. À medida que a criança vai atingindo níveis mais elevados em seu desenvolvimento motor, cognitivo e psicológico, ela deve interagir de forma mais complexa com o seu ambiente.

Adolescentes: o adolescente com SD vivencia os mesmos processos que os adolescentes com desenvolvimento típico no tocante ao crescimento físico e às consequentes mudanças da puberdade, o que torna o investimento em educação sexual muito importante. Uma das principais tarefas desenvolvimentais da adolescência é a conquista da independência em relação aos outros, sendo necessário o desenvolvimento de habilidades sociais e práticas que possam auxiliar o indivíduo na sua inserção em diversos contextos da comunidade. Assim, o treinamento em habilidades sociais pode contribuir para o estabelecimento de vínculos com os pares e para a ampliação dos contextos e das relações sociais dos adolescentes. Além disso, a participação em programa de orientação profissional também é indicada.

Adulto e Idoso: Nesta fase da vida, devem ser discutidas com a família as questões de independência e planejamento futuros quanto aos cuidados e manutenção financeira da pessoa com SD.  Deve-se percorrer um caminho para a autonomia pessoal e profissional e geração de renda da pessoa. As questões de sexualidade também devem seguir sendo trabalhadas nesta faixa etária e devem englobar o relacionamento com outras pessoas no convívio social e compreensão fisiológica e psicológica de desenvolvimento sexual. Além disso, deve-se considerar o planejamento familiar para pessoas com SD que constituem família.

 Referências

Brasil. (2013). Diretrizes de atenção à pessoa com Síndrome de Down Ministério da Saúde. Brasília: Ministério da Saúde Secretaria de Atenção à Saúde.

Dessen, M. A., & Maciel, D. A. (2014). A Ciência do Desenvolvimento Humano: Desafios para a psicologia e a educação. Curitiba: Juruá Editora.

Merrick, J., Kandel, I., & Vardi, G. (2004). Adolescents with Down syndrome. International Journal of Adolescent Medicine and Health,16(1), 13-19.

Ler e Escrever como um processo natural – será?

Ler e escrever são habilidades que fazem parte de um processo construído com estímulo adequado e direcionamento bem específico, com pré-requisitos a serem alcançados ao longo da caminhada da aprendizagem…

* Por Luciana Bacellar

Ler e Escrever como um processo natural – será?

“Só 15% dos problemas dos alunos correspondem a distúrbios orgânicos” (1).

Ler e escrever são habilidades que fazem parte de um processo construído com estímulo adequado e direcionamento bem específico, com pré-requisitos a serem alcançados ao longo da caminhada da aprendizagem.

A leitura é uma atividade que pode estar agrupada em dois níveis: a decodificação, que permite o reconhecimento das palavras, traduzindo a letra impressa/escrita para a linguagem oral (grafema-fonema); e a compreensão, que possibilita a assimilação de uma palavra, frase ou texto. A escrita corresponde a codificação dos sons da linguagem oral em sinais escritos (correspondência fonema-grafema).

São cinco os pré-requisitos para aquisição da leitura e da escrita:

  1. Um desenvolvimento linguístico adequado – conseguir se expressar e compreender de forma clara, trocar informações;
  2. Consciência fonológica – que é a habilidade de reconhecer e memorizar os sons, sílabas e palavras e usar esse conhecimento na troca de informações;
  3. Capacidade de memória visual e auditiva;
  4. Capacidade de atenção;
  5. Coordenação viso motora.

As dificuldades na leitura e na escrita comprometem todo o processo de aprendizagem, dificultando o sucesso escolar da criança.

  • Orientações para aos pais:
  • estimular a autoestima;
  • criar um ambiente calmo;
  • estimular brincadeiras com música e rima;
  • incentivar a prática de exercícios físicos e atividades culturais;
  • realizar jogos;
  • participar da criação de listas como de compras tarefas;
  • pedir repetição do comando verbal (o que eu lhe mandei fazer?) antes de executar a tarefa.

O papel do fonoaudiólogo não preconiza a identificação de problemas, mas tem como foco a promoção da saúde junto a alunos, pais e toda a comunidade escolar, assim como o desenvolvimento de estratégias educacionais com o objetivo de otimizar o processo de ensino-aprendizagem.

Portanto, ao perceber qualquer dificuldade nas aquisições, seja de leitura ou de escrita, procure apoiar e buscar ajuda. São processos que necessitam de acompanhamento de todos os que convivem com a criança e que desejam seu sucesso.

REFERÊNCIAS:

  1. Jaime Luiz Zorzi, fonoaudiólogo, em entrevista para o site: novaescola.org.br (agosto/2006).

Dicas para traçar metas

Novo ano, novas metas ou as mesmas do ano anterior que não foram cumpridas (quem nunca?).

* Por Laís Helena Pereira

Dicas para traçar metas

Novo ano, novas metas ou as mesmas do ano anterior que não foram cumpridas (quem nunca?).

Primeiramente, traçar metas é uma estratégia interessante para modificar comportamentos, desenvolver novos hábitos, alcançar outros patamares na carreira e na vida de modo geral. Diferente dos desejos as metas são ferramentas que direcionam o planejamento e auxiliam no monitoramento do processo. Porém, ter uma meta e não chegar até ela é bastante frustrante! A fim de evitar que isso aconteça é preciso elaborar metas realistas que fazem sentido para a sua vida. Desconsidere metas prontas, generalistas, que estão “na moda” busque aquilo que se encaixa nas suas necessidades e condições de execução. Caso tenha dificuldade de identificar o que faz sentido para você, busque um processo psicoterápico, invista no seu autoconhecimento antes de tudo!

Técnica SMART

Para facilitar o processo conheça a técnica SMART que orienta a definição de metas em 5 passos:

S – eSpecífico: detalhar, operacionalizar a meta. Ex.: Ler 4 livros ao invés de ler mais.

M – Mensurável: pensar em como será possível medir o seu progresso ao longo do tempo. Ex.: Ao final de cada mês checar quanto já leu.

A – Alcançável/Atingível: pensar nas habilidades necessárias para alcançar a meta, você as tem?  Ex.: Você sabe ler? E nas variáveis envolvidas para praticar as ações necessárias. Ex.: como conseguir os livros, onde vai ler, é possível encaixar a leitura na sua rotina?

R – Relevante: nesse passo você vai buscar a resposta para a seguinte pergunta: porque isso é importante para mim? Ex.: importante para que eu tenha mais atividades de lazer e diminua o tempo no celular.

T – Tempo: aqui você vai pensar num prazo para alcançar a meta. Ex.: até 31/12/2022.

Ter uma meta bem definida, afinada a sua realidade e possibilidades é o primeiro passo para alcançá-la!

Saúde Mental e o convívio com animais de estimação

Como o animal de estimação propicia um aumento na qualidade de vida e principalmente o impacto de nossa estreita relação com eles na saúde mental.

* Por Diana Lopes

Saúde Mental e o convívio com animais de estimação

Entendendo a relação

Antes de conhecermos os benefícios para a saúde mental da relação dos humanos com animais não humanos é necessário considerarmos alguns aspectos que nem sempre estão presentes em textos como este. Segundo o livro “E o homem encontrou o cão”, de Konrad Lorenz, tudo começou com o relacionamento entre os nossos ancestrais com os lobos e chacais, que foi moldado para alcançar todo respeito, amor, comunicação e obediência.

Podemos admitir que a relação entre humanos e outras espécies se deu inicialmente pelo fato de que os animais seriam úteis para proteger e alimentar o grupo, para transportar mercadorias, ajudar nas colheitas, cuidar de rebanhos, entre outras funções.

Ainda hoje, mesmo que em menor proporção, esta condição de “utilidade” é sustentada por nossa sociedade e os animais não humanos servem à conveniência da nossa espécie desde alimento, matadouros, testes toxicológicos, vivissecção, circos, touradas, laboratórios, etc. Numa outra linha de “utilidade” os animais podem servir à espécie humana como guias e farejadores,  no caso de cães; equinos, cães e gatos como co-terapeutas. Também há os animais “celebridades”, aqueles que servem às câmeras, protagonizando filmes ou em trabalhos como comerciais, fotos publicitárias, televisão, novelas, vitrinismo, teatro, eventos etc.

Por mais que seja incômodo abordar o contexto descrito acima,  ter consciência dessa relação é necessária para não romantizarmos a domesticação dos outros animais pelos homens. Para nosso alívio, essas não são as únicas condições possíveis a que submetemos os animais não humanos, porque também é verdade que hoje a relação que desenvolvemos com estas outras espécies tem se tornado cada vez mais respeitosa e afetiva. E isto nos tem feito muito bem e é mais justo para eles!

O inquestionável benefício que proporciona a convivência com outros animais, não nos permite perder de vista que eles irão se coordenar afetivamente conosco e isto exige nosso senso de responsabilidade ao tomar a decisão de adotá-los e inseri-los em nosso convívio. Um exemplo disso é o que revela um recente artigo de 2021 (disponível nas referências utilizadas para este texto) sobre a capacidade dos cães, por exemplo, de distinguir ações humanas intencionais daquelas não intencionais. Isto significa que quando interagem com humanos, eles geralmente mostram reações apropriadas à intenção humana.

A integração dos animais no contexto familiar

Quando decidimos integrar esses animais como parte da família/grupo é preciso ter consciência que do outro lado também tem uma vida, que se conecta com sentimentos, necessidades e experimenta conosco reciprocamente esta vinculação. Por isso, devemos ter muito cuidado ao sermos impelidos a adotar esses animais pelos benefícios que podem nos proporcionar.  Precisamos assumir a responsabilidade sobre o que despertamos neles e os cuidados que exigem essa integração, afinal eles nos percebem como família deles.

E os benefícios de se ter um companheiro não humano?

Agora que já refletimos sobre algumas relações que estabelecemos com as outras espécies de animais, podemos nos deter aos benefícios de se ter um companheiro não humano. Estamos no Janeiro Branco, mês que se dedica à atenção para as questões de saúde mental e emocional da humanidade a fim de estimular essa cultura. E como parte da campanha não poderíamos deixar de falar sobre como o animal de estimação propicia um aumento na qualidade de vida e principalmente o impacto de nossa estreita  relação com eles na saúde mental.

Os benefícios do convívio da família humana com outras espécies são inúmeros. Cientistas relacionam, por exemplo, benefícios cardiovasculares tanto pela estimulação para atividades físicas (quando passeamos com nossos cães, por exemplo) quanto pela relação afetiva que se estabelece com estes animais (como não nos acalmar ao sentir o ronronar de nosso felino e sua companhia?). As famílias os adotam como integrantes do grupo e, segundo a etologia (ciência que estuda comportamento social e individual dos animais), é assim mesmo que eles se sentem em relação às famílias que o adotam. Deste modo os animais adotados enriquecem o ambiente familiar, atenuam sentimentos de solidão, promovem sentimento de segurança e favorecem contato social e recreação.

Durante a pandemia, cresceu em pelo menos 30% o número de pets compondo a família nos lares brasileiros, segundo a revista Galileu. O confinamento em casa e o isolamento social estimularam as buscas pela companhia não humana durante o período. E aos poucos com o avanço da vacinação e nosso retorno às nossas atividades rotineiras, eles estão em casa e sempre nos recebem com alegria. Estes animais proporcionam uma reciprocidade afetiva e basta nosso contato com algum deles para mudarmos a entonação de voz, modular nossa emoção (tornando mais ou menos ativada) e nos dedicarmos a alguma brincadeira mesmo quando estamos exaustos depois de um dia cansativo de trabalho. Esta é apenas uma das possibilidades de como reagimos ao contato com um animal de estimação.

Além disso, pessoas que convivem com animais são menos propensas a sofrer depressão, lidam melhor com situações estressantes e com a ansiedade, têm níveis mais altos de serotonina e dopamina e apresentam melhora nos indicadores de pressão arterial e frequência cardíaca, segundo muitos estudos científicos. Não resistimos à reação de carinho, alegria, amizade e lealdade que esses companheiros dispensam aos seus tutores. Afinal, acariciar, abraçar ou brincar com nossos pets trazem efeitos calmantes imediatos!

Confira alguns benefícios:

1 . Aumenta os níveis de atividade física

Os tutores de cães, por exemplo, costumam levá-los para passeios e corridas. Isso acaba por se tornar uma maneira divertida de introduzir mais movimento para os seus dias e combater o comportamento sedentário, um dos principais fatores de risco para doenças cardiovasculares e mortalidade precoce;

  1. Oferece companhia‍

Animais de estimação trazem uma sensação de segurança e alguém com quem compartilhar o dia a dia. Cuidar dos bichinhos pode ajudar você a se sentir útil e necessário. Isso pode ser especialmente importante para pessoas mais velhas ou que passam muito tempo sozinhas;

  1. Melhora a autoconfiança‍

Animais de estimação podem ser ótimos ouvintes e oferecem amor incondicional, sem espaço para julgamentos;

  1. Promove encontros‍

Não é raro que os tutores de animais se sintam parte de uma comunidade. Seja ao frequentar um ambiente específico de lazer com os animais, seja compartilhando dúvidas e descobertas. No fim das contas, os pets podem ser ótimas pontes para conhecer outras pessoas;

  1. Constrói uma rotina que faça sentido para o seu dia a dia‍

Ter um pet é saber que existe um animal que precisa de você para se alimentar, gastar energia, fazer companhia e receber cuidados. Isso exige um nível de organização e planejamento que ajuda a manter um foco no dia a dia.

Conviver com animais de estimação é um aprendizado diário. Como vimos, ao integrar a família, eles estimulam o afeto, animam o ambiente, demonstram companheirismo incondicional e, comprovadamente, também fazem bem à sua saúde.

Em 2016 adotei a AnnaO, uma gata arisca e muito afetuosa, ela foi encontrada dentro do motor de um carro após ter percorrido 19km e ter as patinhas queimadas. Posso garantir que ela é responsável por um afeto muito particular e fonte de muito aprendizado. Olha só como ela é linda!

Você também tem algum pet? Nos conte sobre sua história com ele!

Se não tem, que tal adotar um?

Mas lembre-se: adotar um animalzinho requer disponibilidade de tempo, organização financeira e também incluí-lo na sua rotina diária. Afinal, ele dependerá para sempre de você. E é importante não presentearmos uns aos outros com animais. Pois depende da condição de quem irá tê-lo. Não é mesmo?

Referências:

 

https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/Comportamento/noticia/2021/08/numero-de-pets-nos-lares-brasileiros-cresce-30-durante-pandemia.html

https://www.apa.org/pubs/journals/releases/psp-101-6-1239.pdf

https://journals.sagepub.com/doi/abs/10.1177/1533210107302397

https://doi.org/10.1111/j.1440-1681.2011.05583.x

Lonrez, Konrad. (1997). E o homem encontrou o cão. Ed.: Relógio D’água.

Já ouviu falar de Comer Intuitivo?

O nome já traz consigo a ideia de que podemos usar a intuição para nos alimentarmos, usando não somente a via racional, mas também a intuição.

* Por Felipe Barreto

O comer intuitivo é uma abordagem não prescritiva da nutrição elaborada por Evelyn Tribole e Elyse Resch, duas nutricionistas americanas.  O nome já traz consigo a ideia de que podemos usar a intuição para nos alimentarmos, usando não somente a via racional (proposta pelas dietas restritivas), mas utilizando também das sensações que nosso corpo nos fornece (consciência interoceptiva).

O comer intuitivo é respaldado em ciência, ao longo dos anos mais de cem artigos científicos já foram publicados, tornando essa abordagem uma alternativa interessante às dietas restritivas. O foco do tratamento é buscar uma melhora no comportamento alimentar visando uma melhora da saúde e na qualidade de vida.

Segundo as palavras das próprias autoras, “O comer intuitivo é uma abordagem compassiva de autocuidado no comer que trata todos os corpos com dignidade e respeito”.

O comer intuitivo tem três pilares que fundamentam toda a abordagem:

  • Permissão incondicional para comer o alimento desejado quando estiver com fome.
  • Comer por razões físicas, não emocionais.
  • Confiar nos sinais internos de fome e saciedade para determinar quando e quanto comer.

Em uma revisão bibliográfica feita por Ricciardelli em 2016, foram analisados 24 estudos entre 2006 e 2015 e o comer intuitivo foi associado aos seguintes benefícios:

  • Maior satisfação e apreciação do corpo
  • Funcionamento emocional positivo
  • Autoestima e otimismo incondicionais
  • Mais satisfação com a vida
  • Resistência psicológica
  • Maior motivação para atividades físicas, com foco no prazer e não na culpa ou aparência.

Ainda foi constada um correlação inversa entre o comer intuitivo e o comer disfuncional, a prática de dietas, a baixa consciência interoceptiva, e a internalização do ideal de magreza.

No próximo texto falarei mais sobre os princípios do comer intuitivo e como isso pode ajudar o paciente de uma maneira prática.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ALVARENGA, Marle et al. Nutrição Comportamental. 2.ed. Barueri – SP: Manole, 2019

Bruce LJ, Ricciardelli LA. A systematic review of the psychosocial correlates of intuitive eating among adult women. Appetite. 2016 Jan 1;96:454-472. doi: 10.1016/j.appet.2015.10.012. Epub 2015 Oct 22. PMID: 26474781.

TRIBOLE, E.;  RESCH, E. Intuitive eating: A revolutionary anti-diet approach. Fourth Edition. St. Martins Essentials. 2020

Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC)

Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC). O que é, como os pensamentos influenciam no TOC, como o problema pode estar sendo mantido?

* Por Dr. Alexandre de Rezende

O que é o Transtorno Obsessivo-Compulsivo – TOC?

A principal característica do TOC é a presença de obsessões (ideias) e/ou compulsões (rituais).

As obsessões são pensamentos, ideias ou imagens repetitivas, intrusivas e que provocam angústia, ansiedade e/ou desconforto. As compulsões são comportamentos evitativos ou rituais mentais, realizados de forma rígida e estereotipada, a fim de diminuir o desconforto causado pelas obsessões. Esses sintomas acabam por interferir na rotina da pessoa, restringindo várias áreas da sua vida. Os conteúdos mais comuns dos sintomas relacionam-se a sujeira/contaminação/limpeza, agressão, checagem e simetria/ordenação.

As obsessões podem aparecer de diversas formas, como frases, palavras, imagens ou cenas. Seus conteúdos geralmente são percebidos como impróprios ou estranhos, podendo gerar sentimentos de culpa, medo, desprazer, e até mesmo nojo. Por isso, a pessoa com TOC tenta reprimir, afastar ou controlar esses pensamentos, realizando rituais ou tentando não pensar neles, o que na maioria das vezes não é eficaz. Dessa forma, a pessoa acaba se sentindo ainda mais incomodada. Os pensamentos obsessivos podem ser de diferentes tipos: preocupações excessivas com sujeiras ou contaminações, alinhamento de objetos, ordem e simetria, pensamentos impróprios e indesejáveis relacionados com violência, sexo e religião, entre outros.

As compulsões são comportamentos realizados pelo indivíduo na tentativa de se livrar das obsessões e do desconforto provocado por elas. Esses comportamentos podem ser diversos, como verificar fechadura das portas, lavar as mãos com frequência, simetria e organização de objetos; perfeccionismo extremo nas atividades realizadas, ações repetidas (sentar e levantar do assento, entrar e sair dos lugares), entre outros. As compulsões ou rituais também podem aparecer como atos mentais, com a mesma finalidade de tentar neutralizar as obsessões. As mais comuns são repetir mentalmente determinadas palavras ou números, repetir silenciosamente alguma reza, rememorar fatos mentalmente. 

  • Como os pensamentos influenciam no TOC?

Com base no principal fundamento da terapia cognitivo-comportamental, os pensamentos influenciam as emoções e comportamentos.

Uma das principais características dos indivíduos com TOC é a avaliação distorcida de seus próprios pensamentos obsessivos, baseada em algumas crenças: “sou capaz de controlar meus pensamentos”. As pessoas com TOC sofrem muito por acreditarem que seus pensamentos são antecipadores de uma ação, não encaram os pensamentos apenas como pensamentos, mas sim como possibilidade de acontecimentos reais (“se estou pensando isso, então é real”). Por isso, sentem a necessidade de controlar ou neutralizar esses pensamentos fazendo rituais, o que causa intenso desconforto e prejuízos no seu cotidiano. O efeito é temporário, e logo o pensamento perturbador volta a incomodar, a pessoa acaba repetindo suas ações de forma compulsiva.

Diversas situações do cotidiano (por exemplo, manusear o lixo do banheiro) podem disparar pensamentos indesejados e aversivos (“estou sujo e contaminado”) e sentimentos intensos (nojo e medo), e fazem com que o indivíduo tenha a necessidade de realizar comportamentos que neutralizem ou minimizem o desconforto: as compulsões ou rituais (lavar as mãos repetidas vezes). Como esses rituais provocam um alívio imediato e, portanto, cumprem o objetivo de diminuir o desconforto momentaneamente, eles acabam sendo reforçadores do problema.

  • Como o problema pode estar sendo mantido?

Pessoas com TOC desenvolvem regras e estratégias para monitorar, avaliar e tentar controlar seus pensamentos. Isso pode fazer com que nenhum pensamento ou situação aversiva passe despercebido, o que provoca sentimentos intensos de repugnância, nojo, culpa e medo. Esses sentimentos fazem com que o indivíduo procure uma válvula de escape: os rituais e/ou compulsões mentais.

Grande parte das pessoas têm, em algum momento da vida, pensamentos impróprios, agressivos, obscenos ou de conteúdo sexual muito semelhantes aos de quem sofre com o TOC. No entanto, não lhes dão importância, desvalorizando tais pensamentos. Logo, a maneira como se interpreta e o significado que se dá aos pensamentos seriam os responsáveis pela transformação de pensamentos que seriam apenas desagradáveis em pensamentos obsessivos e recorrentes. Com base nisso, é importante tentar perceber o quanto se está supervalorizando os pensamentos, fazendo-os mais intensos e presentes na vida.

Outro aspecto que pode estar contribuindo para manter os sintomas de TOC é a realização compulsiva de rituais. Como já dito anteriormente, quando se age na tentativa de neutralizar as ideias obsessivas, isso tende a causar um alívio momentâneo. Porém, esse alívio acaba reforçando a realização dos rituais, por julgar que fazer os rituais é o melhor caminho para aliviar os pensamentos.

  • Como lidar com o TOC?

 Estratégias para lidar com o TOC:

  • Psicoeducação: conhecer todas as informações necessárias referentes ao TOC, características e funcionamento, o modelo cognitivo-comportamental e as técnicas utilizadas no tratamento para se lidar de maneira eficaz na redução dos sintomas.
  • Lista de sintomas: junto com o terapeuta, faz-se uma lista com todos os sintomas obsessivo-compulsivos, registrando-os através do critério de nível de ansiedade.
  • Identificação e modificação de interpretações distorcidas: é importante identificar e aprender a modificar os pensamentos distorcidos junto com o terapeuta, com o objetivo de começar a fazer interpretações mais realistas. Exemplos: exagerar o risco de algo ruim acontecer, superestimar sua responsabilidade sobre os pensamentos, supervalorizar o poder do pensamento e a necessidade de controlá-lo e perfeccionismo.
  • Exposições às obsessões e prevenção de rituais: partindo do princípio de que os rituais e evitações são estratégias utilizadas pela pessoa para aliviar as obsessões, o objetivo é fazer com que a pessoa se exponha aos estímulos que parecem aversivos de uma maneira gradual, sem o recurso de rituais ou comportamentos que possam trazer algum alívio. O objetivo é que ocorra a diminuição espontânea e progressiva de ansiedade e medo a um estímulo não nocivo (sujeira, elevador, janelas).

Sugestão de leitura:

  • Vencendo o transtorno obsessivo-compulsivo: Manual de terapia cognitivo-comportamental para pacientes e terapeutas. Autores: Aristides Volpato Cordioli, Analise de Souza Vivan e Daniela Tusi Braga. 3ª edição. Artmet, 2016.
  • Medos, dúvidas e manias: orientações para pessoas com transtorno obsessivo-compulsivo e seus familiares. Autores: Albina Rodrigues Torres, Roseli Gedanke Shavitt e Eurípedes Constantino Miguel (organizadores). 2ª edição. Artmed, 2013.

Referência bibliográfica:

Este texto foi baseado na seguinte referência:

LAURITO, L.D.; PAIXÃO, J.E. Capítulo 4 – Transtorno Obsessivo-Compulsivo. In: CARVALHO, M.R.; MALAGRIS, L.E.N.; RANGÉ, B.P. Psicoeducação em Terapia Cognitivo-Comportamental. – Novo Hamburgo: Sinopsys, 2019.

Trama

Quando alguém adentra no consultório para falar de si, não adentra só…

* Por Vívian Hauck

“Tudo vive em mim. Tudo se entranha

Na minha tumultuada vida. E por isso

Não te enganas, homem, meu irmão,

Quando dizes na noite que só a mim me vejo.

Vendo-me a mim, a ti.”

– Trecho de ‘Poemas aos homens do nosso tempo – VI’ – Hilda Hilst

“Na vida psíquica do ser individual, o Outro é via de regra considerado enquanto modelo, objeto, auxiliador e adversário, e portanto a psicologia individual é também, desde o início, psicologia social, num sentido ampliado, mas inteiramente justificado.”

– Freud em Psicologia das Massas e Análise do Eu (1921)

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Quando alguém adentra no consultório para falar de si, não adentra só.

Desde o nascimento, um bebê humano é imerso em uma língua, uma cultura, uma história. A história de sua família, contada na língua materna. A história de seu nome. A história de quem veio antes dele. A história de seu país, de sua cidade. A história fantasiada do que esperam dele, de quem será, de como será. Falam com ele e por ele antes que ele fale por si, e é só assim que pode – ele mesmo – passar a falar. Não há sujeito que se crie sozinho.

Atravessado de saída por essas histórias, este sujeito vai encontrando outros em seu caminho. Com alguns se identifica, outros passam despercebidos. Ama alguns, outros nem tanto. Participa de alguns grupos, luta contra outros. Se posiciona em alguns lugares, em outros se silencia, se apaga. E assim vai construindo a trama de relações que o acompanha e, mais que isso, que o constitui.

É em relação também que sofre. Sofre pelo que falha, sofre pelo amor não correspondido, sofre quando se decepciona com aquele que acreditava ser perfeito, sofre por tentar se distanciar de um ou de outro e não conseguir. Sofre na tentativa de suprir as expectativas de outrem, aquelas que estavam lá desde o berço.  Sofre repetidamente pelas vezes em que se viu ali, naquela mesma situação que sempre o faz sofrer. “Isso sempre acontece comigo”, diz.

Talvez em algum momento afortunado se pergunte afinal “E por que é que isso sempre acontece comigo?”, “E o que eu quero? Eu quero mesmo ser isso que desejaram para mim?”. Adentra ao consultório. Traz consigo sua história e as marcas de todas essas relações. E ali, de forma singular, se encontra com a possibilidade de assumir sua história, suas responsabilidades, seus desejos, sua alteridade, seus limites. O que será que é possível fazer a partir e com tudo isso que te construiu, que te fez chegar até aqui?

Pode parecer um tanto assustador, mas faço a aposta de que vale a pena a viagem.

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“Cada indivíduo é um componente de muitos grupos, tem múltiplos laços por identificação, e construiu seu ideal do Eu segundo os mais diversos modelos. Assim, cada indivíduo participa da alma de muitos grupos, daquela de sua raça, classe, comunidade de fé, nacionalidade etc., e pode também erguer-se além disso, atingindo um quê de independência e originalidade.”

– Freud em Psicologia das Massas e Análise do Eu (1921)