Antes de conhecermos os benefícios para a saúde mental da relação dos humanos com animais não humanos é necessário considerarmos alguns aspectos que nem sempre estão presentes em textos como este. Segundo o livro “E o homem encontrou o cão”, de Konrad Lorenz, tudo começou com o relacionamento entre os nossos ancestrais com os lobos e chacais, que foi moldado para alcançar todo respeito, amor, comunicação e obediência.
Podemos admitir que a relação entre humanos e outras espécies se deu inicialmente pelo fato de que os animais seriam úteis para proteger e alimentar o grupo, para transportar mercadorias, ajudar nas colheitas, cuidar de rebanhos, entre outras funções.
Ainda hoje, mesmo que em menor proporção, esta condição de “utilidade” é sustentada por nossa sociedade e os animais não humanos servem à conveniência da nossa espécie desde alimento, matadouros, testes toxicológicos, vivissecção, circos, touradas, laboratórios, etc. Numa outra linha de “utilidade” os animais podem servir à espécie humana como guias e farejadores, no caso de cães; equinos, cães e gatos como co-terapeutas. Também há os animais “celebridades”, aqueles que servem às câmeras, protagonizando filmes ou em trabalhos como comerciais, fotos publicitárias, televisão, novelas, vitrinismo, teatro, eventos etc.
Por mais que seja incômodo abordar o contexto descrito acima, ter consciência dessa relação é necessária para não romantizarmos a domesticação dos outros animais pelos homens. Para nosso alívio, essas não são as únicas condições possíveis a que submetemos os animais não humanos, porque também é verdade que hoje a relação que desenvolvemos com estas outras espécies tem se tornado cada vez mais respeitosa e afetiva. E isto nos tem feito muito bem e é mais justo para eles!
O inquestionável benefício que proporciona a convivência com outros animais, não nos permite perder de vista que eles irão se coordenar afetivamente conosco e isto exige nosso senso de responsabilidade ao tomar a decisão de adotá-los e inseri-los em nosso convívio. Um exemplo disso é o que revela um recente artigo de 2021 (disponível nas referências utilizadas para este texto) sobre a capacidade dos cães, por exemplo, de distinguir ações humanas intencionais daquelas não intencionais. Isto significa que quando interagem com humanos, eles geralmente mostram reações apropriadas à intenção humana.
Quando decidimos integrar esses animais como parte da família/grupo é preciso ter consciência que do outro lado também tem uma vida, que se conecta com sentimentos, necessidades e experimenta conosco reciprocamente esta vinculação. Por isso, devemos ter muito cuidado ao sermos impelidos a adotar esses animais pelos benefícios que podem nos proporcionar. Precisamos assumir a responsabilidade sobre o que despertamos neles e os cuidados que exigem essa integração, afinal eles nos percebem como família deles.
Agora que já refletimos sobre algumas relações que estabelecemos com as outras espécies de animais, podemos nos deter aos benefícios de se ter um companheiro não humano. Estamos no Janeiro Branco, mês que se dedica à atenção para as questões de saúde mental e emocional da humanidade a fim de estimular essa cultura. E como parte da campanha não poderíamos deixar de falar sobre como o animal de estimação propicia um aumento na qualidade de vida e principalmente o impacto de nossa estreita relação com eles na saúde mental.
Os benefícios do convívio da família humana com outras espécies são inúmeros. Cientistas relacionam, por exemplo, benefícios cardiovasculares tanto pela estimulação para atividades físicas (quando passeamos com nossos cães, por exemplo) quanto pela relação afetiva que se estabelece com estes animais (como não nos acalmar ao sentir o ronronar de nosso felino e sua companhia?). As famílias os adotam como integrantes do grupo e, segundo a etologia (ciência que estuda comportamento social e individual dos animais), é assim mesmo que eles se sentem em relação às famílias que o adotam. Deste modo os animais adotados enriquecem o ambiente familiar, atenuam sentimentos de solidão, promovem sentimento de segurança e favorecem contato social e recreação.
Durante a pandemia, cresceu em pelo menos 30% o número de pets compondo a família nos lares brasileiros, segundo a revista Galileu. O confinamento em casa e o isolamento social estimularam as buscas pela companhia não humana durante o período. E aos poucos com o avanço da vacinação e nosso retorno às nossas atividades rotineiras, eles estão em casa e sempre nos recebem com alegria. Estes animais proporcionam uma reciprocidade afetiva e basta nosso contato com algum deles para mudarmos a entonação de voz, modular nossa emoção (tornando mais ou menos ativada) e nos dedicarmos a alguma brincadeira mesmo quando estamos exaustos depois de um dia cansativo de trabalho. Esta é apenas uma das possibilidades de como reagimos ao contato com um animal de estimação.
Além disso, pessoas que convivem com animais são menos propensas a sofrer depressão, lidam melhor com situações estressantes e com a ansiedade, têm níveis mais altos de serotonina e dopamina e apresentam melhora nos indicadores de pressão arterial e frequência cardíaca, segundo muitos estudos científicos. Não resistimos à reação de carinho, alegria, amizade e lealdade que esses companheiros dispensam aos seus tutores. Afinal, acariciar, abraçar ou brincar com nossos pets trazem efeitos calmantes imediatos!
1 . Aumenta os níveis de atividade física
Os tutores de cães, por exemplo, costumam levá-los para passeios e corridas. Isso acaba por se tornar uma maneira divertida de introduzir mais movimento para os seus dias e combater o comportamento sedentário, um dos principais fatores de risco para doenças cardiovasculares e mortalidade precoce;
Animais de estimação trazem uma sensação de segurança e alguém com quem compartilhar o dia a dia. Cuidar dos bichinhos pode ajudar você a se sentir útil e necessário. Isso pode ser especialmente importante para pessoas mais velhas ou que passam muito tempo sozinhas;
Animais de estimação podem ser ótimos ouvintes e oferecem amor incondicional, sem espaço para julgamentos;
Não é raro que os tutores de animais se sintam parte de uma comunidade. Seja ao frequentar um ambiente específico de lazer com os animais, seja compartilhando dúvidas e descobertas. No fim das contas, os pets podem ser ótimas pontes para conhecer outras pessoas;
Ter um pet é saber que existe um animal que precisa de você para se alimentar, gastar energia, fazer companhia e receber cuidados. Isso exige um nível de organização e planejamento que ajuda a manter um foco no dia a dia.
Conviver com animais de estimação é um aprendizado diário. Como vimos, ao integrar a família, eles estimulam o afeto, animam o ambiente, demonstram companheirismo incondicional e, comprovadamente, também fazem bem à sua saúde.
Em 2016 adotei a AnnaO, uma gata arisca e muito afetuosa, ela foi encontrada dentro do motor de um carro após ter percorrido 19km e ter as patinhas queimadas. Posso garantir que ela é responsável por um afeto muito particular e fonte de muito aprendizado. Olha só como ela é linda!
Você também tem algum pet? Nos conte sobre sua história com ele!
Se não tem, que tal adotar um?
Mas lembre-se: adotar um animalzinho requer disponibilidade de tempo, organização financeira e também incluí-lo na sua rotina diária. Afinal, ele dependerá para sempre de você. E é importante não presentearmos uns aos outros com animais. Pois depende da condição de quem irá tê-lo. Não é mesmo?
https://www.apa.org/pubs/journals/releases/psp-101-6-1239.pdf
https://journals.sagepub.com/doi/abs/10.1177/1533210107302397
https://doi.org/10.1111/j.1440-1681.2011.05583.x
Lonrez, Konrad. (1997). E o homem encontrou o cão. Ed.: Relógio D’água.
A Dra. Juliana, endocrinologista da Clínica Rezende, disponibilizou um texto sobre o assunto. Clique aqui.
Leia maisOs transtornos alimentares são transtornos psiquiátricos causados por alterações na autoimagem, ou seja, na forma como o indivíduo se vê, na sua relação com o próprio corpo e com a comida.
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