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Algumas considerações antes que Janeiro termine

28 de janeiro de 2020
* Por Vivian Hauck

Janeiro Branco: Algumas considerações antes que o mês termine. Janeiro, o mês de conscientização da saúde mental, já está próximo do fim, mas ainda dá tempo para mais alguns questionamentos, apontamentos e reflexões.

Devido à campanha do Janeiro Branco, um pouco mais se falou nesse mês sobre a importância da saúde mental. Mas o que, afinal, chamamos de “saúde mental”?  Saúde mental é somente não ter nenhum tipo de doença mental? Será que o que define saúde mental para uma pessoa é o mesmo que a define para todas as outras pessoas? Existe prescrição que dê conta de dizer a todos os sujeitos o que eles deveriam fazer para, enfim, possuírem saúde mental?

Saúde mental e singularidade

Cada sujeito tem uma história, a sua história. Nasceu em um determinado lugar, em uma determinada família, foi cercado por determinadas possibilidades, fez e faz diferentes escolhas na vida que o levaram e levam a outras possibilidades e novas escolhas. Não há como prever onde esse caminho levará. Quando a realidade se impõe, quando se há desejo e escolhas em jogo, não há garantias. E vão ser essas escolhas que irão nos construir, dia a dia. É como disse Clarice Lispector em um de seus livros: “[…] Pois existe a trajetória, e a trajetória não é apenas um modo de ir. A trajetória somos nós mesmos. Em matéria de viver, nunca se pode chegar antes.” (2009, p. 176).¹

Entretanto, apesar de não possuirmos qualquer tipo de garantia, talvez possamos dizer que nenhuma trajetória será livre de dificuldades, conflitos e algumas pedras no meio do caminho. E talvez “saúde mental” seja justamente a possibilidade de um sujeito, diante dos impasses da vida, de se transformar, de recriar, de mudar a trajetória quando for preciso e de se reconstruir a seu modo. E se, em um determinado momento, esse mesmo sujeito se der conta de que não consegue instaurar tamanho movimento sozinho, que ele possa pedir ajuda a um outro. Talvez isso também seja indício de saúde mental.

O sofrimento psíquico do outro

E quando é o outro que sofre? O que é possível oferecer? Como é possível ajudar? Colocar-se disponível para escutar o que outro sujeito tem a dizer sobre seu sofrimento psíquico pode não ser fácil nem resolutivo, mas é um começo. Escutar verdadeiramente, sem se prender a uma ilusão de que já se sabe do que aquele outro sofre antes mesmo que ele possa dizer algo sobre isso. Ou à ilusão de já se ter certeza de como solucionar tal sofrimento, talvez por haver vivenciado experiência parecida.

Quanto a isso, cito aqui uma passagem de Freud que reli recentemente, na qual ele diz que “[…] as impressões e experiências externas podem fazer exigências de intensidade diferente a pessoas diferentes e aquilo que é passível de ser manejado pela constituição de uma pessoa pode ser uma tarefa impossível para a de outra.” (1938/1940, p. 103).² Há singularidade no sofrimento psíquico e singularidade na trajetória de cada um, que não nos esqueçamos disso. É somente a partir dessa concepção e posição que poderemos efetivamente nos colocar à disposição para dar suporte a alguém que sofre.

Saúde mental para além de Janeiro

Janeiro finda, porém desejo que os efeitos da campanha de conscientização da saúde mental possam perdurar. Que Janeiro tenha podido ser semente para que as mais diversas temáticas que envolvem a saúde mental estejam presentes em muitas outras discussões e reflexões ao longo do ano. E que possamos acolher de fato, sem muitos julgamentos e pré-conceitos, nosso próprio sofrimento e o sofrimento do outro.

Leia também sobre Família e Saúde Mental clicando aqui. 

¹ LISPECTOR, C. A Paixão Segundo G.H. Rio de Janeiro: Rocco, 2009.

² FREUD, S. Um exemplo de trabalho psicanalítico. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (J. Salomão, trad., Vol23, pp. 102-109). Rio de Janeiro: Imago, 1938/1940.

 

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